Mails para a minha Irmã

"Era uma vez um jovem vigoroso, com a alma espantada todos os dias com cada dia."


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Paradiso X

Pardais.

Trepam todas as superfícies.

Ainda há pouco

Subiam a escada

Pelos caminhos

E ao mesmo tempo

Pelos degraus.

Enquanto um espiava

Os restos deixados

Numa mesa.

Outros debicavam

Uns grãos

Outros no chão.

E por fim,

A coragem de ir a uma mesa.

Dormem, às dúzias,

Por sob as palhas

Dos chapéus-de-sol.

E regozijam na grama

Da hortelã.

E por fim,

Uma pausa

Para interrogar-me

Porque um paraíso

Só tem pardais,

Só pardais.

Pardais.

jpv


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Paradiso VI

Oiço as canções

Do vento.

Mais lentas

E dolentes,

Mais inquietas

E desassossegadas,

A fazerem um pardal

Tombar na corda

E tentar

Equilibrar-se junto à papaia.

O mar enfurece-se,

Chamando a isso,

Subir um pouco as calças.

E os pardais

Atrevem-se a ver

O que está nas mesas,

E as pessoas

São generosas.

As mulheres

Viram-se nas camas,

Algumas aborrecem-se

E vão para o quentinho dos quartos.

O  que daqui se avista,

É o ondular do mar,

Insensível às nossas coisas.

A piscina continua a oferecer-se,

Mas, hoje, não tem clientes.

Ouve-se uma canção

Indizível entre dois pescadores,

E um deles

Passa com a mesma cama

Na minha frente.

jpv


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Normas de Boa Convivência

Ainda me lembro do meu pai na sua eterna janela, já doente, prisioneiro do espaço, encontrar numa pomba a liberdade possível. Sempre gostou de animais. Tinha por hábito dar nomes, por exemplo, aos pássaros. Recordo piriquitos com que o meu pai conversava e batizara de Chico e Chouriço. A pomba vinha às migalhas que ele colocava na janela e ele habitou-a a esse repasto. E assim tinham negócio montado. Ele providenciava os víveres, ela fornecia a companhia.

Quando recentemente mudámos de casa, já cá havia inquilinos de diversa ordem. E em número basto. Rãs, caracóis, lagartixas, baratas e uma imensidão de aves a popular a casa. um casal de pardais fez ninho mesmo por cima da porta de entrada, ao abrigo do telheiro. Escolha sensata. Sobretudo porque a casa não tinha humanos. Quando os humanos chegaram, os ovos estavam postos e continuou-se a azáfama de acabar o ninho pois que estes homens não tinham vindo para aborrecer, exceto às primeiras horas do dia, quando se sentavam por baixo do ninho a tomar o café da manhã.

Certo vendaval noturno trouxe a desgraça. O ninho caiu ao chão. Pela manhã, os humanos iam espetar com aquilo tudo no lixo. Mas não foi isso que fizemos. A Paula foi buscar um vaso de flores daqueles que se suspendem e eu inventei uma forma de pendurar a geringonça num candeeiro por baixo do telheiro. Quando apanhámos o ninho do chão, os jovens pardalitos estavam em mau estado, cabeça a baixo, cheios de palhas, uma bagunça e uma desarrumação. Duas horas foi o tempo necessário para que os pais pusessem a casa em ordem e lavassem as crias.

Quatro dias depois, a malta parece toda muito saudável e chilreante. Estão gordos. Lá fora, tal como cá dentro, ninguém se queixa da cozinheira.

Ao longo dos dias, fez-se a reportagem fotográfica que agora se revela.

Comissão de boas vindas pelo pai pardal.

A habitação tal como a encontrámos.

 

Em processo de mudança após o desalojamento provocado pelo vendaval.

 

Duas horas após a mudança, já a tropa estava toda alinhada e limpinha!

 

O mesmo que o anterior noutra perspetiva.

 

Somente quatro dias depois, a malta já tem casacos novos e engordou muuiiiito!

 

Como as janelas são fumadas e não se vê de fora para dentro, dá para acompanhar a vida da família Pardal bem de perto. Aqui a mãe estava a alimentar as crias.

Vista geral do condomínio!

   jpv