Mails para a minha Irmã

"Era uma vez um jovem vigoroso, com a alma espantada todos os dias com cada dia."


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Paradiso VIII

As cadeiras continuam abandonadas

E chega, aos meus pés,

Um restolhar

Do mar

E rocha

Que dão o descanso.

Bate e bate e bate,

E de novo bate,

Como se estivesse

A castigá-la.

Mas os beijos

Do mar,

Se vem de lá tão longe,

Hão de ter essa profundidade,

Essa paixão,

Ressonada na rocha

Que o acolhe.

jpv


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Paradiso VI

Oiço as canções

Do vento.

Mais lentas

E dolentes,

Mais inquietas

E desassossegadas,

A fazerem um pardal

Tombar na corda

E tentar

Equilibrar-se junto à papaia.

O mar enfurece-se,

Chamando a isso,

Subir um pouco as calças.

E os pardais

Atrevem-se a ver

O que está nas mesas,

E as pessoas

São generosas.

As mulheres

Viram-se nas camas,

Algumas aborrecem-se

E vão para o quentinho dos quartos.

O  que daqui se avista,

É o ondular do mar,

Insensível às nossas coisas.

A piscina continua a oferecer-se,

Mas, hoje, não tem clientes.

Ouve-se uma canção

Indizível entre dois pescadores,

E um deles

Passa com a mesma cama

Na minha frente.

jpv


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Paradiso I

Há algas

A bordejar o mar.

De que são feitas?

Bordejam o mar

Com tanta beleza

E tanto carinho.

Eu segui as algas

E encontrei, lá longe,

Um pescador.

Daqui é como

Se estivesse parado,

Mas sabemos

Que hora a hora,

Traz o seu pescado.

E mais longe ainda

Um farol.

Não se vê a luz,

Agora,

Mas eu sei que existe.

Quando uma traineira

Passa longe

E uma garça

Desliza longínqua

E silenciosa,

Eu sei que

As janelas do paraíso

Foram abertas.

jpv


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Poloni – In Memoriam

Teve uma vida repleta e intensa.
Não morreu novo, mas poderia ter vivido mais.
O Poloni gostava, sobretudo, da companhia das pessoas.
E amava o mar. Enfrentava ondas enormes, vinha de lá enrolado em água e cheio de areia, sacudia-se e voltava a investir. Nunca teve medo do mar.
Adorava caçar caranguejos nas areias da praia de Chongoene.
Rosnava a quem não lhe agradava e detestava ser encurralado em espaços exíguos.
Enroscava-se na sua cama ao fundo do quarto e tudo estava bem desde que sentisse pessoas. Por vezes, a meio da noite, desatava a ladrar que nem um louco como se lhe tivesse sido confiada a missão de acordar todo o mundo adormecido. Era um bom guarda.
Gostava de comer sem ser incomodado e roubava sempre um lugar no sofá ou mesmo um sofá inteiro.
Onde quer que esteja, está no melhor dos locais e, por certo, anda a enfrentar ondas marinhas.
Foi feliz e gerou felicidade à sua volta.

jpv


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O Mar Reclamou

As aves em migração
Desviam-se da rota,
Perdem o Norte do voo
E desencontram o lugar.
E as flores florescem prematuras,
Coloridas de êxtase,
Ao sentir-te passar.
As nuvens buscam outros céus
E chovem as chuvas desencontradas
Dos solos férteis,
E vão beijar as areias
Escaldantes do deserto.
Hesita na passada
A mulher que deambula
E vira-se, para olhar,
O homem que passa perto.
Estas diferenças
O Mundo não notou.
Mas o mar… o mar reclamou.
Certo rio desviou-se de seu curso
Por te seguir.
Galgou rochas secas a fugir
E inaugurou rotas
Por onde passavas.
Procurava tocar-te,
Perseguia teu odor
E a luz do teu sorriso.
E a água do seu caudal
Não aportou
Na rebentação do mar salgado
Que reclamou.

E o rio reencaminhou-se.
E as mulheres e os homens
Voltaram às suas rotinas.
E as chuvas caíram de novo
Onde era suposto caírem.
E as nuvens reagruparam
Na rota certa.
E voltaram a florir e a perfumar
As flores onde se esperava que o fizessem.
E as aves retomaram seus percursos,
Os longos e os escassos,
Para que pudesses, ó mulher,
Regressar a meus braços.

jpv


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MATINAL

O mar no horizonte.
O mar é o horizonte.
A graça de olhá-lo,
De contemplar a ondulação
Quase impercetível
Que vem beijar o areal.
A marcha ociosa,
Do espreguiçado tempo
De ter tempo para nada.
As palmeiras disputam
Os segredos de quem passa
E o mar namorando
A areia molhada.

jpv


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Há um mar encapelado
No meu peito.
Revelam-se monstros, fantasmas,
E figuras sem forma nem jeito.
Há lumes a arder,
Fumos encarniçados
E mortes a morrer.
Há criaturas que cospem fogo
E salivam revolta.
Há deuses agrilhoados
E demónios à solta.
E há, depois,
O resgate da tua carícia,
O encanto do teu olhar…
Há esperanças que me entregas num beijo
Mesmo antes de acordar.
E há volúpias sedosas
E a marca da tua pele de cetim.
Há sons encantadores
Que te embalam
Para junto de mim.

jpv


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Se…

Se soubesses, meu amor,
O quanto gosto de ti.
Se ao menos conseguisses imaginar
Todos os peixinhos que há no mar,
Nesse oceano sem fim,
E quantas estrelas há no céu…
Saberias uma centelha
Das razões por que sou teu.

jpv


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Passeio Matinal

passeio-matinal.jpg

Basta a luz
Cristalina do sol firme.
Basta o azul
Intenso do céu a cegar.
Basta a areia
Desfazendo-se sob os pés.
Basta o mar
Conversando emoções inexplicáveis.
Basta um samba doce
Embalando a alma
E provocando a anca.
Basta o cão
Deitado a meus pés
Aguardando o destino de ambos.
Basta ser intensamente
Igual a mim.
Basta erguer a vontade
E deixar passar a vida.
Basta não indefinir
A coisa clara e definida.
Basta deixar morrer
O que mata a contemplação.
Basta não lutar
Todas as lutas alheias.
Basta não responder
Às motivações fictícias e feias
Que esgotam e desgastam.

Basta…
A simplicidade…
Basta…

jpv


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Praia

IMG_2532

Mar.
Sol.
Enlevo.
Sal na ferida aberta.

Areia.
Brisa.
Luz na alma.
Alma deserta.

jpv