Queria viver outras vidas,
Mas só me resta…
Esta.
Queria viver outras aventuras,
Encontrar novos portos,
Desvendar outras ternuras.
E ser outro homem
Sendo o mesmo.
Queria viver outras vidas,
Mas só me resta…
Esta.
Morrer outros problemas,
Enfrentar fantasmas diferentes,
Chorar outras lágrimas,
Ter outros amores ausentes.
E ser outro homem,
Sendo o mesmo.
Queria viver outras vidas,
Mas só me resta…
Esta.
Lamber o sal de outros corpos,
Despedir-me de outros mortos,
Viajar outras viagens,
Estender o olhar noutras paragens.
E ser outro homem,
Sendo o mesmo.
Queria viver outras vidas,
Mas só me resta…
Esta.
Trabalhar outros trabalhos,
Beber na pele outros orvalhos
E rasgar a carne nos espinhos de outras roseiras.
Descansar outros descansos
E suar outras canseiras.
E ser outro homem,
Sendo o mesmo.
E há nisto tudo
Uma prisão
E uma finitude
Que me ofende
E oprime.
Não me chegam as promessas
De outras vidas,
De aléns oferecidos pelas divindades
E pelos livros sagrados.
Não me chegam os jardins
Nem os juízos, nem os encontros entre finados.
Não me chega a eternidade prometida
Se esta é a única e verdadeira vida
Que vejo e sinto em mim.
Nada me chega
Se paira sobre tudo isto
O lúgubre espectro do fim.
jpv
