[Imagens de Maputo é uma secção deste blogue com o objetivo de divulgar imagens do quotidiano da Capital de Moçambique. Não há um tema. O quotidiano de Maputo é o tema. Serão imagens exclusivamente captadas por mim, e, também, exclusivamente captadas com telemóvel. Não serão fotos tiradas de propósito, com intenção estética, serão fotos tiradas como quem passa, no momento em que passa. Instantes. Sem texto. Só com o título que lhe atribuirmos. Apreciem! — jpv —]
Category Archives: Mar
À Deriva do Atlântico
À Deriva do Atlântico
Estou aqui sentado
Nesta pequena canoa
Vou-me então transformar
Em Fernando Pessoa.
Só tenho dois companheiros
O lápis e o papel
E sou alimentado
Por um pote de mel.
Olho para o mar
O mar extenso e sombrio.
Quando penso na solidão
Até sinto um arrepio.
Sinto saudade de uma Rosa
Ou então de uma tília
No mar vejo o reflexo
De toda a minha família.
Os meus amigos despejados
Por um grande cano
Eu estou neste barco
À deriva do Oceano.
Ao escrever estas palavras
Cheias de fantasia
E ao digitar este poema
Fico cheio de alegria.
Passei muitos dias
No oceano a navegar
Mas a terra está à vista!
E bem irei ficar.
As Cores da Capulana – Amanhecer Índico
Amanhecer Índico
É um mar cinzento
Como o céu.
Uma linha definida
E distante.
Uma capulana ao vento
Ondulante,
Enquanto ela passa.
E uma outra com sacos à cabeça,
Sua sorte e sua desgraça.
E são umas pessoas lá longe,
Mar adentro,
Saudando a Deusa,
Banhando-se de sal e água
Como se aspergissem a vida
Aquém da tal linha definida.
São três aves rasando a água
Marinha.
É uma senhora de mala e bem vestida
Que caminha sozinha
Enquanto Deus a espera na igreja.
E é um homem de turbante,
Passo rápido e certo,
Desaparece num instante.
E é uma mulher vestida de desporto
Que passa correndo com sua cadela.
Uma leva música nos ouvidos,
E a outra, no pescoço, a trela.
E é um cão galgando as ondas
De felicidade,
Vai para a água entusiasmado
E volta carregado de verdade,
O amor incondicional,
Por seu dono amado.
E é um madeiro enterrado
Na areia,
Raiz antiga e secular
Onde os namorados
Se vêm sentar.
E há este mar
Sossegado e quente,
Pano de fundo da vida da gente.
E há estas palavras
Com que me debato e luto,
Junto à areia cúmplice
Da baía de Maputo.
As Cores da Capulana – O Mar no Olhar das Mulheres
As Cores da Capulana
O Mar no Olhar das Mulheres
Um olhar distante
perdido entre ti
E o horizonte.
Uma súplica,
Um momento e um instante,
Um mar
E uma fonte.
Sofres.
A condição não te favoreceu.
A menina que havia em ti
Conheceu os homens
E morreu.
Uma criança nas costas,
Uma coisa qualquer
A vender.
As capulanas atadas e postas,
Uma pessoa que passa
Sem te ver.
Vendes sonhos,
Vendes ilusões,
Vendes o desespero
De uma vida aos repelões.
Andam meninos
Bailando nos teus olhos
Que brotam o mar
De mansinho,
Fica suspensa a emoção,
Contida a palavra,
Vive no teu coração,
Que bate devagarinho,
Um trator que lavra
A esperança.
Não fossem os homens…
Não fossem os homens…
E seria tangível
A felicidade.
Porque tu, mulher,
Só és mulher,
Quando o teu homem quiser…
São violentas, as palavras,
Sangram quase tanto
Como o silêncio,
Beijam-te a boca que calas,
Mas agitam-te o pensamento.
Tanto que tu querias
Não pensar.
Viver a vida
Como a festa a atirar
Reflexos de excesso
Para a noite.
Como a estrada,
Banhada pelo mar,
Pisada pelo homem,
Tu és, ao passar,
Marginal.
De ti.
Fora da lei
Dos sentimentos,
Expatriada dos direitos,
Punida pelos teus próprios juízos,
Castigada pela tua ímpar e funesta condição.
Amaldiçoada a dar aos homens a redenção…
De si.
Para ti,
Só o pecado do amor,
Para ti,
Só essa doce e inevitável dor.
Para ti,
Faças o que fizeres,
Sobra sempre o mesmo mar
Que desagua no olhar das mulheres.
Maputo
E passa um chapa ruidoso
Que quase me atropela,
Atrás dele,
Desenha esses na estrada
Uma frenética chopela.
Passam carros com fulgor,
Estacionam num restaurante,
E, nesse mesmo instante,
Surge, solicito, o arrumador.
Vivem aqui
Sólidos e evitáveis
Desequilíbrios.
Uns pedem,
Outros dão.
E há nesta dança
Uma bruma de esperança.
Maputo é olhar em frente,
É uma terra
Semeada de gente.
É uma nação,
Um pátrio solo,
Um chão!
É a diferença
E a semelhança.
Maputo é mãe
De uma criança
Que ri e chora.
Maputo é todo
O tempo do mundo
E o tempo
É agora.
Cozinha para Homens – Bifes de Atum Fresco
Cozinha para Homens – Bifes de Atum Fresco
Mar de Medos

Mar de Medos
Na sua ingenuidade,
A criança pergunta:
– Nós somos felizes, mamã?
E ela disse-lhe que sim,
Escondendo-lhe o que sentia.
Havia nessa felicidade
Um excesso,
Uma perfeição que temia.
– Tenho medo de sermos tão felizes!
Confessou na surdina da intimidade
Ao amado e marido,
No momento em que dormiam os petizes,
E o segredo não podia ser ouvido.
Mas foi.
Desfez-se a ilusão onde mais dói,
Nessa tenra e pura idade
Em que se não desconfia
Que, para além da vida,
Há realidade.
E, hoje, aqui defronte do mar,
Azul e intenso, rimbombando seus segredos,
Luto com meus e antigos medos
E quero perguntar como na longínqua manhã:
– Nós somos felizes, mamã?
jpv
Navegante do Pó

Navegante do Pó
És o navegante
Altivo
Do mar encapelado
Que me tem cativo.
Sou o caminhante
Só
Desta estrada de terra e pó.
És o capitão
Do motim
No mar da minha revolta,
Rota sem horizonte nem fim.
Sou o homem
Que pisa o chão de ida
E perde o norte da volta.
E temos ambos,
Em terra ou no mar,
A força do olhar
Sob a mão erguida.
O sentido do tutano
Da vida.
A ânsia do regresso
Mesmo antes da partida!
jpv
(Ao som da tua playlist,
Nina Simone, Sinnerman)
Poema Escrito com os Pés dentro de Água

Poema Escrito com os Pés dentro de Água
O mar
Persiste
Em regurgitar
A clara
E límpida ideia.
Essa falua
De sonhos e imaginários
Batendo contra a rocha
E mostrando, exposta,
A luz e seus contrários.
E a escuma rebrilhando
Multiplica os brancos
Na água dançando.
Presa estava a alma
Do poeta,
E agora vive liberta
E voa
Na água ondulante
Prenhe de vida
E sal.
Passa a moça
Em seu biquíni sensual
E o poeta não a vê,
Bronzeada,
Porque nesse exato
Momento
Tem a alma lavada.
E o mar persiste em seu vai-e-vem,
E o poeta vê como ninguém
A clara e límpida ideia:
A vida é uma imensa teia
E não há coisa nenhuma
Que se não lave
Com a ondulante
E branca escuma.
jpv











