Mails para a minha Irmã

"Era uma vez um jovem vigoroso, com a alma espantada todos os dias com cada dia."


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Crónicas de Maledicência – Uma Questão de Oportunidade

Crónicas de Maledicência – Uma Questão de Oportunidade

Veio hoje a público que o Bloco de Esquerda, em particular, duas militantes daquele respeitável partido, pretendia discutir o fim do piropo nas ruas de Portugal. O mais engraçado é que não sabem ainda como pôr em prática tal proibição. Nem elas, nem eu. Vejamos, algo de extremamente pertinente se me aflora de imediato à mente: trata-se de qualquer tipo de piropo? Há piropos aceitáveis? E como é que os piropeiros vão saber quais são os que podem proferir-se e quais os que não podem? Afixa-se uma listagem de piropos proibidos na junta de freguesia? À porta das obras? Já não há obras em Portugal. A crise, que o BE tanto combate, ainda bem, é ela, em si, um inseticida de piropos uma vez que acaba com a construção e não havendo obras, a grande maioria dos piropeiros fica desempregada e sem vontade de piropar. Eu bem sei que a prática do piropanço pode ser conotada com marialvismo, machismo, assédio, etecetera e tal, mas, também sei que há diferentes níveis de piropeira. Por exemplo, se uma moçoila, ao passar na rua, ouvir a frase, Chega-te à sombra que o sol derrete os bombons, não vejo como possa sentir-se agredida e assediada. Há até um certo cuidado com a saúde da moça, pois todos sabemos os nefastos efeitos do sol, nomeadamente, derivado à pele! 

Todas estas reflexões, por ricas e interessantes que sejam, me parecem, contudo, um certo desperdício de energias políticas porquanto, ou me engano muito, ou há coisitas a necessitar mais da nossa atenção. Assim de repente, ocorrem-me poucas. Por exemplo, no plano internacional, é capaz de ser exagero meu, mas vejo no horizonte a possibilidade de um conflito bélico entre aliados e sírios com fantasmas recentes a pairarem sobre uma tal iniciativa e muitos inocentes a serem peões menores em confrontos de gigantes. Dentro de fronteiras, temos mais um braço de ferro entre o Governo e o Tribunal Constitucional onde se jogam os empregos de milhares de trabalhadores, temos a calamidade dos fogos que ardem, ceifam vidas atrás de vidas, algumas bem jovens, havendo questionáveis e discutíveis opções no âmbito da gestão dos recursos para fazer face a estas calamidades, há o desemprego, há a falência das famílias, há a emigração forçada de milhares de jovens e qualificados portugueses e Elsa Almeida e Adriana Lopera não conseguem lembrar-se de nada mais premente para discutir do que a abolição do piropo?

Não me parece só uma questão de falta de oportunidade, embora o seja também. É mesmo uma questão de vazio político que, mais do que as próprias ou o BE, envergonha o país.

Tenho dito!
jpv


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Crónicas de África – África Depois de África


Crónicas de África – África Depois de África

Zibreira, 24 de julho de 2013

Como a imagem documenta, fomos recebidos pela família e por amigos com bandeirinhas à porta de casa e a expressão “Bem Vindos” riscada no fundo de uma caixa de mines que bebemos com satisfação. Essa e outras. Rever a família foi fundamental. A mãe, a mana, o filho, os cunhados, os sogros, os primos, os tios, os amigos… Ainda não conseguimos vê-los todos. Tentaremos. Foi bom, foi reconfortante, o reencontro com o nosso país, as nossas gentes, os nossos rituais, a expectabilidade e a previsibilidade dos gestos das pessoas, dos serviços, dos equipamentos sociais. Tudo isso foi fantástico. E, contudo, essa organização e essa formatação, tão necessárias à nossa segurança e ao nosso bem estar, e que eu tanto prezo, foi aquilo que mais estranhei. África vive em mim nas coisas mais simples e impercetíveis do quotidiano. Há uma liberdade geradora, há improviso, há sonho, há esperança e há o acreditar de que ainda posso contribuir, de que ainda posso mudar. 

A Europa, sendo mais confortável, é mais constrangedora dos nossos movimentos.

Sou tão português como sempre fui. Talvez mais. A condição de emigrante força-nos a reperspetivar o nosso país com olhos de benevolência adocicada pela saudade. Mas temo que, definitivamente, já não seja só português. Talvez tenha duas nações e talvez uma delas seja um continente inteiro. Nós podemos partir de África e regressar ao confortável ninho da nossa pátria, mas África não parte de nós. Anicha-se no nosso coração com a virtude da liberdade, dos sorrisos de esperança e com todas as suas vicissitudes e instala-se no nosso ser. África fica.

Às vezes temo ter duas pátrias. Quem sabe se um dia chego a Portugal e me sinto estranho e, estando em África, não estarei completamente em casa porque me falta o chão lusitano. Muitas pessoas vivem a dicotomia da identidade. Podendo ser de duas terras, não sabem bem a qual pertencem. Eu temo pertencer tanto às duas que venha a não pertencer a nenhuma. A Portugal regressa-se. É o “nostos” grego sem tirar nem pôr. De África nunca se parte. Em Portugal dominamos, mas temos a liberdade coarctada. Em África somos dominados, mas temos a liberdade à rédea solta. Em Portugal vive-se a segurança que se conquista ao preço de limitar horizontes. Em África, a insegurança representa um sem número de oportunidades num horizonte longínquo e indefinido de possibilidades de vida.

Nestes dias de manutenção de espaços e afetos, tem-me andado este país a enternecer, tem-me andado aquele continente a chamar. África depois de África, em Portugal.

jpv


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Crónicas de Maledicência – Uma Questão de Oportunidade

Crónicas de Maledicência – Uma Questão de Oportunidade

A Coreia do Norte não podia ter escolhido pior semana para iniciar a terceira guerra mundial. É que ninguém lhes vai ligar nenhuma. Os militares norte coreanos informaram o mundo que iam atacar postos norte americanos uma vez que haviam obtido autorização, ontem, para o fazer.

O assunto parece grave e até parece, em última análise, dizer-nos respeito a todos. Mas, quem lê os jornais portugueses, ouve e vê os noticiários portugueses e consulta a imprensa portuguesa na web, apercebe-se de que os coreanos não percebem nada de política, nem de guerra. Para haver uma guerra mundial, é preciso que o resto do mundo nos preste atenção. Ora, senhores coreanos, fiquem sabendo que hoje à tarde se demitiu o Senhor Ministro, Miguel Relvas, hoje à noite joga o Benfica, amanhã à noite fala o Nuno Morais Sarmento na RTP e, no domingo à noite, à mesma hora, na TVI e na RTP1, falam Marcelo Rebelo de Sousa e José Sócrates. Ou seja, vocês até podem querer essa coisa lá da guerra mundial, mas haja decência, falamos nisso lá para segunda feira. Daqui até lá, fazem favor de aguardar que a nação lusitana está em suspenso por via de motivos primeiros. Fachavor não incomodar com coisitas de somenos… lá agora guerra… um par de estalos é o que é!

jpv