Mails para a minha Irmã

"Era uma vez um jovem vigoroso, com a alma espantada todos os dias com cada dia."


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Mamã!

Olá Mamã!
Tu não morreste. Seguiste outro caminho.
As saudades são imensas e, contudo, a vida continuou a explodir-nos nas mãos e no coração.
Fazes-nos falta. Muita falta. Agora nos apercebemos de forma ainda mais nítida e sentida e sofrida da importância que tinhas nas nossas vidas. E continuas a ter.
Nasceu o teu bisneto. Não o viste por poucas semanas… já tinha de ser assim… ias ter um imenso orgulho no teu neto e ias estragar o bisneto com mimos. Já te estou a ver a tirar-lhe fotografias e a dizer como é que se devia fazer para cuidar bem dele.
A mana está bem. Não tanto quanto estaria se tivesse a tua companhia. Mas está bem. Sobreviveu ao acidente e a tudo o que se lhe seguiu e está bem. Trabalha. Conduz. E faz mais coisas…
Já não assististe a esta coisa do vírus… não te ia incomodar… ias encher toda a gente à tua volta de sumo de beterraba e trarias contigo para aí umas cinquenta máscaras! Uma para cada situação.

Tenho saudades do teu sorriso. Tenho saudades de quando me abraçavas e davas conselhos para a vida e tenho saudades de quando me davas lições de vida e tenho saudades de quando me penteavas e tenho saudades de quando me acalmavas mesmo que isso implicasse prometeres-me o impossível. Eu descobriria depois que o impossível era impossível, mas já sem medo! Tenho saudades do desvelo com que cozinhavas para nós e do cuidado com que punhas a mesa em todos os seus pormenores. Tenho saudades da tua voz e do teu olhar. Sinto esta impotência absurda de não poder contar-te tudo, de não podermos tomar um xiripiti juntos.

Só passou um ano. Parece tão pouco e é já uma eternidade de ausências.
Está tudo tão diferente, mamã… está tudo tão despido…

Queria tanto que conhecesses uma pessoa que teria amado conhecer-te. Uma pessoa muito especial… Queria…

Pouco depois de nos deixares, quando a mana acordou do coma e começou a entender o que lhe dizíamos, eu disse-lhe que a tua morte não seria uma tragédia, mas antes uma revolução. Faz hoje um ano que partiste e a revolução continua, Mamã!

Teu Rapaz,
João Paulo


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Parabéns, Mãezinha!

Olá mãezinha.

Tu partiste de repente. Sem aviso. De consciência tranquila e sem remorsos. Enfrentavas as tuas dificuldades com um sorriso nos lábios e eras, no passado dia 23 de fevereiro, uma mulher autónoma, livre, absolutamente resolvida. Quer em termos da tua espiritualidade, quer em termos dos teus objetivos. Amavas e eras amada. Tinhas um círculo vasto de amigos. E era visível, na tua face e nas tuas palavras, a alegria pela antecipação de conheceres o teu bisneto. O James. O bisneto que não conheceste por meros 47 dias.

Hoje, farias 74 anos. Já tinhas casado, parido e criado dois filhos, sobrevivido a uma guerra, derrotado um cancro e estavas numa fase luminosa da tua vida. A beleza do teu sorriso espelhava isso mesmo. Uma curva, um acidente estúpido, um momento de infelicidade, levaram-te quando mais parecias querer viver.

Tu não deixaste só um vazio. Deixaste uma lição de vida. Um lastro de amor e resiliência.

Os teus gestos vivem em mim. As tuas palavras habitam em mim. A tua força guia-me. A tua presença é constante.

A vida não é a mesma coisa sem a tua presença. Mas continuamos honrando a tua herança de busca da felicidade, a tua determinação, o teu sorriso, a forma despachada e resoluta de enfrentares as dificuldades e de fazeres o que tinha de ser feito.

O teu bisneto tem os olhos azuis e é dinâmico. Ias amá-lo profundamente. O teu neto é um pai carinhoso e dedicado e tem uma esposa carinhosa e dedicada.

A mana está bem ou, pelo menos, está muito melhor do que seria de esperar. Levou tempo a cura das feridas do corpo. Levará mais ainda a cura das feridas da alma. Mas ela é forte e tem também, agora, a obrigação de sobreviver-te. De honrar-te.

Eu… tu sabes tudo sobre mim… tenho-te contado diariamente… amiudadamente…

Parabéns, mãezinha! Dou-te os parabéns. Darei sempre. Eu sei que tu gostas de fazer anos. Sempre gostaste. E, por mais perfumes que te ofereça, nunca serão de mais… era sempre uma escolha certa… afinal de contas, tu gostas de tomar um banho e arranjar-te e perfumar-te antes de… ires para a cama!

Do teu filho,
João Paulo.


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Mails para a minha Irmã

Chegou a hora, Mana!

Olá, Mana.

Chegou a hora de dizer-te que te amo. Sempre amei. Sempre amarei. Chegou a hora de dizer-te que, para mim, não tens defeitos. Chegou a hora de dizer-te que, desde que nasceste, foste o meu milagre de vida, o meu segredo revelado, o sentido que faltava dar aos dias e às noites. Que amo tudo em ti. A forma apaixonada e ingénua como te entregas aos ideais, a forma genuína e desinteressada como assumes compromissos, o brio que colocas em tudo o que fazes. Não são os outros que estão certos, Mana, és tu! É o teu coração que bate compassadamente ao ritmo das coisas lindas e acertadas que os nossos pais nos ensinaram. Fui eu que nasci antes, mas és tu a mais velha, és tu o farol e é a ti que temos de seguir. És tu o exemplo do que foi feito e o guião do que falta fazer. E estas coisas são assim porque estiveste sempre mais próxima do centro desses ideais, porque nunca abdicaste deles.

O nosso amor e a nossa união não podem ter vacilações nem intermediários. Não podem ser hipotecados sob pretexto algum.

Como te amo, Mana. Como te amo. E como quero que sejas feliz e livre e autónoma e, sobretudo, como quero assistir a isso tudo. E como sei, hoje, que foste sempre tu quem esteve certo. Como compreendo, hoje, a tua luta, o teu desespero. Não te sintas perdida de novo. Não precisas desesperar de novo. Eu cheguei! Eu estou aqui! Sentes a minha mão na tua mão? Sente, Mana, sente! Não importam mais os aviões, não importam mais as distâncias, não importam mais as regras dos outros. No exato momento em que a nossa mãe morreu, eu renasci para ti. Para te segurar a mão, para te perguntar como estás e onde queres ir… renasci para me certificar de que todas as tuas passadas serão dadas na direção que tu escolheres. Vamos viver, Mana, o que temos para viver, sem cedências, nem contemplações, orientados pelo brilho dessas duas estrelinhas maiores que brilham por nós lá no alto do Céu e nos indicam o caminho que nos tinham ensinado.

Com Amor,

Mano.


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Mails para a minha Irmã

A Vida não é um Acidente

Olá, Mana.

Um pensamento a que não consigo furtar-me na sequência do que se passou nos últimos dias, em particular, a morte da nossa mãe, é o de que agora estamos sós no mundo. Tu e eu. Restamos tu e eu como herança e responsabilidade das duas pessoas que mais nos amaram no mundo, que mais amámos no mundo. Nós temos família. E amigos. Mas éramos também um precioso e insubstituível núcleo familiar que agora desapareceu por completo. E não me sobrevem uma única mágoa, nem a mais leve sensação de tristeza. Tivemos um pai íntegro, honesto, trabalhador, com um incorruptível código de valores que foi o fundamento do nosso ser, da nossa existência, da nossa interação social. Foi ele que nos passou o respeito pelo outro, a retidão, o sentido de compromisso, a não cedência às tentações que corrompem. Lutou por nós, viveu por nós, e só morreu quando nos julgou a salvo de percalços maiores que a vida pudesse trazer. Já agradeci muito por não nos ter deixado qualquer herança material. Por não nos ter deixado nada que interferisse com esta herança essencial de valores. Algo que pudesse brilhar e com esse brilho ofuscar o bem maior e mais precioso que nos deixou. E tivemos uma mãe que nos amou incondicionalmente, que nos protegeu, que nos motivou e que fez por nós o que mais ninguém faria, mesmo quando isso teve de ser retirar-se e dar-nos espaço ou agarrar-nos por um braço e mostrar-nos o caminho. Era o entusiasmo em pessoa, a alegria e o dinamismo, o ímpeto repentista e o carinho de nos pentear o cabelo. Viveram plenamente, em liberdade plena, em plena harmonia, em dedicação plena. Viveram por si e viveram por nós. Para nós. E tinham imperfeições e eram essas imperfeições que realçavam a maravilha da harmonia que eram para nós. Seus filhos. Seus tesouros de amar. De Amor.

Não há distância no seu desaparecimento físico e não pode haver tristeza. Só saudade. E tem de haver orgulho, tem de haver a responsabilidade e a determinação de continuar o seu legado, tem de haver espaço para o sonho, tem de haver amor, tem de haver verdade. E tem de haver a coragem de procurar e perseguir tudo isso, mesmo em tempos de adversidade. Sobretudo em tempos de adversidade. Temos muitas diferenças. Somos muito diferentes e temos também muito em comum. E o mais importante que temos em comum é o sentido que os nossos pais deram à vida.

Não sintas, NUNCA, culpa e, menos ainda, remorso. Os nossos pais definiram sempre os seus caminhos e fizeram as suas opções com base no seu código de valores e no amor que nos tinham e com que nos criaram. E, naquela tarde, tu conduziste o carro também por opção da mãe que to confiava. E não tens culpa do golpe de sol pela frente, da curva apertada, do cascalho no chão, do carro velho e pouco seguro. Não tens culpa das circunstâncias porque as circunstâncias foram isso mesmo: circunstâncias. Mas seremos sempre culpados, tu e eu, de não honrarmos e de não difundirmos o seu legado de amor, verdade e integridade, se nos desviarmos dele.

Estamos sós, Mana, e é sós que temos de assumir a responsabilidade de não deixar morrer esse legado, de não permitir que a morte última e verdadeira, a do esquecimento, se abata sobre o nosso paizinho e a nossa mãezinha. É neste propósito que tem de fundamentar-se a nossa união e é este propósito que tem de ser o guia das nossas opções e dos nossos gestos daqui em diante.

A vida não é um acidente, Mana. É uma sucessão de opções e nós herdámos o melhor dos guiões para optar.

Com Amor,
Mano.


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Os Votos de MPMI para Esta Quadra Natalícia

mano-e-manaFeita a jornada de trabalho e a viagem que ligou Maputo a Joburg, feito o caminho aéreo e incerto que nos retrouxe a casa na velhinha e charmosa Europa com muitas peripécias pelo meio, até um avião avariado, o que vale é que eu saí do avião e vim cá fora dar um empurrão, foi tempo de reencontros e novas aventuras e até novas pessoas nas nossas vidas.

E porque tudo isto são milagres de vida, o mano e a mana deste blogue vêm desejar a todos os leitores, amigos e familiares, uma Natal repleto de harmonia, de alegria, de doces, de música, de amor, de família… e um novo ano a superar todas as expectativas!

FELIZ NATAL E PRÓSPERO ANO NOVO!

jpv


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Citação do Amor

bíblia coríntios
“O amor é paciente, o amor é bondoso. Não inveja, não se vangloria, não se orgulha. “

Coríntios 13:4


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Olá Mana!

Saudades! Muitas!

Hoje é 31 de maio. Faz, portanto, 39 anos que reaprendemos a viver! Não morremos. Renascemos…

Amo-te muito, Mana!

Mil beijinhos,

Mano

 

A reler: https://mailsparaaminhairma.wordpress.com/2011/05/31/a-noite-mais-longa/


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Antes do Tempo

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Antes do Tempo

Antes da memória.
Antes da penumbra no olhar.
Antes da história
E de termos de explicar.
Antes de morrer a inocência.
Antes de termos cuidado.
Antes do nosso futuro
Não ter passado.
Antes de um dia aziago.
Antes de uma lágrima corrida.
Antes do ritual fúnebre
Que marcou a nossa vida.
Antes do tempo
Em que não havia tempo
Antes de quase tudo
Ser só um momento.
Antes desse tempo,
Tu eras menina
E bailava no teu olhar
O brilho de um sorriso.
Antes desse tempo,
Era um gesto conciso.
E absoluto.
Era das tuas palavras
Que eu bebia a vida,
Era da tua vida
Que eu marcava a partida.
E a chegada.
Antes desse tempo,
O tempo era tudo
E a fortuna era nada!

jpv
À minha Mana