Mails para a minha Irmã

"Era uma vez um jovem vigoroso, com a alma espantada todos os dias com cada dia."


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Decisões

Tudo na vida é sobre decisões. Decidir. As decisões, boas ou más, trazem realização e aprendizagem.

As boas decisões trazem sentimento de conquista, realização, satisfação e fortalecem a autoestima. O seu efeito é benéfico e pouco duradouro. É preciso decidir bem muitas vezes. As más decisões trazem dor, algum remorso, aprendizagem e evolução. São as melhores. O seu efeito tem um poder brutalmente didático e é muito duradouro. É fundamental decidir mal e não é preciso decidir mal muitas vezes. Não há experiência sem más decisões.  Uma má decisão constitui uma aprendizagem para a vida. As decisões catastróficas erguem sábios sobre a Terra.

O medo de decidir, a indecisão, seja por que razão for, é uma doença universal, corrói-nos a Humanidade e a clarividência.

Naturalmente, temos de preparar-nos para decidir, temos de decidir com responsabilidade, com fundamento, mas,  acreditem no que vos digo, vale mais uma má decisão do que uma não decisão.

O meu pai, uma vez, disse-me que, entre não tomar uma decisão e decidir, mesmo correndo o risco de decidir mal, eu deveria decidir sempre porque, se errasse, poderia sempre corrigir, se não decidisse, nunca saberia como seria a vida se tivesse decidido. Palavras sábias de um homem sábio.

Hoje, cruzei-me com esta imagem tola, uma graçola típica das redes sociais, e tudo isto se me acordou na mente. Pobre Musa. Enjeitada Ideia. Imperfeito arrazoado.

Bom fim-de-semana.

jpv


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Evangelho


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Sucumbir à Estupidez!

Estamos a sucumbir à estupidez.

Num espaço de tempo muito curto, três notícias me chamaram à atenção, todas, na sua essência, com o mesmo teor: atos de estupidez ditatorial sem qualquer propósito, sem qualquer sentido ou fundamento.

E, sejamos honestos, isto não é de agora. A estupidez, claro, mas também, e sobretudo, esta forma de estupidez que é calar as pessoas, impedi-las de expressar a sua individualidade, a sua opinião. Basicamente, está a ser-nos roubado aquilo por que mais lutámos nos últimos séculos: a liberdade de expressão. A liberdade individual.

Ao contrário do que possa parecer, não são atos isolados. Fazem parte de uma ideologia concertada entre diversos setores e grupos de interesse da nossa sociedade. Uma ideologia tão forte e tão fortemente imposta que está a converter-se numa cultura. É um bando de ignorantes e pré-ofendidos que não sabem distinguir nada de coisa nenhuma, que não percebem o que é uma obra de arte ou um contexto de enunciação num livro.

Esta nova forma de estar, sob o falso pretexto de defender a igualdade, de defender direitos, de defender formas de estar de minorias, está a tornar-se numa maioria opressora, ditatorial, a obrigar-nos a pensar como eles querem, está a obrigar os nossos filhos e os nossos alunos a pensar como eles querem, sob pena de acusações de discriminação, racismo, machismo, totalitarismo, usurpação cultural. Sob pena de causarem a morte social de quem discorde desta corja de semianónimos que, normalmente, só se mostra em grupo ou em tribunal.

Temos de combater a discriminação, seja ela de que tipo for, temos de combater o racismo, seja ele contra que etnia for, temos de combater o machismo e todos os ismos perniciosos, temos de combater todas as formas de desigualdade, de faltas de equidade. Isso não se discute. É encarar os problemas, assumi-los e enfrentá-los.

Contudo, isso não pode fazer-se destruindo a nossa própria cultura, herança de milénios de pensamento intelectual e criação artística. Isso não pode fazer-se criando mais formas de discriminação e desigualdade ou acentuando as que já existem. A defesa dos valores que enunciei não pode fazer-se como se se tratasse de uma vingança, caso contrário, não aprendemos nada.

Nunca pensei, nos meus dias de vida, dizer esta frase de forma denotativa, mas a verdade é que estamos a viver, literalmente, as primeiras páginas do “Fahrenheit 451” de Ray Bradbury.

Recentemente, no Reino Unido, houve bibliotecas que esconderam livros de Enid Blyton por causa de “linguagem ofensiva”.  Não sei quanto a vós, mas eu li aquilo tudo, bem jovem, e não me senti ofendido e se sentisse parava de ler e não lia mais.

Ainda mais recentemente a própria editora das publicações inglesas dos livros de Agatha Christie alterou o conteúdo de diversos livros da autora para, supostamente, excluir descrições físicas, referências étnicas e insultos. Podemos inferir, portanto, que não há mais físicos, que não há etnias, que não há ofensas. Uma escritora exímia que escreveu livros que marcaram gerações, que entusiasmaram milhões de pessoas, traduzida em dezenas de línguas é agora censurada por esta corja de imbecis e ignorantes que se arroga o direito de estuprar a Humanidade naquilo que tem de mais precioso: a sua produção artística. E não pensem que é caso único. Já fizeram o mesmo ao Roald Dahl e ao Ian Fleming.

Meus amigos, anda à solta um censor legalizado a castrar a nossa cultura e nós estamos a deixar. Isto é crime! É organizado e visa calar-nos, domar-nos, forçar-nos a um pensamento único e pré-determinado. Espero que os portugueses e Portugal estejam à altura. Depois de corrermos com o Salazar (mais ou menos), temos de nos ver livres destes. Mas estes são muito piores porque agem legalmente e para nosso bem(!!!). Sejamos honestos e claros: qualquer pessoa que pense, que produza uma ideia e tenha uma opinião e a expresse, corre o risco de ser ofensiva. A interação social é isso mesmo. Chegarmos a pontos de acordo e desacordo, percebermos até onde podemos ir, até onde pode ir a nossa liberdade e a dos outros também. Esconder livros, corrigir livros e despedir professores que ensinam aquilo que deve ser ensinado é uma liberdade que oprime a minha porque destrói a minha herança cultural. Por isso, não me calo.

Mas o fenómeno entra na Escola. Naturalmente, até porque a Educação é a mais poderosa arma e um chão fértil de manipulação. Ainda mais recentemente uma professora, diretora de uma escola, nos Estados Unidos, foi obrigada a demitir-se por ter mostrado uma imagem da estátua de David e da “Criação de Adão”, ambos de Michelangelo Buonarroti aos alunos. Os pais forçaram a situação apelidando a estátua de pornografia (!!!). Exigindo serem avisados sempre que um docente mostra um nu frontal. Não é um nu frontal, senhores, é uma das mais maravilhosas criações da Humanidade. São criações dos homens que vos trouxeram até aqui, até hoje. São os pilares das vossas miseráveis existências. Já nem vou falar na urgência de confiar nos docentes. Mas falo, claro está, do silenciamento que isto constitui.

Não sei se já encontraram vida em Marte. Avisem-me assim que encontrarem que eu endivido-me e compro já uma flat tipo 2, mesmo em ambiente agressivo e inóspito. Duvido que seja mais mal frequentado do que este pardieiro a que chamamos Terra.


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Elegia à Esperança

Esta manhã,
Quando o dia nasceu,
Já o Sol ia alto,
Rebrilhavam os verdes
Da vegetação,
E o céu limpo e tranquilo
Fecundava a mais pura emoção.
As aves dançavam ao som
De seu próprio canto,
E fez-se em mim uma esperança
E um frémito de espanto.
Afinal, havia horizonte.
Ao fundo do adulto
Ainda se vislumbra a criança.

Esperei que parassem as bombas no ar,
Se amassem os homens para lá da cor
E todos os meninos parassem de chorar,
Todo o ódio se vertesse em amor.
Esperei que as bocas esfomeadas se pudessem saciar.
Vi, na luz do meu olhar, o milagre do entendimento.
Vi a Paz concreta e definitiva,
Um só Deus, a mesma religião,
Era, então, a palavra mais imperativa,
A do abraço, da tolerância e da união.
Desenhava-se em minha mente maltratada e desfeita
A visão límpida e perfeita
Deste Mundo como o queremos.

O som longínquo do acordar
Veio saudar-me o novo dia.
Percebi, então,
A imagem do sonho
Lá fora, não acontecia.
Singular e breve momento,
Súbita realidade, rápida mudança,
É tudo meia verdade
Só, morre a esperança.

jpv


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DE RERUM NATURA

EU NÃO SEI

“Eu não sei
Tanto sobre tanta coisa”

David Fonseca
Silence 4

Foi um princípio do pensamento socrático e é hoje uma urgência universal.
Estamos infetados de opinadores, fazedores de supostas opiniões e salvadores da Humanidade.
Uma corja de ignorantes que nunca leram um livro e cuja cultura é suportada por imagens com chavões e lugares-comum em cima, por vídeos instantâneos, por rolos infindáveis de comentários a coisa nenhuma que valem coisa nenhuma, por frases mal citadas, mal atribuídas, retiradas do precioso contexto da obra a que pertencem e apropriadas, não raro, em nome das razões opostas por que foram escritas. Tudo emanado dessa lixeira da Humanidade a que chamamos Internet.

A seu tempo, manifestei-me contra o perigoso crescimento da ignorância. Avisei…
A ignorância venceu.
E aqueles que se atrevem a pensar por si, a estudar e a dizer duas palavras com fundamento e sustento intelectual são banidos por arrogância, discriminação, postura ofensiva.

O conhecimento sério, a sério, está hoje banido. É um crime e leva à morte social.
Quem se atreva a pensar autonomamente, a estudar duas linhas e a proferir uma frase pesada e estruturada, é bom que se esconda.

Hoje não sabemos nada. Na verdade, nunca soubemos ou soubemos sempre muito pouco, mas, se soubermos, o melhor é estar calados e usufruir do prazer de sabermos que sabemos no conforto da penumbra da nossa intimidade. Sem testemunhas. Com um café forte na mão.

Tenho dito!

jpv


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Dia Mundial…

É dia mundial da Mulher
E celebra-se a sua graça,
Grita-se a urgência da igualdade,
E nos outros dias renasce a impunidade.
E celebra-se o dia mundial da Poesia,
Com palavras doces e alinhadas,
E citações encontradas
Ao calhas, numa página qualquer.
E é como o dia da Mulher,
Dia de santa hipocrisia.
E vem o dia do Ambiente,
Arrebanha-se toda a gente
E vai p’rás praias apanhar lixo,
Encarreirada e cum saco na mão.
E não se sabe para que serve isso
No dia seguinte, todos cospem para o chão.
E hão de celebrar o dia do Teatro
Aonde nunca vão.
Ficam em casa
E veem televisão.
E o dia da Paz
É o que se vê,
Nesta Terra,
Não se sabe bem porquê,
Celebra-se com os homens em guerra.
Anda tudo tão perdido
E tão disperso,
Tão distraído e tão vário,
Que parece andar este Universo
Sempre ao contrário
De tudo o que celebra.


Ei, tu aí, jovem que passas!
Onde quer que vás,
Celebra as desgraças
Não pronuncies a Paz.
Não sejas ingénuo,
Navega a oportunidade
E celebra a desonestidade!
Pratica a injúria
E, com os olhos em fúria,
Cerra o punho,
E celebra a corrupção.
Se te arriscas e te atreves,
Quem sabe, consegues,
Celebrando a coisa errada,
Endireitar o Homem no seu carreiro,
Acertar-lhe a trágica caminhada.

Dia mundial…
Em tua casa.
No meu quintal,
Jorra indiferença
Nas taças erguidas.
Os ricos sempre mais ricos
E os pobres sempre mais esfomeados
Num Mundo de teorias fingidas
E Ciência a pedido.
É hoje verdade
O que ontem fora mentido.
E nada disto tem importância,
Nada disto faz mal,
Desde que se celebre
A cada circunstância
Seu dia mundial.

jpv


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Pais e Filhos


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Impunidade

GEORGES MELET (GETTY)

Não se assiste impunemente
Ao sucumbir de uma alma.
À chacina violenta de um espírito.
Não se educa para a morte,
E menos ainda para a subserviência.
De resto, a morte é sempre preferível
À subserviência.
É uma questão de decência
E ética pura,
Não habituar as almas brevemente nascidas
Ao peso ignaro da censura.
Respeite-se quem quebra as regras.
Respeite-se quem desrespeita.
Respeite-se quem não se verga.
Respeite-se quem corre o risco e espreita
A paisagem proibida.
E não lhe chamem futuro, senhores.
A dignidade quere-se hoje.
Hoje, é já tarde para a dignidade.
É já tarde para ensinar a sonhar
E ir mais além.
Não sabe ensinar
Quem pergunta e quer ouvir o que ensinou.
Professor… professor a sério…
Olha para trás e vê o aluno que se revoltou.
Não vê a matéria…
Vê a transformação.
Quem ensina
E quer que se aprenda
Não sabe o número da lição.
Não deu lição.
A Educação não pode ser uma esmola.
Tem de ser um foguetão que não existe,
Um disparo de pistola
Com uma palavra em riste.
Uma conta errada.
Todas as contas certas estão erradas.
Tem de ser a aurora boreal num cálice de sonhos,
Um poema letal antes das emboscadas.
Uma alma livre vagueando
Na madrugada de uma cidade adormecida.
O segredo da juventude eterna.
O resgate e a redenção da vida
À porta de uma taberna
Cheia de doutores com beatas sob os pés.
Diz-me o que és
E dir-te-ei quem não quero ser.
Cadáver ambulante,
Morto antes de morrer.
Grita, berra alto, grita!
Até que fiquem surdos
Os detentores do saber
E quem te dá conselhos
E esfrega as mãos ao ver-te falecer.
Era bom rapaz!
Vês?!
Antes nunca o tivesses sido.
Antes tivesses parido
Uma cesta de incómodos
E sete armários de preocupações.
Mete-te em confusões
E faz tudo ao contrário
Do que te pedem.
Por baixo dos fatos cinzentos
E das maquilhagens de marca
Todos os corpos fedem.
Fá-los pagar o preço
Deste Mundo que te deixaram.
Desobedece!
E quando vierem à tua procura,
Não fujas!
Não sejas vítima!
Ergue a cabeça e aparece.
Ergue a voz e fala.
Ordena e cala.
Faz-te comandante
Do único navio que vale a pena comandar,
Da única viagem que vale a pena fazer,
Da vida que vieste viver.

Se não percebeste isto,
Já morreste
E ninguém te veio dizer!

jpv


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Taraxacum officinale

Estão a ver aquela planta,
Não sei como se chama,
Quando éramos miúdos,
Soprávamos só para a ver desfazer-se
E fugir-nos no ar
Enquanto lhe colocávamos
Uma mão por baixo
Como se a fossemos apanhar.
Não sei, sequer,
Se é uma planta ou uma flor.
Sei que fazíamos jogos de amor
Com o que restasse dela,
O que sobrevivesse ao sopro.
Não me ocorreu, na altura,
Poderia ser de intensa dor
Aquele voo inútil e desnecessário.
Nunca mais vi a plantinha,
Nunca mais me cruzei com ela.
Talvez a vida esteja ao contrário
E o meu destino seja afinal como o dela.
Meu pai já morreu.
Minha mãe foi a sepultar.
Meu filho vive lá longe
Onde a neve cair devagar.
Estão com ele meus netos.
E há outros queridos entes
Anónimos por entre as gentes
Mas ainda a acordar meus afetos
Que esvoaçam como a plantinha.
Graciosos, desordenados, distantes…
E com uma mão por baixo.

E é isso que não percebo
Neste universo:
Se foram eles que se dispersaram,
Ou se sou eu
Que ando disperso…

jpv


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Antes do Tsunami

A onda recolhe, tranquila.
O vento deixa de soprar, insuspeito.
As aves calam-se
E as árvores aquietam-se.
O horizonte límpido
Acolhe a luz serena
Que vai beijar
O beijo do céu
Com o mar.
O Universo silencia-se.
Os turistas invejam
As suas próprias vidas
E os locais passam,
Indiferentes à paisagem.

Ao longe, um cão uiva.
E só depois…

jpv