Mails para a minha Irmã

"Era uma vez um jovem vigoroso, com a alma espantada todos os dias com cada dia."


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Fadas e Gnomos

Cinquenta e sete anos

E precisamente aqui onde estou sentado, que quero estar. E é precisamente com estas pessoas que me quero dar. Ao contrário do que possam pensar, não é um raciocínio exclusivo de tirar uns para fora e meter outros para dentro. A vida, no último ano, forçou-me a uma série de opções, que atos de acolhimento quero, e, vi o que então já vira, mas na carne dói muito mais. Uns a sair por ordem das circunstâncias, outros a não se aproximar, para não empatar, e outros sumiram da minha vida tão depressa quanto entraram. Outros, até, inventaram chatices no trabalho para dizerem o que já se sabia que iam dizer.

Quando se sofre de um AVC, há coisas que partem para não voltar, há coisas que partem para voltar, poucas, estas, e há uma miríade de coisas que partem para regressar diferentes. De tal forma que as pessoas dizem, enganadas, que nunca mais foram os mesmos. Foram. Os mesmos, nunca deixamos de o ser, passe por nós o que passar, continuamos a ser nós. As coisas é que mudam. E muda sobre elas a perspetiva que tínhamos.

Quando tive o AVC não dizia uma palavra. Não era dizer pouca. Não dizia uma. O atendimento foi o que tinha de ser. Era Cabo-Verde, país bem diferente do nosso. Conheci por lá umas boas almas. Mas decidi vir-me embora.

Decidi apaixonar-me por Leiria. Sobre isso vos falarei mais adiante.

Hoje quero aqui destacar quem me salvou a vida. Foi a Cláudia Videira. Sabes, eu sei o que tu fizeste. Decoraste as passwords todas, aprendeste a levantar dinheiro, conduziste o carro a quem se tenha de abrir uma porta para de fechar um janela, tratastes das coisas do seguro de viagem, dos médicos, dos terapeutas, caiu-te o mundo em cima, e, mesmo assim, mentias-me como se não houvesse amanhã: sim, estava com bom aspeto, daqui a nada estás lá na escola, e contavas-me sobre o que tinham ditos sobre mim, e eu, olhava para ti, como quem olha para um pássaro belíssimo, e perguntava-me tantas vezes, o que é que ela ainda aqui está a fazer? E a resposta chegava sob a forma de um beijo, um de carinho… E faço cinquenta e sete. E sou um exemplo de uma recuperação fantástica… mas não há recuperações fantásticas sem que as fadas e os gnomos espalhem as sua magia. E eu vi fadas e gnomos em volta de mim.

Não sei se farei cinquenta e oito. Nem quero saber. Só sei que quero viver a vida um dia de cada vez, uma aventura de cada vez, um beijo de cada vez…

jpv