Mails para a minha Irmã

"Era uma vez um jovem vigoroso, com a alma espantada todos os dias com cada dia."


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Desejo Noturno

Uma só.
Uma só palavra.
Uma só palavra no momento.
Uma só palavra no momento exato.
Explode a invasão,
Doma-se o domador,
Toma-se o tomador.
Perde-se a visão, o sabor, a audição e o olfato.
Fica só a palavra.
A intenção.
A remota ideia de existir
E o êxtase sublime do tato.
Já viveu o homem.
O homem agora morre.
Já não sabe quem foi.
Não se lembra, já,
Nem lhe ocorre,
Quem tivesse sido.
Esta palavra foi a morte
Do homem renascido.
Alonga-se o tempo.
Alonga-se o tempo todo.
Alonga-se o tempo todo no espaço exato.
Não fica, sequer, o tato.
Só o abandono.
Só o abandono nos braços.
Só o abandono nos braços da mulher.
Tudo renasce.
Tudo renasce quando.
Tudo renasce quando o homem quer.

jpv


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Senhora

Princesa da minh’ alma,
Senhora de meu coração,
Comandante deste terreno
Sem norte nem chão,
Vem exercer teu reinado
Em meu corpo despido,
De teu desejo convertido
Em pobre e humilde estalagem.
Vem ser Senhora deste servo,
Vem sujugá-lo a ti,
Exigir-lhe apaixonada vassalagem.
Não quero coroas,
Nem espadas cintilantes,
Quero somente as insígnias
Dos amados e dos amantes,
Esse arfar voluptuoso,
Essa seda de odores
Em meus lábios,
Teu sexo exposto
À minha investida obediente.
Há no mundo tantos reinos
E reinados tão diversos
Sobre multidões de gente
Ondulante e distraída,
E ninguém percebe
Que és tu a Senhora
Deste sopro, desta vida…
Já me ofereceram o mundo,
Poços de dinheiro sem fundo
Onde pudesse ser feliz.
Já atendi a todas as mesas,
Já comi em todos os banquetes
Iguarias incertas
E palavras repletas de certezas.
E recebi os olhares
E os sorrisos desejosos
Das damas e das donzelas
Mas não são elas…
Só tu,
Senhora da distância
E do silêncio,
Comandas meu Destino
E meu Tempo.

Princesa da minh’ alma,
Senhora de meu coração,
Comandante deste terreno
Sem norte nem chão.

jpv


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Lá Longe

amor

Lá longe.
Lá, onde o olhar não chega,
Do outro lado do Mundo,
Há um peito
Onde habita meu coração
A bater profundo.

Lá longe.
Lá, onde os rios correm ao contrário,
Bate a descompasso
E sem horário
Um relógio de amar.

Lá longe.
Lá, onde estou, mas não chego,
Aguarda-me esse inigualável sossego
De teus braços a abraçar.

Lá longe.
Lá, nessas ruas desertas de mim,
Onde deambulam teus passos, assim
Como quem me inaugura o desejo…
Lá, onde estou e te não vejo,
Mas te amo com devoção.

Lá longe.
Lá, onde me falta o chão
E me sobra o caminho.
Lá, onde piso devagarinho
E me aproximo sem chegar
A esse apetecível altar
De rezas e súplicas imploradas.
Lá, onde está teu ser
E meu ser desejava estar
Ao cair da noite
E nas auroras anunciadas.

Lá longe…

jpv


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Ousadias

chocas

Não me sais do peito.
Apetecem-me ousadias
Sem jeito.
E ternuras desmesuradas.
Apetece-me o teu olhar
Encantado
E as tuas mãos
Em meu corpo saciadas.
Apetece-me beijar-te
A pele
E a alma.
Menos que isso
É estar morto.

jpv


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Príncipe

tree

Ainda agora
Se não via,
Em teu rosto,
O mais insuspeito
Traço de alegria.
Ainda agora,
Há uns momentos atrás,
Diria que te faltava toda a paz.
Negro e dorido,
Teu coração,
Sem horizonte
Nem solução.
Ainda agora,
Há poucochinho,
Diria que choravas
Por dentro,
Vítima de violento
E incontrolado sentimento.

Mas ele chegou.
Talvez fosse um príncipe,
Mas não parecia um príncipe.
E teu rosto se iluminou.
Passo desacertado,
Chinelo no dedo,
Mal segurado.
A barba desalinhada,
A camisa branca aberta
E desengomada,
A alma deserta
De tudo,
Menos de ti,
Como querias.

Pensei que sabias,
Eu desejei, em tempos,
Ser ele.
E outra, que não conheces,
Eras tu.
Já não tenho
Esse desejo cru
E genuíno.
Hoje, contento-me
Com a tua luz,
Como o menino
Que vê brincar os outros
E fica feliz.

Não és ela.
Mas és a prova
De que havia,
Para o príncipe em mim,
Uma donzela.

E agora resta-me
Ver-te a face
Em leve rubor
De excitação.
Restam-me estes sentimentos
Confusos e dispersos,
Estas linhas sinuosas,
Estes atormentados versos.

jpv


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Tu Sabes

mar

Tu tens desejos
No corpo.
Tu tens convites
Nas linhas curvas
Da tua figura.
Tu sabes que há beijos
Por dar
Que são para mim
Doce tortura.

Tu sabes como dizer sem palavras.
Tu sabes como chamar
Com o silêncio do teu sorriso.
E até sabes que levas nas ancas
A perdição total de meu juízo.

E, contudo, passas.
Indiferente às ameaças
de meu cercar.
Sábia em cercos,
Em dar de corda
E em apertos,
E em ter-me preso a ti,
Entre tuas coxas amarrado!
Santa luxúria,
Beato pecado.

Não.
Não penso hoje nos seios
Que me faltam as palavras e os meios
Para tanto navegar.

Entre nós
Não há nenhum espaço.
E há o mar!

jpv