Mails para a minha Irmã

"Era uma vez um jovem vigoroso, com a alma espantada todos os dias com cada dia."


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Short Stories – Equívoco

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Short Stories – Equívoco

Era um tipo decidido. Resoluto. Sabia bem o que queria da vida e raramente olhava para trás. Era um cavaleiro andante, um destes homens que não para em lado nenhum porque está em todo o lado. Um conhecedor. E, sem ser belo, era charmoso. As suas palavras tinham o dom de comandar e o poder de seduzir.

Um dia atravessou um oceano e dois continentes e conheceu uma menina meiga e tímida, de poucas palavras e muitos e calorosos beijos, uma menina de satisfazer-lhe os caprichos na cama, de rir-se com ele, de cuidar de si, de andar consigo de um lado para o outro como uma sombra apaixonada. Ela nunca soube, porque ele não o permitiu, manteve sempre a pose e a atitude da personagem que tinha construído, mas ele apaixonou-se. O desejo incendiou-lhe o peito, semeou-lhe a dúvida na mente e assustou-o.

Saíu. Atravessou os continentes e o oceano em sentido contrário.

Estava longe dela, já, onde os dias começam ao contrário e os rios correm noutra direção, quando a viu na rua. Ali, onde seria impossível que estivesse. Estava agachada, dando um nó aos atacadores no sapato de uma criança e ele olhou-a enquanto passava e o seu pescoço foi-se virando para trás até que deu meia volta e ficou a dois passos dela, a olhá-la como que a certificar-se de que era mesmo ela. A rapariga pressentiu a sombra dele e olhou para cima:

– Desculpe, em que posso ajudá-lo?
– Nada, nada. Eu é que peço desculpa. Confundi-a com outra pessoa.

À medida que se afastava, o homem das palavras certas lutava contra as lágrimas e as suas próprias convicções.

jpv


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Short Stories – Guilty Pleasure

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Trabalhava num escritório. Usava fato cinza ou azul escuro e uma gravata em padrão impreciso. Era chefe. Tipo respeitado. Muito cumpridor de regras, muito fazedor de cumpri-las! Formal. Em tudo. No respeito pelas hierarquias, no trato e nas comunicações, na cadeia de ordens a receber e a dar. Comprou uma casinha de madeira e implantou-a no campo a uns sanitários trinta minutos de distância da grande urbe. À noite, quando chegava, abria o portão com o comando, enfiava o carro na garagem e ali mesmo, ao lado da casa, atirava a gravata para trás das costas, desabotoava o cinto das calças que caíam até ao joelho, olhava as estrelas no céu negro e mijava fartamente para o chão. Reencontrava-se.

jpv


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Short Stories – Auto Stop

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O tipo ia descansado, fazendo o que tantas vezes fazia, resolvia problemas, fazia contas à vida, enquanto conduzia. E quando chegava ao destino nem se lembrava por onde tinha passado. Mas nesse dia não chegaria ao destino sem que ela o mandasse parar. Estava fardada. Tinha um sorriso convidativo, um corpo suficientemente curvilíneo para se perceberem por baixo da farda as curvas e as contra curvas. Levantou-lhe o braço. Ele encostou, abriu um pouco o vidro do carro, estendeu-lhe os documentos e ouviu-a perguntar para onde ia. Ia para casa. Tens lá a tua mulher à tua espera? A pergunta era ousada, pouco apropriada à farda. Ele respondeu. Sim, vou ter com ela. E não me preferes a mim? Ele olhou-a de alto a baixo, fez um auto stop às intenções, subiu o vidro e deslizou dali sem mais palavras. Não eram precisas.


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Short Stories – Devoção

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Ele rondou-a. Andou tenteando o caminho. Farejando a brecha. Mas ela fechou-lhe as portas. Barrou-lhe a passagem. E ele sem perceber, como é normal nos machos. E, como que para não vir de lá arranhado, deixou de rondar-lhe as saias. E, do nada, como chuvada de verão, dias passados, sóis vencidos, ela aproximou-se, sem pedir licença, ajoelhou-se diante dele, abriu o que tinha de abrir, segurou o que tinha de segurar, em devota posição, sensual movimentação, de ritmo marcado pela mão dele segurando o cabelo crespo dela junto à nuca. E ali ficou devoto da devoção dela. Sugando o momento, sorvendo cada segundo, sempre sem perceber. Já se tem ouvido falar disto. Machos comandando comandados!

jpv