Mails para a minha Irmã

"Era uma vez um jovem vigoroso, com a alma espantada todos os dias com cada dia."


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Rapidinhas da Copa – Adeus!

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Rapidinhas da Copa – Adeus!

E Pronto, tal como prevíramos há uns dias, num assomo de realismo, a Seleção Portuguesa disse adeus à Copa 2014.

Esteve perto! Ganhou por 2-1 um jogo  que teria de ganhar por 5-1. Faltou pouco. O curioso é que Portugal vem embora com os mesmos pontos dos Estados Unidos, que ficam.

Esta seleção jogou muito pouco. Está cansada e desgastada e só hoje fez um jogo razoável. São assim, os portugueses, funcionam melhor sob pressão, têm essa trágica necessidade de deitar tudo a perder para depois se resgatarem heroicamente. Por vezes não é possível. Desta vez não foi. Nem nunca seria. Afinal de contas, o capitão da equipa disse esta semana que nunca acreditou ganhar o mundial e o treinador afirmou, hoje, depois do jogo com o Gana, que tivemos o que merecemos. E tem razão. Tivemos. Mas era obrigação dele trabalhar para que fôssemos mais longe, para que, ao menos, tivéssemos lutado e corrido para ir mais longe. Fazer um bom jogo em três é muito pouco para uma equipa de profissionais habituados à alta competição.

E pronto, agora voltamos a ser do Brasil que é Portugal de amarelo!

jpv


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Rapidinhas da Copa – As Esquisitices do Portugal vs EUA

copa brasil 2014 futebolRapidinhas da Copa – As Esquisitices do Portugal vs EUA

O jogo de hoje, entre Portugal e os Estados Unidos esteve repleto de coisas esquisitas.

1 – Ainda antes do jogo começar, tocava o hino dos Estados Unidos, e o seu treinador, Jurgen Klinsman, que é mais alemão que as coisas alemãs, cantou aquele hino a plenos pulmões. É engraçado porque os treinadores de seleções que não são do seu país costumam ficar em silêncio. Já o Klinsman interiorizou o seu papel de tal forma que sabia a letra melhor do que alguns jogadores americanos.

2 – Portugal marcou cedo. Já é esquisito ter marcado. O facto de ter sido cedo deu aquela sensação de desconfiança, Isto começa demasiado bem para acabar bem!

3 – Portugal deve ser a única seleção que até ao momento sofreu um golo de… barriga!

4 – O jogo parecia um daqueles jogos das modalidades esquisitas, tipo o basquete e assim em que se pode pedir desconto de tempo. A humidade era tal que, ao mais pequeno pretexto, os jogadores de ambas as seleções juntavam-se na linha lateral para beber aguinha.

5 – Ao fim de 185 minutos a jogar, Portugal marca, finalmente, um bom golo. Mas é um golo esquisito. É que a nossa seleção está eliminada, não há qualquer hipótese verosímil de passar à próxima fase, o mais certo é, mesmo, ficar em último no grupo, mas este golo cria a cruel esperança de passar caso vença o Gana por vinte e sete a zero e a Alemanha ganhe aos EUA por trinta e dois a um.

6 – Outra coisa esquisita é que a Seleção Portuguesa levou vinte e três jogadores, mas só já tem dezoito disponíveis. Quatro por lesão e um por castigo. Se isto continua assim, o Ti Manel da lavandaria ainda vai jogar a defesa esquerdo!

7 – Por fim, a mais esquisita das esquisitices. O nosso querido CR7 parece ter desapontado a pontaria. Não conseguiu mandar uma bola na direção da baliza e fez mesmo a figura inédita de atirar algumas demasiado vesgas para ser verdade. Talvez aqueles boatos todos de que ele estava lesionado, mas ia jogar ‘só’ a cem por cento, fossem mais do que boatos.

A frase que se vai dizer com mais frequência nos próximos dias é “Enquanto há vida, há esperança!”, mas é importante sermos honestos e desenganarmo-nos. Portugal é a equipa que pior joga neste grupo e uma das piores deste torneio. Merece vir para casa. É uma equipa fisicamente gasta, sem energia, sem disciplina tática, sem capacidade de pressão e com muito pouco rasgo individual. Estamos numa fase de renovação. Pois então renove-se!

jpv


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Rapidinhas da Copa – Roda Bota Fora

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Rapidinhas da Copa – Roda Bota Fora

Quando eu era miúdo, organizávamos uns torneios de rua ou no recreio da escola a que chamávamos “roda bota fora”. Basicamente, quatro calhaus a marcar duas balizas que não tinham de ser do mesmo tamanho, se um dos guarda-redes fosse mais pequeno, a baliza dele seria menor, duas equipas a jogar, outras à espera, a que perdesse saía e a que ganhasse continuava em jogo. Aquilo era coisa rápida, muda aos dois, acaba aos quatro, para os outros não terem de esperar muito. Normalmente, quem jogava melhor continuava, quem jogava pior, perdia e saía.

Na Copa 2014 não tem sido assim. Há seleções que se despedem jogando muito e bom futebol, mas a crueldade do jogo dita a tradicional injustiça. Se é verdade que a Holanda e o Chile passeiam um futebol de grande qualidade e com ele parecem garantir lugar na próxima fase, já a Austrália e a Inglaterra, jogando igualmente bem, têm sido traídas pela ingenuidade defensiva e pela falta de sorte. Entre os que se despedem e não deixam saudades, temos a desorganização total dos Camarões e a impotência dos espanhóis.

Depois há os assim-assim. Ainda não vejo na Alemanha um sério candidato e o Brasil, estando melhor, ainda tem alguma falta de objetividade. Os argentinos têm de fazer mais do que jogar com Messi e entre mexicanos e croatas, uma seleção de grande valor ficará para trás. Portugal, correndo tudo normalmente, vai para casa no domingo.

Já começou a dança do roda bota fora com desvantagem para as equipas africanas e asiáticas, algum domínio europeu e sul-americano. Nos próximos dias veremos com que desfecho. E uma esperançazinha nas barbas do Meireles!

jpv


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Rapidinhas da Copa – Olé!

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Rapidinhas da Copa – Olé!

A Seleção de Espanha levou uma saraivada de olés contra a Holanda e hoje levou mais umas quantas sombreiradas do Chile e vai daí, ao cabo de dois jogos, pode fazer as malinhas e rumar a casa que mais valia não ter vindo fazer a despesa da viagem e mais a alimentação e algum dinheiro de bolso que sempre se compram uns recuerdos, assim, umas pulseiras de pano a dizer “Eu Amo o Brasil” mas com sotaque que fica muito mais giro.

Ora, eu, que sou rapaz atento, reparei num pormenor interessante e venho aqui deixar um aviso e um conselho aos Governos de Espanha e Portugal. O aviso é que não podem estar desatentos. Nós estamos em crise! Há que poupar! Reparem, hoje o defesa Fábio Coentrão veio embora, a Espanha já sabe que vem embora daqui por uns dias e Portugal vai ficar a saber no domingo à noite, madrugada de segunda. Conselho: assim sendo, em vez de andarem a fretar aviões separados que sai muito mais caro, não seria financeiramente inteligente virem todos no mesmo avião? E vinham para Madrid, claro. Os espanhóis moram lá ou lá perto, vários portugueses moram lá e quanto aos outros, iam as famílias buscá-los de carro que sai mais em conta!

jpv


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Rapidinhas da Copa – Portugal de Amarelo

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Rapidinhas da Copa – Portugal de Amarelo

Embora lá, malta, ver a bola! É que hoje joga Portugal de amarelo!

Não? Claro que sim! Senão vejamos:

1) Muitos dos jogadores do Brasil conhecem melhor o futebol português do que os portugueses. É que jogaram ou jogam em equipas portuguesas. Já os da nossa seleção são emigrantes na sua maioria. Aliás, há mesmo jogadores brasileiros na Seleção Portuguesa.

2) Os brasileiros falam português. Tem sotaque, mas é português!

3) Quando Portugal não ia aos mundiais, já nós, portugueses, torcíamos pelo Brasil. Ou seja, bem vistas as coisas, temos mais experiência em apoiar o Escrete do que a nossa Seleção.

4) E, por fim, a razão insuperável. Apoiar o Brasil é apoiar uma seleção que fala português sem correr o risco de apanhar quatro a zero!

jpv


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Retrato da Festa

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Retrato da Festa

A festa benfiquista em Maputo teve centenas de adeptos em animada confraternização. Um jantar de excelente qualidade, digno de campeões, música, variedades, leilões para todos os gostos e, o mais importante, muita animação, muitos amigos e um clima de cumplicidade e comunhão benfiquista.

Depois de um sábado extenuante, repleto de trabalho, de papéis, de burocracia, este foi o melhor lenitivo!

SLB para sempre!

jpv


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Crónicas de Maledicência – Um Tendão Pomposo

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Crónicas de Maledicência – Um Tendão Pomposo

Ainda o Mundial de Futebol 2014 não começou e Portugal, o país verdadeiro e profundo, já tem razões para estar agradecido ao evento e a alguns dos seus intervenientes. O futebol, por ser um desporto de massas, signifique isso o que significar e, por certo, significa muitas coisas, pode ser extremamente didático.

Até aqui, o português comum tinha joelhos. Depois da lesão de Cristiano Ronaldo, sabe que a essência do joelho é a rótula e sabe também que a rótula tem tendões que servem para qualquer coisa, nomeadamente, correr e dar pontapés na bola. Mas a didática da bola vai muito mais longe. Até aqui levávamos pantufadas nos joelhos, cacetadas, sarrafadas e, derivado das mesmas, ficávamos coxos. Agora já ninguém fica coxo. Os portugueses, por via de seu amado CR7, ganharam o direito a subir de meros coxos a pacientes que sofrem de inflamação do tendão rotuliano. Eu, que tenho vinte e quatro anos de serviço docente esforçado e brioso, nunca consegui ensinar uma tão complexa e extensa sequência vocabular em tão pouco tempo a tanta gente ao mesmo tempo. O futebol ultrapassa-nos a todos.

E isto tem as suas consequências positivas. Agora, o velhote vai ao médico e ai do dótôr que venha para cá falar do romático, ou da ciática, ou da artrose! Isso é vocabulário simplório e comum. Os velhos, agora, vão reclamar o nome apropriado no relatório do diagnóstico: inflamação do tendão rotuliano. Deve ser um tendão pomposo uma vez que lhe deram um nome pomposo que faz lembrar os nomes dos imperadores romanos e daqueles tipos de túnica branca que iam ao senado afacalhar-se uns aos outros depois de noites em loucas orgias. E quando o dótôr perguntar se a pessoa sabe do que sofre e qual a gravidade da doença, o paciente saca do baú da sapiência faustamente recheado em longos telejornais e mai-los programas da especialidade e os diretos e ainda os tipos em cima das motas atrás do autocarro e esfrega nas ventas do médico com todas as definições, sintomas, implicações e terapias relativas e apropriadas ao tratamento.

Isto é assim, caro leitor, investem-se milhões na Educação, em escolas, em vencimentos de docentes, em médicos, em publicidade institucional, em centros de saúde e a coisa resulta em muito pouco. Dinheiro mal gasto, está bom de ver! Já, por seu lado, o Cristiano Ronaldo e os amigos vão ao Brasil dar uns pontapés na bola e outros tantos na gramática e vai daí a população fica genericamente mais douta seja ao nível da Língua, seja ao nível dessa inesgotável ciência exata que parece ser a Medicina.

De resto, isto está tudo cruzado. Bem vistas as coisas, dá para perceber de que lado está a sabedoria. Por exemplo, tecnicamente, Cristiano Ronaldo e os outros vinte e dois juntamente com seu garboso treinador percebem mais da Constituição da República Portuguesa do que o Governo. E as contas são fáceis de fazer. Já alguém ouviu falar do Tribunal Constitucional ter chumbado o que quer que fosse do CR7 e seus amigos? Ah, pois não! Mas a oposição também não se fica a rir. Andava tudo numa lufa-lufa a ver se o Costa ganhava ao Seguro ou se era o Seguro que ganhava ao Costa, se iam a diretas ou se se ficavam pelas indiretas e vai daí o CR7 lesiona-se e os outros dois passam para horários menos nobres, deixam de abrir os serviços noticiosos e ficam entregues a uns especialistas duvidosos que falam depois das 22h. Tecnicamente, o Cristiano nem precisava de apresentar oitenta medidas. Bastava uma meia dúzia e todo o Portugal saberia do que se tratava e toda a Assembleia da República se curvaria às mesmas.

Isto é assim. Há o país real. E há aquele país para onde a gente foge sempre nos podemos escapulir ao país real. Ora, nesse outro país, há um imenso relvado, duas balizas, uma bola, vinte e dois tipos suados com tatuagens e cortes de cabelo criativos e não há lá coxos, há atletas que sofrem de inflamação do tendão rotuliano. E é para lá que emigramos todos. Sempre que podemos. E é por isso que dentro de quarenta e oito horas o país real, quer queira, quer não, vai entrar em auto gestão. Mai nada.

Tenho dito!
jpv


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Crónicas de Maledicência – O Fracasso da Copa

Fifa, Copa, Brasil, 2014, Portugal, JesusCrónicas de Maledicência – O Fracasso da Copa

Não tenho, neste momento, quaisquer dúvidas. A Copa Brasil 2014 vai ser um fracasso. Só o hoje o descobri, mas temo que a descoberta seja incontornável.

Como vai sendo hábito desde que me conheço, ainda que com parcimoniosas exceções, hoje acordei de manhã. E acordei ao som do despertador. Tenho um daqueles que, quando desperta, dá música. Ou melhor, daria. A verdade é que a minha mulher, vá-se lá saber porquê, prefere acordar com notícias. Eu acho aquilo um hábito um pouco sado-maso, uma espécie de bondage do acordar, funciona, mas é violento.

E hoje as notícias que me roubaram aos braços de Morfeu eram sobre o quê? As eleições europeias e o assalto da extrema-direita ao poder por via democrática? Não. Pouco interessante. Sobre os concursos de docentes em Portugal? Na… Sobre a saída limpa ou a retoma da economia nacional ou europeia? Na… Sobre os problemas que assolam as comunidades lusófonas em África como, por exemplo, a fome? Na… Sobre as eleições na Guiné? Na… Tudo matéria de somenos quando comparada com o verdadeiro motivo de notícia com que o dia acordou: o futuro de Jesus!

Eu, por acaso e ignorância, pensei que o futuro de Jesus estava traçado e consistia em ficar ao lado de Deus num cadeirão dourado com um estofo macio em veludo encarnado. Enganei-me. O futuro de Jesus também é encarnado e também é num estofo macio, mas será no banco reservado ao treinador do Benfica. A malta do Rio Ave e do Sporting e do Porto não deve ter gostado nada da ideia porque o Jesus já esteve este ano nesse banco e ganhou tudo. É um alambazado que não deixa nada para os outros. Eu que sou benfiquista também não gostei. Então a Seleção tem um compromisso tão importante como a Copa do Mundo e a gente não manda para lá o Jesus? Vai o Paulo Bento? Que eu saiba o Bento não passou de Papa.

A Copa não terá o mesmo brilho. Não terá o mesmo glamour. Não terá a mesma ciência nem a mesma filosofia e, de certo, não terá a mesma arte. Estará votada ao fracasso, portanto!  Quem é que vai dizer peaners e acardito? Quem é que vai dizer a gente temos? Quem é que vai citar Pascal e fazer perguntas de filosofia aos jornalistas? Quem é que vai comparar a mui nobre arte de treinar jogadores de bola à pintura de Paula Rego? Quem? Sim, quem é que no espectro internacional tem estaleca para dar um espetáculo dentro do outro com a originalidade, sempre renovada, se Jorge Jesus? Ah pois é… ninguém!

A organização da Copa 2014, se andasse com juízo, inventava mais uma vaga para um país que tivesse ficado de fora por uma nesga e pagava para o Jesus treinar os maganos. E aí sim, toda gente ficava a ganhar. Eu dantes pensava que o futebol era interessante por causa da bola, das balizas, dos jogadores… andava enganadinho. A bola tem muito mais interesse com o Jesus no espetáculo e é por isso que eu não vou ligar nenhuma a esta Copa! Sem Jesus, não vale a pena. Já fracassou!

Tenho Dito!
jpv


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Crónicas de Maledicência – O Linchamento da Copa

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Crónicas de Maledicência – O Linchamento da Copa

Eu nunca estive no Brasil. Não tenho qualquer conhecimento profundo do funcionamento quotidiano da sociedade brasileira nas suas diversas vertentes. Cultural, social, política e económica. Logo, não me assiste qualquer autoridade para escrever estas linhas que não seja a de um cidadão interessado naquilo que o rodeia. Nihil humanun alienum mihi est.

Acontece, entretanto, que os mais recentes acontecimentos de teor político-social me trazem preocupado. Porque o povo brasileiro me parece revoltado e em revolta, porque me parece desmandado, completamente desorientado, mais à procura de culpados do que de soluções, porque me parece estar a ser alvo de diversos tipos de manipulação e, finalmente, porque me parece que sofre e se vira contra si próprio.

Não sendo eu uma pessoa que atribua ao futebol uma importância extrema, nem lá perto, encaro-o como uma forma de diversão e tenho pelo jogo o interesse que se atribui a um espetáculo de entretenimento diversificado, também não ignoro tratar-se de um desporto que arrasta milhões de adeptos e assume a dimensão de um fenómeno cultural a que quase ninguém fica indiferente. Além do aspeto cultural, o futebol tem um peso significativo ao nível dos média, ao nivel industrial, comercial e, naturalmente, financeiro. E até do ponto de vista da imagem que se projeta de uma determinada nação. E isto acontece quer através das seleções, quer através dos clubes. Uma coisa é certa, trata-se de um fenómeno de dimensão global. Não ignorável, portanto.

O Brasil, por sua vez, diga-se e pense-se o que se quiser, é, por razões de ordem diversa, uma nação poderosíssima. É “só” o maior produtor mundial de hardware informático, tem cento e setenta milhões de habitantes e falantes da Língua Portuguesa, acolhe a floresta amazónica, justamente chamada de “Pulmão da Terra”, desenvolveu um poderio agrícola e industrial muito significativo, a sua produção cinematográfica e, em particular, a sua produção musical, chegam aos quatro cantos do Mundo, sendo incontornáveis, no âmbito da CPLP, autores como Carlos Drummond de Andrade, Machado de Assis, Jorge Amado…

Este país tem símbolos, ícones e manifestações culturais que o marcam e o caracterizam e, mais do que tudo isso, fazem parte da sua identidade enquanto nação. Brasil é café, Brasil é samba e bossa nova, Brasil é Carnaval e Brasil é… futebol.

E ninguém impôs isso ao povo brasileiro. Foram os brasileiros, enquanto povo, que se afirmaram com essas características, que construíram e assumiram essas manifestações culturais, donde negá-las parece assumir contornos de uma macro-negação da sua própria identidade.

Ora, os brasileiros votam. E quando votaram, da última vez, quero acreditar que escolheram, em consciência, quem consideravam melhor para os governar. Isto não significa, tout court, que os eleitos façam um bom trabalho, ou façam o que prometeram, mas significa que têm legitimidade democrática para governar.

Junta-se a este raciocínio um outro fator. A grande nação brasileira está a atravessar graves problemas sociais e políticos. Altíssimos níveis de pobreza extrema, assimetrias financeiras muito acentuadas, o problema da marginalidade e da criminalidade, a falência do sistema público de saúde e sérias dificuldades em manter um sistema nacional de educação público e de qualidade. E há um outro, pelo que leio, pelo que vejo na televisão e na Internet, que é transversal a todos os outros e não só está na sua génese como constitui um sério obstáculo à sua solução: a corrupção.

Chegados aqui, olhando para a nação que o Brasil é, olhando para as fortíssimas marcas culturais que transporta, olhando para os graves problemas que atravessa, olhando para o universo faustoso que a organização da Copa 2014 comporta, estão criadas as condições para fazer do certame o bode expiatório de todos os problemas e insuficiências e promover o seu linchamento. Como escreveu Camões, tão amado no Brasil, “Mísera sorte, estranha condição”.

Como quase sempre acontece nestes casos, geram-se dicotomias e antagonias que dividem a população. Há os que são a favor da resolução dos problemas e, como tal, contra a realização do certame e há os que são a favor da Copa e a seguir pensa-se de novo nos problemas. Pois, eu penso que, quer um posicionamento, quer outro, são pouco ambiciosos. Na minha humilde, imperfeita e inabilitada visão, os brasileiros deveriam exigir aos seus governantes, nada mais, nada menos, que a realização da melhor Copa de sempre e a resolução dos problemas que assolam a nação. O Brasil tem potencial e gente para solucionar os problemas que enfrenta sem descaracterizar-se culturalmente. Atrevo-me a colocar, por ousadia, duas questões aos meus irmãos brasileiros. Primeira, os problemas existiam ou não existiam muito antes do Brasil assumir a organização da Copa 2014? Segunda, se lincharem a copa e suspenderem a sua realização, os problemas ficam resolvidos? Pois, como se diz por aqui, uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa.

A solução dos problemas sociais tem de ser prioritária, mas não pode levar o país a negar a sua própria identidade nem aquilo que o povo chamou a si como sendo as suas manifestações culturais. Por essa ordem de ideias, a do linchamento da Copa, enquanto houver um problema social por resolver, não pode haver Carnaval, não pode haver um concerto de música, não pode haver uma peça de teatro e, em boa verdade, também não deveria haver festas de anos nem churrascos em família.

Assustam-me os problemas, mas assusta-me mais, e dói-me, assistir a uma nação virar-se contra si mesma, mutilar-se da sua cultura e da sua identidade e linchar-se na rua. O que é efetivamente necessário é ser exigente para com o corpo político, cobrar-lhe a restituição da paz social, da qualidade de vida, dos serviços públicos de qualidade, e, simultaneamente, cobrar-lhes a garantia das manifestações culturais que são intrínsecas ao Povo. o que é preciso, é acabar com a corrupção, com a fome, com a pobreza. Isso é que é preciso. Não é linchar a Copa!

Tenho dito!
jpv