Mails para a minha Irmã

"Era uma vez um jovem vigoroso, com a alma espantada todos os dias com cada dia."

A Crise A

2 comentários

Era uma vez uma Gripe que não tinha nome. Mas tinha dono. E o dono, porque era pessoa de pouca imaginação, chamou-lhe A. Ora, ninguém queria esta gripe como, de resto, ninguém quer gripe nenhuma. E o dono dela, como a queria vender, pensou: “Como é que eu vou fazer publicidade eficaz a uma coisa que ninguém quer comprar?”. E foi então que teve essa brilhante ideia: “Assusto toda a gente!” Vai daí começou a fazer um gigantesco BUUUUUUHHHH universal ao mesmo tempo que fazia uma carantonha feia a ver se assustava. E assustou. E as pessoas, assustadas, correram atrás do gel, do álcool, das máscaras, dos comprimidos, das vacinas. Tudo se encomendou aos milhões. Não por causa da gripe, só por causa do medo. E fizeram-se planos de contingência e saíram muitas notícias nos jornais, nas rádios e nas televisões e houve contagem de mortos que morriam de tudo e mais alguma coisa menos de Gripe A, comprovadamente é certo. E depois, de entre os biliões de pessoas que somos, lá houve um ou outro que morreu de gripe. Como morrem todos os anos. E lá voltaram as notícias. E compraram-se milhares de milhões de unidades de desinfectante para as mãos que é álcool com cheirinho, e de máscaras e sabonetes iguais aos outros mas diferentes porque eram para a gripe e toalhetes e passou-se a espirrar para o cotovelo patético e as pessoas assustadas encheram os bolsos do senhor sem imaginação para nomes mas com muita imaginação para vender coisas que ninguém quer, o dono da Gripe A. Hoje, depois do Natal, das eleições, do futebol, e, sobretudo, depois de estarem exauridos os bolsos que já tinham pouco e depois de estar já satisfeito o dono da gripe, já ninguém se lembra de nada. E há dispensadores abandonados. Uns vazios, outros meio cheios, outros cheios e outros ainda arrumados nas caixas onde vinham embalados. E há sabonetes que nunca viram o sol e máscaras que nunca foram ser estúpidas para a cara de ninguém. E tudo isso jaz abandonado mas pago. E a memória é curta. E não tarda nada estamos a pagar outra coisa qualquer.

Não, meus amigos, não me enganei no título do post.

João Paulo Videira
Desconhecida's avatar

Autor: mailsparaaminhairma

Desenho ilusões com palavras. Sinto com palavras. Expresso com palavras. Escrevo. Sempre. O resto, ou é amor, ou é a vida a consumir-me! Há tão poucas coisas que valem a pena um momento de vida. Há tão poucas coisas por que morrer. Algumas pessoas. Outras tantas paixões. Umas quantas ilusões. E a escrita. Sempre as palavras... jpvideira https://mailsparaaminhairma.wordpress.com

2 thoughts on “A Crise A

  1. Desconhecida's avatar

    Minha Amiga, antigamente, quando um aluno se cruzava com um professor e estava na companhia de alguns colegas ou familiares dizia “Aquele já foi meu professor”. E dizia-o com orgulho e gosto e admiração e até uma pontinha de vaidade. Hoje digo eu “Esta senhora já foi minha aluna” e os sentimentos são semelhantes. Um abraço. João Paulo Videira

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  2. Desconhecida's avatar

    Parece que voltámos ao assunto dos gigantes e dos moinhos… desta vez saiu moinho!
    Já imaginou se no tempo de D. Quixote já existissem os “MASS MEDIA”?
    Em relação ao nome da gripe, eu acho que o dono não teve falta de imaginação. O que ele teve foi falta de sorte!
    A Gripe A vem na sequência de outras epidemias , quase pandemias (de valores)que ultimamente têm sido anunciadas. Ora vejamos: H5N1-a gripe das aves ou gripe aviária, como foi chamada,destruiu muitas vidas, se tivermos em conta toda uma cadeia que vai desde a produção de aves até ao consumo e que, de um momento para o outro, ficou arruinada.
    Antes apareceu, também, um outro vírus: BSE- ou, como foi chamado “no mercado”, Doença das vacas loucas, que teve repercussões inimagináveis ao nível da comercialização da carne bovina, embora mesmo loucos andassem os se que deixaram influenciar por tamanha campanha de (DES)sensibilização.
    Agora, felizmente, o nome “Gripe Suína”, que inicialmente foi escolhido pelo seu dono, foi rapidamente substituído por”Gripe A” antes que os efeitos se tornassem devastadores para a produção de uma das carnes mais comercializadas no mercado europeu.
    Parece que desta vez ainda ficaram algumas moedas nos bolsos dos produtores, distribuidores e comerciantes de carne de porco que sempre deu para comprarem as máscaras!
    Hoje em dia, o mal não está nos diferentes pontos de vista mas sim na forma agressiva com que eles nos são apresentados, porque se não tivermos cuidado,estamos a contribuir para que os “GIGANTES” levem a água ao seu “MOINHO”!!

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