Mails para a minha Irmã

"Era uma vez um jovem vigoroso, com a alma espantada todos os dias com cada dia."


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Crónicas de África – Os Novos Chineses

Crónicas de África – Os Novos Chineses

Todos sabemos que o imenso poderio económico e financeiro da China começa a revelar-se e a ganhar proeminência internacional à medida que a Europa e os Estados Unidos são assolados por crises. Não espanta, pois, que os chineses invistam em mercados com grande potencial como é o caso de África. Ora, como esta gente faz o trabalho de casa e se prepara a sério para os desafios que tem de enfrentar, há uma imensa oferta de cursos de Língua Portuguesa nas universidades chinesas. E a razão está fácil de perceber. Se a ideia é entrar em África, então convém estar munido da mais importante das ferramentas. As línguas que aí se falam.

Aqui em Maputo veem-se muitos, mas não são os chineses a que estamos habituados. São diferentes.

Os chineses a que me habituei, por ler, por ouvir contar, por ver nos filmes e documentários, são pessoas que, independentemente de serem ricas ou pobres, e eram sobretudo pobres, eram muito discretas, deslizavam em passinhos curtos e silenciosos e falavam em palavras curtas e pouco sonorosas. Discretos, portanto. E contidos. Além disso, pessoas muito austeras, de poucos sorrisos e quase nenhuns risos. Isto pode estar tudo errado, mas é a imagem que tenho.

Depois, com o passar do tempo, surgiram outros chineses. Os das lojas e dos restaurantes, em Portugal. Esses falavam um pouco mais, trocavam os erres pelos eles, mas continuavam pouco sorridentes, quase só se viam nas ditas lojas e restaurantes, praticamente não se viam em locais públicos, permaneciam discretos e nada ostensivos de bens.

Em Maputo há uma nova casta de chineses. Em primeiro lugar, falam português com uma assinalável fluência, um sotaque muito treinado e uma amplitude vocabular invejável. Frequentam restaurantes e locais públicos, enchem as mesas de iguarias e canecas de cerveja, fumam demorados cigarros e charutos gordos, fazem-se transportar em veículos quatro por quatro de alta cilindrada e modelos recentes, trabalham como gestores de obras de construção civil seja de âmbito privado, seja público e falam alto, riem-se e brindam estalando as canecas estridentes da cerveja uma das outras.

Nós, portugueses, fazemos quase tudo isto. Mas nós somos mediterrânicos. Está na nossa matriz comportamental. A imagem que tinha dos chineses não era nada esta. Eu nem sabia que eles eram capazes de falar alto, quanto mais de saírem inebriados de um restaurante em conversas sonoras e gargalhadas soltas ao ar quente de África. Das duas uma: ou o continente vermelho muda as pessoas, ou há qualquer coisa, outrora adormecida, que anda a acordar nestes novos chineses. Como disse um amigo meu: Mao, mao!
jpv


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Citando Paulina Chiziane

Paulina Chiziane

Citando Paulina Chiziane

Paulina Chiziane não fala, conta histórias.

Conhecia-a recentemente num curso de formação sobre literatura organizado pelo Instituto Camões em Maputo.

Primeiro ouvia-a num breve agradecimento e esta noite numa longa e deliciosa entrevista magistralmente conduzida por Nelson Saúte.

Paulina vem da região de Gaza, cresceu nos subúrbios de Maputo e, reza a história, foi a primeira mulher moçambicana a publicar um romance. O que é curioso porque nega ser uma romancista, Nem sei o que isso é. Eu sou só uma contadora de histórias.

A autora impressiona pela atitude genuína, confrontadoramente genuína, na forma como assume o que não sabe, como admite que não sabe quem é porque ainda anda à procura da sua identidade. De palavra fácil e franca, esta mulher que se diz contadora de histórias e sabedora de nada, Eu desenrasco-me, falou da história e da cultura de moçambique, de religião, de paganismo, de poligamia, do desencontro da Lei com a Vida e, confessando-se questionadora, procurou incomodar o público o que, a espaços, conseguiu.

Muito simples no trato, é uma pessoa despojada de títulos e assunções precipitadas de mérito. Apenas gosta de escrever histórias e fá-lo com a naturalidade com que as vive. Como disse, Eu tenho milhões de histórias.

Estive a ouvi-la durante quase duas horas sem que desse pelo passar do tempo e, no fim, para os meus leitores, trago uma mão cheia de citações. Algumas frases são pérolas do conhecimento ontológico e antropológico urdidas pela mulher que nada sabe, mas tudo questiona. Aqui ficam, pois, em jeito de partilha. E, claro, aconselha-se a leitura dos seus livros que indicamos no final deste apontamento.

“Se Deus está em todo o lado, também está em África.”

“O Cristianismo que vem com o colonialismo, é um Cristianismo intolerante.”

“Em África, Deus é concreto. Na Europa, Deus é abstrato.”

“O que tenho feito com os meus livros é uma partilha.”

“As mulheres enfrentam sempre um estigma. Se o Mia escreve bonito sobre as mulheres ninguém lhe chama feminista.”

“Se emprestas roupa a quem tem frio, se dás comida a quem tem fome, porque não emprestas o teu marido por solidariedade?”

“As leis são só para dez por cento da população. A população urbana. E esquecem os noventa por cento de população rural.”

“As sociedades poligâmicas têm vantagens, mas as mulheres sofrem sempre.”

“O meu vício chama-se questionar, incomodar.”

“Na História, há um gajo que eu admiro. Eu gosto de Luís de Camões. Mas não pela mesma razão dos outros. Eu gosto dele porque ele não seguiu um caminho, ele abriu um caminho.”

“O africano, perante a crise, recorda-se das suas raízes.”

“Nós, africanos, estamos condenados a ser duais.”

“Questionem tudo o que vos oferecem como perfeito.”

“O colonialismo continua na cabeça desta gente maravilhosa que se diz independente. Independente de quê?”

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Algumas obras de Paulina Chiziane:

Balada de Amor ao Vento, 1990.
Ventos do Apocalipse, 1993.
O Sétimo Juramento, 2000.
Niketche: Uma História de Poligamia, 2002.
O Alegre Canto da Perdiz, 2008.
Na mão de Deus, 2012.
Por Quem Vibram os Tambores do Além, 2013.

jpv


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A Paixão de Madalena – Ponto de Situação

Caros amigos e leitores,

Bem sabemos que foi já há mais de três meses que publicámos o último capítulo de “A Paixão de Madalena”, o 12º, contudo, a história não está suspensa. Terminámos já o 13º capítulo e estamos em fase avançada do 14º. 

Acontece que o final de um ano letivo, umas férias repletas de tarefas e, agora, o recomeço do novo ano escolar, não têm permitido a serenidade necessária para rever e publicar o 13º nem para avançar com mais texto.

Acresce, ainda, que temos concentrado todas as nossas energias num projeto de que em breve vos daremos conhecimento e que será, esperamos, uma boa notícia para todos os leitores de MPMI.

Grato pela vossa paciência e até breve.


jpv


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Até a Ler, Somos Um País de Poetas


Contador do Blogger


Contador do Facebook


Num dia normal, a página de MPMI, aqui, no blogue, tem cerca de 200 visitas e cada artigo colocado na página promocional, no Facebook, rondará as cento e muitas, duzentas visualizações.

Bastou escrever-se um poema, postar-se o dito, e as visitas aqui no blogue foram 278 sendo que a página promocional no Facebook teve, só nesse item, mais de 500 leituras!

Caso para dizer que somos um país de poetas, até a ler!

Muito Obrigado pela vossa dedicação,

jpv


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Crónicas de Maledicência – Confusões da Minha Cabeça

Crónicas de Maledicência – Confusões da Minha Cabeça

Este fim de semana baralhou-me um bocadinho. Eu bem sei que a idade vai deixando marcas, mas, ainda assim, gostava de acreditar que não estou a envelhecer para parvo. Há notícias que assustam porque não são notícia, há notícias que assustam porque não se percebe porque é que são notícia e há notícias que assustam por serem notícias. Confusos? Não fiquem que eu explico tudinho em três pinceladas.

Sem Cobertura!
No início do fim de semana apareceu uma notícia que se eclipsou com a mesma velocidade com que veio. Ao que parece, em agosto, ainda durante o mês de agosto, o desemprego efetivo aumentou. Não vou discutir políticas, nem atirar culpas. Há muito por aí quem faça isso e todos sabemos, mais ou menos, como é que chegamos aqui. Preocupam-me os milhares de jovens e famílias sem trabalho e espantou-me não ter havido uma cobertura séria e ampla do facto. Ficou, assim, à margem do ordenado do Ronaldo.

Com Cobertura!
Quem teve mais cobertura do que um bolo de chocolate foi o ordenado do Cristiano Ronaldo. Em primeira análise, eu acho que não tenho nada a ver com isso. Se lho pagam, isso é lá com ele e com quem lho paga. Já estranho que quem lho paga esteja tão endividado e, mesmo assim, consiga pagar, a UM só jogador, VINTE MILHÕES DE EUROS NUM ANO. Por outro lado, pergunto-me que raio de sociedade é esta em que um entertainer ganha num dia o que um médico ganha num mês, ganha num ano o que nenhum advogado, enfermeiro, professor, arquiteto, bombeiro, ganha numa vida?! Será que a pertinência social da profissão dele justifica a diferença? Mas há mais: eu bem sei que a lei não permite uma cobertura ampla das autárquicas, mas era mesmo preciso abrir jornais e despender tantos minutos, invadir-nos tão frequentemente com o ordenado de um homem só? Estes critérios editoriais deixam-me… confuso!

Claro que vai haver guerra!
O facto de ir haver, ou não, guerra, não é social, não é humano, não tem a ver com a defesa de coisíssima nenhuma nem com a proteção de quem quer que seja. Tem a ver com petróleos, gasodutos, escoamento de armas e fornecimento de munições. É, portanto, negócio. Não olhem para o sorriso de Obama! Ele não manda nada! Reparem, como não é possível atacar a Síria porque o Secretário de Estado americano estragou o negócio com aquela patacoada do “Se entregar as armas químicas todas, não haverá guerra!” e o tipo da Síria disponibilizou-se a entregar porque o Putin o aconselhou porque precisa do gasoduto, o amigo do mundo, Barack Tio Sam Obama, veio, muito sorrateiramente, dizer que ameaça muito pior do que a Síria era o Irão! Percebem? Claro que vai haver guerra! A guerra faz falta ao negócio, é boa para o negócio. O irónico é que, depois, nós, os inocentes, digladiamo-nos com questões de ideologia, cultura, valores e princípios… Mais uma confusão, vulgo, palhaçada, em que embarcamos desnecessariamente.

Ou seja, estamos entregues aos sorrisos da bicharada. Os desempregados portugueses, que existem, não interessam para nada. O CR7, que é só um, teve cobertura de milhões para outros milhões verem e o Obama anunciou ao mundo que ia anunciar ao mundo, e em breve, o anúncio de mais um fatídico inimigo a abater… E vai daí, a cotação da bolsa em Nova Iorque subiu de imediato. Em flecha!

Tenho Dito
jpv


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As Cores da Capulana – Amanhecer Índico

Amanhecer Índico

É um mar cinzento
Como o céu.
Uma linha definida
E distante.
Uma capulana ao vento
Ondulante,
Enquanto ela passa.
E uma outra com sacos à cabeça,
Sua sorte e sua desgraça.
E são umas pessoas lá longe,
Mar adentro,
Saudando a Deusa,
Banhando-se de sal e água
Como se aspergissem a vida
Aquém da tal linha definida.
São três aves rasando a água
Marinha.
É uma senhora de mala e bem vestida
Que caminha sozinha
Enquanto Deus a espera na igreja.
E é um homem de turbante,
Passo rápido e certo,
Desaparece num instante.
E é uma mulher vestida de desporto
Que passa correndo com sua cadela.
Uma leva música nos ouvidos,
E a outra, no pescoço, a trela.
E é um cão galgando as ondas
De felicidade,
Vai para a água entusiasmado
E volta carregado de verdade,
O amor incondicional,
Por seu dono amado.
E é um madeiro enterrado
Na areia,
Raiz antiga e secular
Onde os namorados
Se vêm sentar.
E há este mar
Sossegado e quente,
Pano de fundo da vida da gente.
E há estas palavras
Com que me debato e luto,
Junto à areia cúmplice
Da baía de Maputo.

jpv


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Agradecimento

Agradeço, em meu nome e em nome de MPMI, à escritora e jornalista Shirley Cavalcante a divulgação do nosso trabalho na revista “Divulga Escritor”.

Muito obrigado pelo seu carinho e profissionalismo, Shirley, um forte abraço luso-africano!

João Paulo Videira
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Citação do Caminho

“Vender harmonia e felicidade é um bom caminho.”

jpv


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Vinte e Cinco


Vinte e Cinco

Olá!

Foi ontem. O nosso 11 de setembro. Marcante, este. Completaram-se 25 anos desde que, ainda muito jovens, imberbes, literalmente (!), resolvemos casar. E, na altura, queríamos que fosse para sempre, mas não sabíamos quanto tempo duraria sempre. Olha, afinal, num ápice, num átomo de tempo, já vamos em vinte e cinco.

Uma coisa é certa, se fizéramos planos para sair do país e trabalhar longe de casa, se isso alguma vez cruzou as nossas mentes, acho que foi no início da nossa união. Nunca pensámos que, se chegássemos aqui, passaríamos o dia em Maputo. Do outro lado do mundo.

O percurso tem sido fantástico. Melhor do que alguma vez sonhei.

Se alguma coisa me fica destes anos é a certeza de que estão neles os mais extraordinários momentos que vivi. Estão neles, também, o nosso filho que, por via das sinuosas linhas do Destino, fez ontem 23 anos. Falámos com ele de manhã. Está lá longe. Está bem. É nosso. É como se estivesse aqui, onde está sempre. Nos nossos corações.

Sim, vivemos dificuldades, passámos por crises. A maior parte das vezes, responsabilidade minha, por esse espírito deambulante que me faz questionar tudo. Tu és mais como era o meu pai: uma rocha de firmeza. Outras vezes, também, por inconstância tua. Nada disso importa. Somos, como disseste, companheiros! E acho que somos mais do que isso. Uma metade da outra metade. Um amor que ficou e resistiu e perdurou e renasceu e que habita hoje, tranquilo, nossos corações. 

Mudei contigo. Para melhor. E, sei-o com convicção, não quereria ter passado o dia de ontem com mais ninguém. Sendo honesto: não quereria ter passado os últimos vinte e cinco anos com mais ninguém.

Foi um dia de trabalho. Mas também foi um dia de flores e bolo de chocolate. E, sobretudo, foi um dia sem a energia de outros tempos, mas com a ternura e a certeza da companhia um do outro. 

Agora, acho, inicia-se um outro caminho. Por mais que custe, é preciso dizê-lo, escrevê-lo. Meu amor, acho que começou a estrada onde envelhecemos juntos. É precisa, agora, a sabedoria para tirar partido destes anos que são aqueles em que tudo é melhor e, ironicamente, em que tudo caminha para o fim. Seja! Contigo a meu lado!

Com a ternura dos quarenta e muitos, com o amor de sempre,

jota


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Citação da Criação



“Nunca o Criador fez alguém tão perfeito que lhe não colocasse uma falha a lembrá-lo da sua humanidade, da mesma forma que nunca se dedicou a fazer alguém tão vicioso que lhe não atribuísse uma virtude a lembrá-lo que emanava da mesma divindade que todos os outros.”

João Paulo Videira 
In “De Negro Vestida”