Estamos a sucumbir à estupidez.
Num espaço de tempo muito curto, três notícias me chamaram à atenção, todas, na sua essência, com o mesmo teor: atos de estupidez ditatorial sem qualquer propósito, sem qualquer sentido ou fundamento.
E, sejamos honestos, isto não é de agora. A estupidez, claro, mas também, e sobretudo, esta forma de estupidez que é calar as pessoas, impedi-las de expressar a sua individualidade, a sua opinião. Basicamente, está a ser-nos roubado aquilo por que mais lutámos nos últimos séculos: a liberdade de expressão. A liberdade individual.
Ao contrário do que possa parecer, não são atos isolados. Fazem parte de uma ideologia concertada entre diversos setores e grupos de interesse da nossa sociedade. Uma ideologia tão forte e tão fortemente imposta que está a converter-se numa cultura. É um bando de ignorantes e pré-ofendidos que não sabem distinguir nada de coisa nenhuma, que não percebem o que é uma obra de arte ou um contexto de enunciação num livro.
Esta nova forma de estar, sob o falso pretexto de defender a igualdade, de defender direitos, de defender formas de estar de minorias, está a tornar-se numa maioria opressora, ditatorial, a obrigar-nos a pensar como eles querem, está a obrigar os nossos filhos e os nossos alunos a pensar como eles querem, sob pena de acusações de discriminação, racismo, machismo, totalitarismo, usurpação cultural. Sob pena de causarem a morte social de quem discorde desta corja de semianónimos que, normalmente, só se mostra em grupo ou em tribunal.
Temos de combater a discriminação, seja ela de que tipo for, temos de combater o racismo, seja ele contra que etnia for, temos de combater o machismo e todos os ismos perniciosos, temos de combater todas as formas de desigualdade, de faltas de equidade. Isso não se discute. É encarar os problemas, assumi-los e enfrentá-los.
Contudo, isso não pode fazer-se destruindo a nossa própria cultura, herança de milénios de pensamento intelectual e criação artística. Isso não pode fazer-se criando mais formas de discriminação e desigualdade ou acentuando as que já existem. A defesa dos valores que enunciei não pode fazer-se como se se tratasse de uma vingança, caso contrário, não aprendemos nada.
Nunca pensei, nos meus dias de vida, dizer esta frase de forma denotativa, mas a verdade é que estamos a viver, literalmente, as primeiras páginas do “Fahrenheit 451” de Ray Bradbury.
Recentemente, no Reino Unido, houve bibliotecas que esconderam livros de Enid Blyton por causa de “linguagem ofensiva”. Não sei quanto a vós, mas eu li aquilo tudo, bem jovem, e não me senti ofendido e se sentisse parava de ler e não lia mais.
Ainda mais recentemente a própria editora das publicações inglesas dos livros de Agatha Christie alterou o conteúdo de diversos livros da autora para, supostamente, excluir descrições físicas, referências étnicas e insultos. Podemos inferir, portanto, que não há mais físicos, que não há etnias, que não há ofensas. Uma escritora exímia que escreveu livros que marcaram gerações, que entusiasmaram milhões de pessoas, traduzida em dezenas de línguas é agora censurada por esta corja de imbecis e ignorantes que se arroga o direito de estuprar a Humanidade naquilo que tem de mais precioso: a sua produção artística. E não pensem que é caso único. Já fizeram o mesmo ao Roald Dahl e ao Ian Fleming.
Meus amigos, anda à solta um censor legalizado a castrar a nossa cultura e nós estamos a deixar. Isto é crime! É organizado e visa calar-nos, domar-nos, forçar-nos a um pensamento único e pré-determinado. Espero que os portugueses e Portugal estejam à altura. Depois de corrermos com o Salazar (mais ou menos), temos de nos ver livres destes. Mas estes são muito piores porque agem legalmente e para nosso bem(!!!). Sejamos honestos e claros: qualquer pessoa que pense, que produza uma ideia e tenha uma opinião e a expresse, corre o risco de ser ofensiva. A interação social é isso mesmo. Chegarmos a pontos de acordo e desacordo, percebermos até onde podemos ir, até onde pode ir a nossa liberdade e a dos outros também. Esconder livros, corrigir livros e despedir professores que ensinam aquilo que deve ser ensinado é uma liberdade que oprime a minha porque destrói a minha herança cultural. Por isso, não me calo.
Mas o fenómeno entra na Escola. Naturalmente, até porque a Educação é a mais poderosa arma e um chão fértil de manipulação. Ainda mais recentemente uma professora, diretora de uma escola, nos Estados Unidos, foi obrigada a demitir-se por ter mostrado uma imagem da estátua de David e da “Criação de Adão”, ambos de Michelangelo Buonarroti aos alunos. Os pais forçaram a situação apelidando a estátua de pornografia (!!!). Exigindo serem avisados sempre que um docente mostra um nu frontal. Não é um nu frontal, senhores, é uma das mais maravilhosas criações da Humanidade. São criações dos homens que vos trouxeram até aqui, até hoje. São os pilares das vossas miseráveis existências. Já nem vou falar na urgência de confiar nos docentes. Mas falo, claro está, do silenciamento que isto constitui.
Não sei se já encontraram vida em Marte. Avisem-me assim que encontrarem que eu endivido-me e compro já uma flat tipo 2, mesmo em ambiente agressivo e inóspito. Duvido que seja mais mal frequentado do que este pardieiro a que chamamos Terra.