Refém de teus abraços, Prisioneiro voluntário Em teus braços, Homem só e desolado No mar de sargaços Que era a vida sem ti. Corri. Fugi de mim Como de uma pestilência, E só na minha própria ausência Me reencontrei E defini a pureza Da essência De um eu vago E imprecisamente desenhado Como num sonho Interrompido e inacabado. E, contudo, sonhei. Há homens Que não dormem Para não sonhar Com medo dos sonhos. Há homens Que não ousam o amor. Tal o pânico E o pavor De o viver. Chão inóspito, De fertilidade suspeita, O amor oferece e dá, Mas também aceita. Carícia estendida Ao cão tinhoso Que corre e foge Porque não sabe Que existe outra coisa Para lá da pedra arremessada. A ausência Da violenta contundência Do calhau É desconhecido, vazio e nada.
Era uma vez um queixinhas Que andava pela orla do rio A pescar. Veio um crocodilo e engoliu-o. Nunca mais ninguém o viu, Nas margens do rio. O salmão ficou triste E sozinho E correu-lhe um arrepio Pelas espinhas Com saudades do queixinhas. Temia o salmão que, Sem o queixume, Se tresmalhasse o cardume. Mas pouco tempo receou. Logo, logo, por ali passou Uma savelha muito velha Que se aproximou do salmão Para lhe dar notícias, Em primeira mão, Que nadavam De orelha em orelha. E foi assim que, Engolido o queixinhas, Começou o reinado da savelha. Bem me dizia meu pai, Com ar de enfado e arrufo, Que Portugal jamais iria à falência Por falta de um bufo!
É Cabo, mas não tem cabo. É Verde, mas não tem sempre verde. É país, mas tem países. É Língua, mas tem Línguas. É luz intensa E chão escuro. Meneio da anca. Ritmo no corpo Que sofre o trabalho duro. É paisagem que surpreende. Floresta densa, Solo de lua, Marte ardente, E postal de praia que vende. É um vulcão esquecido E outro que não se pode esquecer. É sabor de peixe E catxupa no dia seguinte. É terra de pessoas ki bai É terra de pessoas ki bem. É um sorriso E uma cara cerrada. É um deambular Junto ao mar Numa Praia ornada De diferenças. É gente de pose orgulhosa E rápidas sentenças. É uma alegria contagiante E uma antiga dor. É o sal queimando Na pele do pescador. É uma morna dolente Que paira no ar, Um corpo ardente Colado ao outro Quase a dançar. É saudade em cada frase. É História forte e presente. São amores perdidos E gente ausente. E é uma força e uma glória, Um grito nacional no peito, Pronto a sair. É uma irmandade Na Língua E no sentir. Cabo Verde, Terra de chegar e partir.
Já não meço o tempo. Já não conto os dias, Nem as semanas, Nem os meses, Nem os anos… Já não conto as pessoas que passam, Nem peso as palavras nas frases. Já não me detenho pelo comum, Nem faço vénias à ignorância, Embora também já não a corrija… Já não quero tudo, Nem muito, Nem pouco. Quero só o que quero. Seleciono. Separo. Deixo passar, livres, Os rios de lama, E sorrio À sua desventura. Como cheguei aqui Importa pouco. Sou um estilhaço de nada. Trouxe algumas pessoas, Um punhado de memórias. Árvores de errância plantadas E livros escritos ao sabor do acaso. Não sou escritor. Desenho coisas com palavras Escolhidas sem critério. Não sou professor. Ensino a vida A vidas que me hão de sobreviver. Não sou pai. Sou filho de meu pai E de meu filho também. Não sou marido. Sou imensamente amado Por um raio de luz Que me colheu de surpresa. Não sou nada… Talvez nunca tenha sido. Talvez nunca tenha querido ser. Amo a brisa E os beijos escaldantes da musa Com quem partilho a cama E o olhar. Amo o filho, a filha, os netos… Fontes de todos os afetos… Amo estar. Amo observar. Amo as palavras E o sentido que dão Às coisas sem sentido. Amo. Já não desejo que acreditem Em mim. Nem, tão pouco, que gostem de mim. Fico-me pela breve partilha De um tinto, De uma conversa casual e vadia, De uma roda de amigos À volta de um lume crepitante. Recolho-me no canto de um sofá E na penumbra de uma árvore De pensamentos que rego Em silêncio. E depois, No fim de todas estas Indispensabilidades, Sobra muito pouco desta vida E desta idade. E o que fica É uma qualquer ideia Indefinida e essencial.
O Amor Próprio nasceu como uma página nas redes sociais e se transformou em um espaço acolhedor para quem busca reencontrar sua força, sua essência e seu valor.
O assunto básico é Arte/Fotografia e Psicologia. Eventualmente há indicações de livros e equipamentos interessantes lincados na Amazon, Shopee e SocialSoul.