Mails para a minha Irmã

"Era uma vez um jovem vigoroso, com a alma espantada todos os dias com cada dia."


2 comentários

Mandela Depois de Mandela

Mandela Depois de Mandela

Não quero dar para o peditório da expiação do pecado do antigo Primeiro-Ministro, Dr. Aníbal Cavaco Silva, ter votado contra ou a favor ou nim da libertação incondicional de Nelson Mandela. Não me parece que Madiba deva ser misturado com esse tipo de questiúncula e muito menos nesta altura.

As coisas são simples. Antes de Mandela não havia liberdade. Depois de Mandela há. E isso não se troca por nada, nem se confunde com nada, nem se desculpa com nada. Eu vivo perto da RSA e visito o país com alguma regularidade. Se está perfeito? Não. Os próprios sul-africanos sabem, admitem e afirmam isso, mas a verdade é que também ninguém quer dar um passo atrás e a razão é simples. A conquista de Mandela não é só a conquista de um povo ou de uma nação, é a busca constante da Humanidade.

O que sempre reparei nele é que, através dos tempos, foi um homem capaz de sorrir! Mesmo nas circunstâncias mais difíceis. É um traço de caráter que denota grande personalidade e grande sensibilidade. Foi capaz de sofrer, de persistir, soube, como temos visto poucos saberem, ganhar. Teve dignidade e ponderação na hora da vitória. Preferiu ser unificador a fraturante e isso é um traço de quem conquista a liberdade com sofrimento.

Mandela não é sul-africano. É um homem do mundo, para o mundo. Um ícone universal, um símbolo da defesa dos direitos humanos e um símbolo do mais precioso dos bens da Humanidade: a Liberdade!

O resto, o que fica da sua passagem é algo que ainda não vi ninguém referir mas penso que temos de o fazer: é fundamental que a sua herança permaneça, é fundamental preservar o bem da tolerância, da igualdade e da liberdade. É importante que haja Mandela depois de Mandela.

So long Madiba!jpv


1 Comentário

Citação da Felicidade

“Somos felizes mal nascemos neste canto do mundo.”
MV


8 comentários

Crónicas de África – Mundo Pequeno


Mundo Pequeno

Maputo, 19 de novembro de 2012

Este blogue é absoluta e completamente independente e o seu proprietário e gestor não deve nada a ninguém, exceto à Caixa Geral de Depósitos, logo, por aqui se fala do que quero e me apetece desde que me dê na gana, que não é real, e faço a publicidade e promovo quem muito bem entendo. Ou seja, nesta crónica vou referir marcas e/ou produtos e assumo a responsabilidade.

Um dos ex-libris de Maputo é o Café-Bar-Pastelaria Continental. Fica ali próximo do Bazar (Mercado Central) e do Mercado do Pau e é um espaço amplo de mesas generosas e uma colunata altíssima e imponente com uns feitios em “L” escrito à mão a encimá-las. Tudo aquilo transpira bem estar e paira no ar um odor adocicado a pastelaria acabadinha de confecionar. Acresce, ainda, uma esplanada em cima de um estrado em madeira de dimensões consideráveis. A pastelaria é muito boa e o café de excelente qualidade. Quem for um bocadinho cusco não dispensa um pequeno almoço de sábado ou domingo naquela esplanada porque faz esquina e dá para ver quem vai, quem vem e quem fica.

No domingo, fomos lá tomar o pequeno almoço. Arrofada mista com um toquezinho de manteiga, café e chá. E estávamos muito descansadinhos a cuscar o passar das gentes, escondidos no nosso anonimato de recém-chegados, quando passa por nós um homem alto e bem constituído que para a olhar para mim, dá dois passos na minha direção e diz:

– Olá! Então o que é que faz por aqui?

E quando me levantei por educação e lhe estendi a mão, reconheci-o, mas não o identifiquei:
– Eu estou a conhecê-lo, mas tem de me dar uma ajuda.
– Então, da Pizaria Catita!
– Mas isso é no Entroncamento!
– Era! Tive de a fechar!

E relembrei uma mãe trabalhadora que em tempos se sacrificou educando dois filhos, uma rapariga e um rapaz, e o rapaz cresceu no negócio e fez-se nele e a simpatia com que nos tratámos nesses dias distantes da
Pizaria Catita guardou emoções nos corações e essas emoções vieram reencontrar-se em Maputo onde me julgava anónimo, mas, ao que parece, não sou assim tanto.

É pequeno, o Mundo. Sobretudo quando os corações dos homens são grandes. O rapaz, hoje um homem, já brevemente descrito, reconheceu-me. Conversámos um bocadinho, trocámos números de telefone e, claro está, estabelecemos um elo.

Depois, quando saímos dali, demos uma volta pela marginal de que vos mostro algumas fotos, e eu fui pensando, Quantas pessoas mais estarão em Maputo que eu conheço de outras paragens? É pequeno, o Mundo.
jpv

Avenida Marginal, sentido Costa do Sol, 6:30 a.m.

Avenida Marginal, sentido Costa do Sol, 6:30 a.m.

Avenida Marginal, sentido Maputo Centro, 11:30 a.m.

Avenida Marginal, sentido Maputo Centro, 11:30 a.m.


5 comentários

Mudança

Mudança

Muda a palavra.
Muda o ritmo.
Muda a cor da terra,
Muda o ar do céu.
Muda da posse o sentido
Do que me pertenceu.
Muda o movimento
Das gentes em profusão.
Muda a ordem.
Muda a confusão.
Muda a faixa de rodagem.
Mudam as roupas,
Muda a engrenagem.
Muda a religião.
Muda o tempo
Com que se muda tudo.
Muda o tom da pele
Mas não muda o seu veludo.
Muda um corpo dançando
E outro na rua tombado.
Muda-se tão facilmente que,
Em se olhando,
Se encontra um homem mudado.
Muda o poiso do sol,
Muda das aves a cor,
Muda o suor no lençol,
Sem que se mude, dos homens, a dor.
Mudam as frutas,
Mudam os odores.
Muda-se até um oceano,
E muda-se dos ventos a dança.
Tinhas razão, ó poeta,
Este mundo é composto de mudança!

jpv


2 comentários

Citação do Caos

“O mundo anda cego, as pessoas são más, somos meros objectos nas mãos de uma minoria que levará isto ao caos.”
VS


Deixe um comentário

Um homem no mundo

[Presidente Jorge Sampaio (Portugal) aceita a demissão do primeiro-ministro Pedro Santana Lopes. Presidente Jorge Sampaio (Portugal) convoca eleições para 20/02/2005. Terremoto de 5,4 graus na escala Richter atinge o cabo de São Vicente. Eleições presidenciais e parlamentares em Moçambique.

[Data da primeira publicação: 3 de Dezembro de 2004]

Um homem no mundo

Querida mana,

Há homens que vivem a vida que os escolheu.
Há homens que nunca chegam a saber que estiveram vivos.
Há homens que passam ao lado da vida empunhando bandeiras de nada e ideais que nunca o foram de tão vazios.
Há homens que vivem perdidos porque já nasceram perdidos na imensidão humana de um universo que os assusta e os apouca como se a mesquinhez do universo fosse grande.
Há homens que tentam ávidos ou desesperados a dignidade e procuram-na, diligentes, por todo o lado menos por onde se pode encontrar a dignidade.
Há homens que se enganam a vida julgando enganá-la.

E há o nosso avô. Esse colosso de existir que sepultámos há poucos dias. Essa perda para o mundo mais do que para ele.

O nosso avô Velez caracteriza-se facilmente. Um corpo imenso como convém para abrigar uma alma também ela imensa. Um corpo de enfrentar as agruras, de segurar as investidas que os cornos da vida fizeram numa geração que sofreu tudo o que havia para sofrer. Um homem de encher uma sala de risos ou lágrimas que ele próprio derramava numa antítese figura-corpo para quem o não conhecesse mas, digam o que disserem, a fazer todo o sentido para quem cresceu à sua beira. Um homem cuja primeira palavra era honra e a última também. Um carinho a brotar de um corpo imenso no elogio dos netos, das filhas, do mundo que o rodeava. Um dinamismo de querer viver a vida toda de uma vez na avidez de segurar cada momento. Uma presença inigualável. Uma saudade que magoa mas adocica a memória de lembrar o que vivemos com ele.

O avô Velez tinha duas características e lembro-me do o ver viver sempre de peito erguido para a vida empunhando-as como a lemas, como espadas de defender-se, como a lemes de conduzir-se, de conduzir quem o acompanhava. Uma era a força das suas virtudes. Irrompia com ela pela vida de quem se cruzasse. Desempanava automóveis na beira da estrada, dava boleias a quem já se cansara de esperar, distribuía o que tinha como se tivesse muito e, por vezes, pouco era. Distribuía alegria como quem dá tudo o que tem: o dom de viver a vida sempre pelo lado do sol… uma só palavra, uma só honestidade, uma só cara, uma só seriedade e, com elas, a força de encarar o mundo e o que ele trouxesse. A outra característica era a coragem dos seus defeitos. Assumia-os como quem dá a cara a ver se dói. Assumia-os como que para garantir a sua humanidade e nunca se escondeu deles, nem os ocultou de quem tinha o privilégio da sua companhia. E era neste tactear de defeitos e virtudes que nos mostrava como vive um homem no mundo.

O que mais aprecio no homem que agora nos deixa saudade é um aspecto que me parece um tanto esquecido por quem quer ser homem nos nossos dias: a integridade e a verticalidade. Um homem que nunca fugiu do seu mundo mas o encarou, o trabalhou, o amou e por fim, o deixou com a serenidade de que só os heróis são capazes quando enfrentam a negra e derradeira inimiga.

Paz à sua alma.

Beijo,
Mano