Mails para a minha Irmã

"Era uma vez um jovem vigoroso, com a alma espantada todos os dias com cada dia."


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A Variante Ómicron e o Preconceito Geográfico

Não. A variante Ómicron não “nasceu” na África do Sul e a decisão da União Europeia de fechar as portas de entrada aos viajantes oriundos da África do Sul e dos países vizinhos é ignorante, preconceituosa e discriminatória.

A variante Ómicron foi inicialmente detetada na Nova Zelândia, Inglaterra, Brasil, França, Índia e nas Filipinas. Como surge, então, o nome da África do Sul envolvido nisto? É simples. Devido a doenças como a malária, a tuberculose e a SIDA, a África do Sul teve de especializar-se em epidemiologia e tem dos laboratórios e das equipas de investigação mais avançados e sofisticados na área em todo o mundo. Por isso mesmo, foram especialistas sulafricanos que, em primeiro lugar, isolaram, sequenciaram e identificaram a variante. Depois, a ignorância jornaleira e política fizeram o resto. Confundiram tudo e despejaram em cima do continente subdesenvolvido o perigo de ser a zona de onde provém o Ómicron. Só que não é! Estes mesmos investigadores estiveram, de resto, na liderança de vários projetos que levaram à criação de vacinas.

Há mais. Como agora está na moda analisar números, eu apresento-vos alguns. Ontem, a Inglaterra registou mais de 50 mil casos, a França mais de 30 mil, a Itália mais de 13 mil, a Espanha mais de 9 mil, Portugal registou mais de 3 mil casos e… aqui em Moçambique houve 3 casos!!! Na Árica do Sul, um país maior que estes todos juntos, que toca ambas as costas do continente africano, a oriental e a ocidental, houve 2 828 casos! E são os africanos que não podem viajar para a Europa? Só se for para nos proteger!

Sejamos sérios. Há um lamentável preconceito geográfico com África. Aqui fazem-se os testes das vacinas que depois se distribuem na Europa, em primeiro lugar. Aqui está, por defeito, a ignorância, a inaptidão, a fome, a pestilência, a criminalidade e tudo o que é mau. Daqui partem os males do inferno que poluem o paraíso civilizado e assético que se vive na Europa.

E há aspetos que são gritantes: porque é que as viagens de e para a China não foram interditadas quando começou a pandemia?

Ainda me lembro, quando começou a pandemia, dos voos humanitários a evacuar portugueses e cidadãos de outras nacionalidades de África para as suas pátrias amadas com medo de morrerem aqui às mãos do vírus e da falta de condições do pobre e subdesenvolvido continente! Afinal, não andámos aqui a tropeçar em cadáveres. Com toda a tranquilidade, implementámos as medidas de prevenção e segurança e sobrevivemos, sem medo, nem preconceito geográfico, a um mal que é de todos e todos temos de enfrentar. Mas temos de estar unidos. Temos de assumir que isto é um problema de todos. Não é culpa de uns para outros serem vítimas.

Assim, importa dizer aos amigos e familiares que têm tentado entrar em contacto connosco que estamos bem. De facto, e Graças a Deus, estamos muito bem. Desconfio, até, que estejamos um pouco melhor do que se está na Europa. Desejamos a todos que superem mais esta onda de adversidade onde quer que estejam. Preconceitos à parte. Sobretudo, os geográficos.

jpv


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Livro da Coragem – 16 –

livro-da-coragem

– 16 –

Eu sou europeísta e quis sempre acreditar no projeto europeu. Quase como se, depois de séculos virado para os monstros do mar, Portugal se virasse para as pessoas em terra. Além disso, a ideia de uma Europa unida, livre, forte, sempre me pareceu fazer sentido ainda que houvesse preços a pagar, o que, nestes casos, é normal.

Percebe-se, pois, que, no âmbito do referendo britânico, o meu coração batesse pelo remain, pela permanência, e tivesse recebido com tristeza e desilusão a vitória do BREXIT.

Ontem, contudo, vacilei. Com tamanha crise a braços, com problemas tão profundos para resolver como sejam a situação dos refugiados e a crise económica de todos os estados-membro da União Europeia, só para relembrar dois, o que o senhor Schauble escolhe, para se divertir, é fazer um bluf com um suposto pedido de resgate financeiro que Portugal teria apresentado por não ter cumprido em 0,2 as metas que se propôs. Logo a seguir às suas palavras, os juros da dívida pública portuguesa cresceram em todas as frentes.

Acresce que o incumprimento da Alemanha, da França e da Espanha, por exemplo, é muito maior do que as duas décimas de Portugal.

Schauble não consegue resolver os problemas sérios da Europa, mas exerce uma chantagem infantil, patética e desnecessária com Portugal. Não se atreve a enfrentar os grandes, mas dá porrada com força nos pequenos. Não foi com esta gente que aprendi a ser europeísta.

Este tipo não sofre sanções? Não paga o prejuízo causado? Ninguém o repreende? Não pede desculpa? Não se demite?

Ontem, tive ganas de um PTEXIT e se houvesse um referendo, àquela hora tinha votado leave!

João Paulo Videira


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Crónicas de Maledicência – Os Gregos são uns Chatos

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Crónicas de Maledicência – Os Gregos são uns Chatos

Os gregos, em geral, são uns chatos. E os do Syriza são da pior espécie. A mulherada não fala noutra coisa que não seja em Tsipras, o Adónis da política, ou Varoufakis, o Apolo da finança. Depois de Demis Russos, Nana Mouskouri, e mesmo mais do que eles, os novos e emergentes políticos gregos tomaram conta do nosso quotidiano. E, quer se concorde comvaroufakis eles, ou não, o facto é que não se lhes pode ficar indiferente. E não me venham cá apelidar de sexista porque a mulherada, pelo menos a que me rodeia, fala mesmo deles.

Os gregos do Syriza são da pior espécie. Para já, atrevem-se a ser giros no meio de uma cambada de tipos de aspeto gasto, envelhecido e francamente feio. É fácil identificar um ministro europeu. É sempre o tipo mais feio da sala. Se for alemão, pode mesmo nem se ter nas pernas e andar de cadeira de rodas. E andam todos com o pescoço sufocado e o corpo pendurado de gravatas anódinas, de custo superior ao valor real, realmente pagas pelos nossos impostos.

Já o Tsipras e os amigos têm um ar saudável e desafogado, colarinho despreocupado e um aspeto moderno e informal quase como se os políticos fossem gente como nós e não essa imortal e excelsa casta de eleitos que nos tem governado e guiado pelas trevas da nossa ignorância.

E esses gregos syrízicos andam de mota, deslocam-se em viatura própria, voam em classe económica, têm blogues, conta no Twiter e, imagine-se o inusitado da questão, falam com as pessoas.

Estava a Europa descansadinha e aprumadinha, convenientemente imersa numa crise e numa recessão económicas que duram há quase uma década, têm responsáveis identificados, os ranhosos dos povos do Sul que, com a sua indigência e preguiça e incapacidade intelectual, têm ficado a dever muito do dinheiro que não gastaram às mui nobres gentes do Norte, quando surgem estes rufias, assim lhes chamou o “Die Welt”, e dizem ser necessária uma nova ordem, que pagar submarinos e armamento que não precisavam e que não pediram para guerras que não existiam, não lhes parece muito correto e, como tal, talvez seja melhor pagar ao ritmo do crescimento económico para o garantir e, já agora, se não se importam, convém que sejam pagas dívidas antigas de maus pagadores com boa fama que, em larga parcela, cobrem o que agora se diz que se deve.

Parecia a Grécia tão vulnerável, tão sem soluções, enredada numa teia financeira gerida por tipos antigos, rígidos, sulcados pelas rugas e armadilhados de colarinho branco, e surgem estes giraços, estes modernaços, e ousam desafiar as regras do jogo, ousam ter as suas próprias ideias para o seu próprio país e ajudam as pessoas mais prejudicadas pela crise, aumentam o ordenado mínimo, readmitem funcionários públicos, pagam a luz das pessoas e pensam nelas. Políticos sem gravata a pensar nas pessoas. Os gregos são uns chatos e os do Syriza são da pior espécie.

Agora, que tudo ia tão bem na Europa…

Tenho dito.
jpv


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Crónicas de Maledicência – E Agora, Europa?

greciaCrónicas de Maledicência – E Agora, Europa?

Lá, onde se inventou a democracia, lá, onde ela parecia estar moribunda e desnorteada, lá, esse povo parece querer tomar conta desse poder e reinventar, com novas linhas, essa mesma democracia. E agora, Europa?

O mundo estava já acomodado à alternância no poder de duas grandes forças. Os nomes variavam, a dança repetia-se. Os gregos rasgaram o livro de instruções e, parece, estão a trilhar novos caminhos. Imprevisíveis. Inusitados. E agora, Europa?

Esse mesmo mundo que se espantou, e ainda anda à procura de saber como se pronuncia “SYRIZA” E Tsipras, discute agora se haverá Euro ou não, se haverá Europa ou não, se haverá Troika ou não, se haverá austeridade ou não, se haverá radicalismo ou não. E agora, Europa?

Os gregos não parecem muito preocupados com todas estas questões. Na verdade, parecem mais preocupados com a sua soberania, com a sua dignidade e com aquilo que eles próprios querem para eles próprios. E isto, este simples exercício de autonomia e autodeterminação, parece estar a incomodar muita gente por esse mundo fora, a mobilizar muita gente por esse mundo fora. E é isto que merece a nossa reflexão. Se tudo isto está tão errado, tão fora das regras, porque aderem as pessoas com tanta esperança à ideia de mudança que as eleições gregas trouxeram consigo?

É verdade que há regras internacionais de funcionamento, é verdade que as regras e os acordos são para respeitar, mas é verdade, também, que foi com essas regras que os bancos e os banqueiros faliram as nações e os povos tiveram de sacrificar-se para pagar esses despautérios ao mesmo tempo que se convenciam as pessoas que a culpa era delas e de viverem acima das suas possibilidades. Dentro desta equação, o que se passou ontem e hoje na Grécia tanto pode ser visto como um desrespeito às regras de funcionamento da Europa, como a salvação e o resgate dessa mesma Europa.

Importará perceber qual a dimensão da determinação do novo Governo grego, qual a profundidade do seu ímpeto reformista e, sobretudo, que ideias tem para alicerçar uma nova ordem. Sendo que, para nós, algo se afigura como óbvio: é mesmo necessária uma nova ordem. Terá custos, naturalmente. Mas ainda não estamos nesse plano. É que os sistemas estatuídos têm tendência a segurar-se e a agarrar-se à sua própria existência. Ainda não aconteceu nada. Isto, ainda é só o começo. Importa ver como o resto da Europa vai reagir à nação que a (re)inventou.

E agora, Europa?

Tenho dito.
jpv


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Crónicas de Maledicência – Pouca Europa, Muitas Europas

European Election 2014Crónicas de Maledicência – Pouca Europa, Muitas Europas

Não sou politólogo, nem especialista em eleições. Não apareço na TV a comentar. A autoridade que me assiste é, somente, a de pensar.

A Europa, tal como a conhecemos nos últimos anos, a Europa do Euro, a Europa da União, virou autofágica e destruiu-se.  Essa Europa de faz de conta morreu.

É simples apurar isso. Houve eleições europeias em Portugal. Não se discutiu a Europa. Discutiram-se os problemazinhos de Portugal, que são sérios e merecem atenção, precisam dela, mas que, se fossem enquadrados num raciocínio mais abrangente de pensar o Velho Continente, talvez tivessem solução. Assim, não têm. Os políticos portugueses entretiveram-se, a pretexto destas eleições, com uma disputa interna a ver quem internamente ganhava. E o Destino foi traiçoeiro. Para todos. Nem o PSD perdeu tão pouco quanto queria, nem o PS ganhou tanto quanto pretendia, nem todos os outros deixaram de ser cruelmente esquecidos. O PSD correu junto com o CDS e os dois juntos contra um só partido não evitaram uma derrota com margem de 4%. Grave. Foram ao tapete. Contudo, o PS anteciparia, lá está, por via das questões internas, uma vitória mais robusta. Não a teve. Todos os outros só contam para quem votou neles. A maioria dos portugueses nem se lembra já da siglas.

Mas há mais. Todos, mas todos mesmo, sem exceção, saíram derrotados sob o peso de uma elevadíssima abstenção. Sessenta e seis por cento dos eleitores portugueses não votaram. Isto comporta duas mensagens inequívocas. A primeira é que o conceito de uma Europa unida diz pouco aos portugueses que, em jeito popular, vão dizendo que aquilo é mais uma maneira deles se amanharem. A segunda, mais séria e funda, é que o sistema eleitoral e o conceito de uma União Europeia estão postos em causa. Quando, num dos Estados-Membro, quase sete em cada dez eleitores não se dá ao trabalho de ir fazer a cruzinha, a verdade é que a eleição, em si, não diz muito ao eleitor. Ninguém assumirá esta derrota. Isso seria pôr em causa aspetos que se não podem pôr em causa. Porquê? Porque interessa, a quem usufrui financeiramente desta Europa, que ela exista.

Mas há mais. Olhemos, de relance, os resultados em perspetiva europeia. Há pouca união, pouca coesão e, nesse sentido, há pouca Europa, muito pouca. Há uma difusão de orientações que vão, nos diversos países da UE, desde vitórias da Extrema Esquerda, a vitórias na Extrema Direita, com os sensaborões do centralão pelo meio. Ou seja, há demasiadas Europas para que a União Europeia aguente. Não sei, mesmo, se com uma tal composição, será possível governar a UE. Nunca percebi porque é que em cada Estado Membro votamos nos nossos partidos e não nos partidos europeus. Isso transviou a discussão em torno destas eleições para as questões internas de cada país e impediu uma discussão lata acerca dos destinos e do pensar a Europa no seu todo. Acredito, mesmo, que haja pouco portugueses capazes de nomear, nem que seja pela sigla, um único partido europeu. Os portugueses, na generalidade, não os conhecem, não sabem quais são e, pior do que isso, não sabem quem são as pessoas por trás deles. Creio firmemente que seja diminuto o número de eleitores portugueses que saibam, quando votam no PSD, no PS, no PCP, no BE, para as europeias, em que partido estão a votar para o Parlamento Europeu. Esse gigantesco parlamento de quase setecentos elementos que, isso sim, nós pagamos com os nossos impostos. De resto, todo o processo está viciado. Dos poucos eleitores que vão votar, daí a representatividade estar posta, seriamente, em causa, a maioria fá-lo por disciplina de voto. Fá-lo por seguidismo e tradição e di-lo. Ninguém olha para os programas eleitorais, os compara e vota neles. Quem é do PSD abomina por princípio tudo o que venha de outros partidos, em particular do PS. Quem é do PS abomina por princípio tudo o que venha de outro partidos, em particular do PSD. E assim sucessivamente. Ninguém do PCP ou do BE olha para um programa do PSD ou do PS à procura das suas eventuais virtudes. Nada disso. O que importa é encontrar as falhas naquilo que à partida se classifica como mau só porque vem de onde vem. E o inverso é igualmente verdade. Em Portugal, neste tipo de pensamento e processo, não há inocentes.

Ontem, não ganhou ninguém e perdeu toda a gente. E, sobretudo, perdeu a Europa, embora tenham ganhado as Europas.

Tenho dito!
jpv