Mails para a minha Irmã

"Era uma vez um jovem vigoroso, com a alma espantada todos os dias com cada dia."


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Não Te Custava Nada

Não te custava nada
Emprestares-me essa almofada.
Não precisava ser dada, dada.
Bastava que fosse emprestada.

É que lhe fica tão bem assente
O que resta da minha mente
Que anda neste mundo perdida
Desde que te viu poisada
Nessa macieza adormecida.

Não te custava nada
Deixar misturar teus sonhos com os meus
Para que se encontrassem na noite escura.
Dormirem nossos sonhos separados
É torpe e vil tortura
Indigna de tua posição.
Basta que te chegues para lá
Metade de certa porção
Equidistante entre o teu
E o meu coração.
E, a meio da noite,
Por sinuosos e sonhados caminhos,
Encontram-se os sonhos alados
Na almofada emprestada…
Enquanto nós dormimos juntinhos.

jpv


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Libelinha

Porque vieste aqui pousar,
Libelinha de voo incerto?
Andavas por aí a voar
E vieste parar aqui perto.
Porque vieste aqui pousar,
Libelinha de voo incerto?
Atrair meu olhar,
E distrair meu coração deserto?
Se ao menos teu voo
Desenhasse em forma perfeita
As passadas que me faltam dar…
Mas teu voo é incerto e breve
De curva larga e rota pouco direita.
Não serve de lição nem ensinamento
A este coração sangrando sofrimento.

Vai-te embora, Libelinha.
E leva esse voo sem consistência,
Que meu coração chora e sofre
Com tua leve inconsciência.

jpv


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Senhora

Princesa da minh’ alma,
Senhora de meu coração,
Comandante deste terreno
Sem norte nem chão,
Vem exercer teu reinado
Em meu corpo despido,
De teu desejo convertido
Em pobre e humilde estalagem.
Vem ser Senhora deste servo,
Vem sujugá-lo a ti,
Exigir-lhe apaixonada vassalagem.
Não quero coroas,
Nem espadas cintilantes,
Quero somente as insígnias
Dos amados e dos amantes,
Esse arfar voluptuoso,
Essa seda de odores
Em meus lábios,
Teu sexo exposto
À minha investida obediente.
Há no mundo tantos reinos
E reinados tão diversos
Sobre multidões de gente
Ondulante e distraída,
E ninguém percebe
Que és tu a Senhora
Deste sopro, desta vida…
Já me ofereceram o mundo,
Poços de dinheiro sem fundo
Onde pudesse ser feliz.
Já atendi a todas as mesas,
Já comi em todos os banquetes
Iguarias incertas
E palavras repletas de certezas.
E recebi os olhares
E os sorrisos desejosos
Das damas e das donzelas
Mas não são elas…
Só tu,
Senhora da distância
E do silêncio,
Comandas meu Destino
E meu Tempo.

Princesa da minh’ alma,
Senhora de meu coração,
Comandante deste terreno
Sem norte nem chão.

jpv


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Short Stories

The Last Song

A história Começa muito antes, mas não nos demoremos, não percamos tempo, sigamos para o essencial. Chegou o dia em que lhe pediu que guardasse seu coração como algo precioso. Como uma jóia de amar, um belo e vistoso colar em pedras de paixão. No início era toda zelo e cuidado na forma como lhe tocava, como lhe pegava, e como o acariciava devagarinho para não o estragar. E depois veio o entusiasmo e a admiração e beijava-o, sôfrega e voluptuosa, e apertava-o contra o peito e dava-lhe dentadinhas de provocação em jogos de clara e magnética sedução. E quando já era seu, partiu-o e deixou-o abandonado numa gaveta esquecida. E ele ficou ali. À espera dela, que lhe devolvesse o seu coração intacto ou quebrado, a funcionar na perfeição ou estragado. E agora vive só, entregue ao seu azar, à procura de quem saiba consertar corações despedaçados. Deambula, perdido, pelas ruas, vivo e sem coração que preste. 


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Súbdito

Ó pobre de mim!
Abandonado
E torturado, assim,
Na tua presença
E na ausência tua.
Teu corpo vestido,
Tua alma nua.
Quisera preencher-te a alma,
Despir-te o corpo,
Libertá-lo dessas amarras
E preenchê-lo também,
Com ganas e garras,
Nesse deleitoso ritual
Que me faz refém.
E, no momento da rendição,
Entregar-te meu coração
Para o abandonares de novo.
Tu és a rainha
E eu sou o povo.
Proletário dos afetos,
Errante mendigo de teu corpo.

jpv


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O Verbo Embalar

sol

O silêncio.
E era isso, a vida.
Muda.
Iludida.
Ecoou, então,
Em tom sereno
E pausado,
O som de um coração
Batendo apaixonado.
Correu em mim
Um arrepio
E uma urgência veloz
No momento exato
em que escutei
A tua voz.
Eram coisas simples
E era a vida toda.
Numa frase.

A síntese precisa
Do que não dizias
Espelhada
Nas palavras que proferias.

Houve um silêncio.
Sim.
E ruídos.
De fundo.
E houve, depois,
Esse timbre
Que me ensinou
O mundo.
E o amor.
Não calo mais
Meus ouvidos.
Não tenho
Como não escutar.

Ainda que fosse
Surdo profundo
Seria na tua voz
Que me havia
D’embalar.

O silêncio.
De novo.
E a vida que se retoma…

jpv


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Sombra

20170716_111230

És a sombra
Do Amor que partiu.
És a luz
Que não entrou.
A ave assustada
Que fugiu.
E eu fui crescer
Noutro coração.
Alma errante
À procura de chão.

jpv


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Volta ao Mundo

20160522_090448

Uma palavra que seja.
Uma palavra para que se veja.
Uma palavra é como ter-te aqui.
Uma palavra é o princípio de todas as coisas.
E é o fim.

A tua voz embala destinos.
A tua voz são infinitos caminhos.
A tua voz é a grandeza de sentir-se pequeno.
A tua voz inaugura um homem e funda uma nação.
De esperança.

A distância que nos une
É maior e mais grande que este tapete que faço e desfaço.
Vive no fulgor de um abraço, na doçura do teu olhar.
A distância que nos une
É a exata forma do querer e do amar.

Procurei-te onde não estavas.
Corri montes e cabeços.
Ao sol, à chuva e ao vento.
Indiferente à desilusão e ao tempo.
E encontrei-te no lugar pequeno de meu coração.

Para ir tão longe…
Não era preciso dar a volta ao mundo da ilusão.

jpv


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Duas Estrofes de Pecado

Duas estrofes de pecado

Duas Estrofes de Pecado

O pecado tem um sorriso
Que encanta
Quando é olhado.
Etéreo e impreciso,
Nasce no teu rosto
O sorriso do pecado.

E dou voltas à mente
Procurando esquecer a tentação.
Meu coração não sabe o que sente
E peca mesmo sem razão.

jpv
(Foto gentilmente cedida por Ruth Kissa)