Mails para a minha Irmã

"Era uma vez um jovem vigoroso, com a alma espantada todos os dias com cada dia."


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Por causa dA Dívida – EPÍLOGO

Por causa dA Dívida
EPÍLOGO

ALGURES NAS AREIAS TÓRRIDAS E DESÉRTICAS DO SAHARA…

– Ventoiiiiinha!
– Sim, chefe, diga, chefe.
– Está um calor que não se pode. Vá buscar um garrafão de água ao jipe…
– Sim, chefe, mas, ó chefe…
– Diga…
– A história não tinha acabado? E na disputa entre os dois autores o Senhor João Paulo não reconheceu, no final do último capítulo, que a Dona Dulce tinha vencido?
– Deixe-se de parvoíces Ventoinha. O Senhor João Paulo só admitiu aquilo para que a Dona Dulce e a Dona ISA E. julgassem que tinham ganho…
– Mas, ó chefe, assim isto nunca mais acaba, pode haver sempre mais um capítulo!
– Irrraaa que é burro! Ventoinha, isso seria possível se o Senhor João Paulo tivesse numerado este capítulo, por exemplo com o número 19. Acontece que o Senhor João Paulo, inteligente e excelsa criatura, chamou a este capítulo EPÍLOGO! Você sabe o que é um epílogo homem?
– Nem conhecia a palavra, chefe.
– Irrraaa que é burro! Um EPÍLOGO é o capítulo que fecha uma história, a partir daí não pode ser mais continuada. É o fim!
– Eh chefe, o Senhor João Paulo é mesmo superior, certo?
– Certíssimo! Aproveitou-se dessa falha da Dona Dulce que em vez de fechar a história, limitou-se a numerá-la… é um homem muito inteligente!
– E ó chefe e nomeadamente e o que é que gente veio aqui fazer?
– Irrraaa que é burro! Você está no deserto, tem areia a toda a volta, tem uma pá na mão e pergunta o que é que veio cá fazer?
– Sei lá chefe e nomeadamente e apanhar um escaldão.
– Irrraaa que é burro! Veio cavar, sua cavalgadura, veio cavar… olha aqui está… EUREKA!!! Em cheio… Viemos carregados de mapas e bússolas mas isto deu resultado, é aqui mesmo!
– Ó chefe, sente-se bem? Isto são só uns arbustos…
– Abra os olhos, sua cavalgadura, que figura desenham os arbustos?
– Um X!
– E onde é que está sempre o X?
– Na palavra táxi?
– Irrraaa que é burro! No local do tesouro, sua besta! Comece a cavar que eu vou enviar um pombo-correio ao Senhor João Paulo a dizer que encontrámos o tesouro. Estamos ricos! Cave, homem, cave!
– Chefe, chefe, encontrei o baú! Está cheio de moedas de ouro e tem aqui um livro…
– É muito ouro?
– Eh chefe, mais do que alguma vez eu imaginei que existisse!
– E qual é o título do livro, Ventoinha?
– Na capa diz assim: “Por causa dA Dívida” pelo fabuloso João Paulo Videira e suas carinhosas ajudantes, Dulce Morais e ISA E.
– Certo, na mouche! Agora leia o último parágrafo.
– Certo, chefe e é nomeadamente para já, chefe. Ó chefe, o que é um parágrafo?
– Irrraaa que é burro! Leia essa parte final que diz epílogo…
– Eh chefe, somos nós no deserto, chefe…
– Ó homem passe à frente, leia o último trecho, o que está escrito em itálico porque é suposto estar a ser lido por si…
– Certo, chefe, é para já, chefe.

ILHAS SEYCHELLES

Num resort turístico nas Ilhas Seychelles, com cabanas de fundo envidraçado sobre o mar, pequenas praias privadas e areias alvíssimas e águas marinhas de um azul cristalino. Através da água do mar vê-se o fundo do oceano, seus corais e peixes multicolores. Numa enorme toalha de praia estão Huguinho e Joaninha beijando-se apaixonadamente depois de terem resolvido juntar os trapinhos por sugestão do multimilionário autor João Paulo Videira que descobriu um tesouro antiquíssimo nas areias do deserto do Sahara. Ao lado deles, recostados em duas enormes cadeiras espreguiçadeiras, estão Marinho e Belinha que bebem um refresco de leite de coco a partir do próprio fruto chupando por uma palhinha. Ela está a ler uma revista cor-de-rosa e ele tem um jornal desportivo sobre o peito mas adormeceu há muito e está apanhar um escaldão. O magnânimo João Paulo Videira pagou-lhes as dívidas e indemnizou as vítimas das suas vigarices e trouxe-os consigo para lhe fazerem companhia, afinal de contas, são uma criação sua. No meio do mar estão Patilhas e Ventoinha a pescar e a conversar animadamente. Num lançamento desajeitado, o anzol de Ventoinha atinge o rabo de Patilhas e ouve-se ao longe, Irrraaa que é burro!
Um pouco afastado deste grupo está João Paulo Videira recostado numa cadeira espreguiçadeira, com os joelhos dobrados e o seu caderno preto sobre eles. Está a escrever. Ajoelhada na areia, atrás de si, envergando um biquíni minúsculo em sua bunda redondinha e bronzeada está ISA E. que se dedica a massajar-lhe os ombros. Ao lado do escritor, também ajoelhada na areia, com um biquíni igualmente minúsculo em sua bunda encarnada queimada do sol, está Dulce que lhe vai passando um pouco de protetor solar no peito e nos braços. ISA E., com carinho no olhar, diz para Dulce:
– Quirida, o nosso JP é imbativéu, sê não acha não?
– Claro ISA E.! Só ele se lembraria de fechar uma história com o epílogo, como deve ser. Estou rendida à sua arte e aos seus encantos.
– Põe encanto nisso, quirida! Eli é tão espadaúdo! Músculo rijinho paca, viu?! JP, nosso amor, a massagem tá bem assim, tá?
– Muito bem ISA E. Você é ainda mais carinhosa ao vivo do que no blogue.
– E o creme, está bem assim, JP?
– Muito bem, Dulce, tens muito jeitinho.
– JP, é este o final que pensaste para “Por causa da Dívida”?
– Não, Dulce, isto é só parte do final… ainda falta um toque…
– Um toque quê, JP?
– Um toque apoteótico. Olha, aí vem ele… estás a ver a vegetação aí na parte de trás da praia?
– Estou, JP, mas não vejo nada…
– Olha com atenção, Dulce, e você, ISA E., olhe também…

Na vegetação por trás de JP começa por sentir-se um restolhar de gente e um som ao fundo como se fosse música, depois o som vai ficando mais elevado e mais nítido e percebe-se que é um ruído imenso de festa. O primeiro a surgir é o Brutamontes Quebra-Ossos. Com sua força descomunal traz um bar de madeira às costas atira com ele e o bar fica cravado na areia da praia, depois surgem dezenas de pessoas da vegetação, todos amigos e leitores de JP, Dulce e ISA E. Os homens trazem geleiras com bebidas frescas e rádios às costas, as mulheres, trazem saias ao estilo havaiano, colares de flores e biquínis diminutos e vêm todos a dançar e a cantar, Brasiiil, lá, lá, lá, lá, lá, lá, lá, lá… Marisete Zanon passa dançando e pulando e deixa um beijo na testa de JP marcando-o com batom, abraça-se a ISA E. e Dulce e lá vão cantando e dançando, abanando suas bundas ao ritmo da música enquanto balançam os braços para cima e para baixo. Depois chegam Marly, Bia Hain, Antônia Ivani, Claudia Fernandez, Elaine Neves, Vera, Ingritt Maiara, Sofia Toscana, Milton Alves e tantos, tantos outros amigos de ISA E.E quando o sotaque brasileiro parecia tomar conta da praia, surge do arbusto o Clã do Comboio, primeiro, a Senhora das Caralhotas, não se vê o biquíni, está tapado pela bunda e pelos enoooormes seios, depois a Senhora da Revista de Culinária, o Rapaz do Fato Cinzento, um Tipo Careca a que a gente Chama Álvaro, o VM, O RB e todos os outros dançando e pulando ao som da música. Por fim entram na fantasia os leitores de Dulce e JP e tomam conta do pedaço. Joga-se à bola, dança-se, brinca-se à apanhada e há risadas ecoando no ar. O Brutamontes Quebra-Ossos começa a distribuir caipirinhas, todos cantam e dançam e riem e fazem a festa da amizade em português, a festa da fraternidade sem fronteiras, com muita música, muita alegria, muita paz e, claro, biquínis diminutos! À medida que vão dançando, afastam-se um pouco de JP e o escritor contempla-os e pensa, Isto, sim, é um final digno da mais louca Bologonovela da Web. Nesse preciso momento, uma lágrima corre-lhe pelo olho, mas tem de ser… ele empurra a caneta para o papel e escreve… FIM!

jpv


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Por causa dA Dívida – XVIII

Caros Leitores e Amigos,

A blogonovela “Por causa dA Dívida” atingiu o cúmulo do non-sense… bem talvez não tenha sido o cúmulo…

Enfim, eu planeara com a Dulce Morais do Crazy 40 Blog escrever 18 capítulos. Acontece que cresceu entre nós e as personagens alguma competição e depois essa competição começou também a ser entre os dois autores. Uma coisa do tipo, vamos lá a ver quem é que trama quem.

Calhou-me escrever o penúltimo capítulo, o 17 e aí tentei “arrumar” a Dulce incluindo a ISA E., autora do blogue “Diário de Um Ano Bom”, na história e dando-lhe a função de escrever o último capítulo.

Claro que a Dulce trocou e-mails com ela e juntas acabaram a tramar-me no capítulo 18, aqui, depois de uma publicação de ISA E., aqui, que me retirava da escrita da história e recolocava a Dulce no comando. Ou seja, as mulheres uniram-se e pensaram que me ganharam, mas, quer a carinhosa brasileira, quer a ternurenta franco-portuguesa se esqueceram de um pormenor. O pormenor que me dará a vitória final!

Qual pormenor? Esperem umas horitas… ainda hoje será servido em bandeja de prata!


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Sequência dos últimos capítulos de “Por causa dA Dívida:



e a seguir… hahahaha…

jpv


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Por causa dA Dívida – XVII

Por causa dA Dívida – XVII

– Ventoiiiiinha!
– Sim, chefe, diga, chefe.
– Abra a porta!
– Não prefere uma janela, chefe?
– Irrraaa que é burro! Não é para arejar, sua cavalgadura, é para entrar quem bate!
– E quem é que bate, chefe?
– Irrraaa que é burro! E como é que eu sei se a porta está fechada e as pessoas estão do lado de fora?!
– Chefe…
– Sim, Ventoinha…
– E se o chefe e nomeadamente não vê e como é que sabe que são pessoas e não é pessoa?
– Bem visto, Ventoinha!
– Bem visto e com a porta fechada!
– Abra a porta, cavalgadura!

– Bom dia, Senhor Inspetor Patilhas.
– Olha quem são eles! O Marinho e a Belinha… Ventoinha, aplique o código 666.
– O Livro do José Rodrigues dos Santos, chefe?
– Irrraaa que é burro! Quero lá saber do livro de um jogador de futebol! O nosso código 666!
– Mas ó chefe e nomeadamente o número não é esse, o do livro, bem entendido, e o José Rodrigues dos Santos não é um joga…
– 666! Já!!!
– E temos um problema, chefe…
– Irrraaa que nada acontece consigo! O que é agora?
– Esqueci-me, chefe, a gente trabalha tão pouco que eu esqueci-me do código!
– Irrraaa que é burro! É uma ordem de prisão! Meta-os na cela!
– Mas, Senhor Inspetor…
– Calem-se! Aqui a autoridade sou eu…
– Chefe, e temos e nomeadamente um problema…
– O que é que foi agora?
– Só temos um par de algemas, chefe, e os suspeitos…
– Culpados!
– Certo, chefe, os suspeitos culpados são dois!
– Irrraaa que é burro! Prenda cada um a uma argola das algemas e meta-os na cela!
– Ó chefe, mas a cela não tem porta!
– Meta-os na casa-de-banho!
– E depois onde é que a gente se alivia chefe?
– Irrraaa que é chato! Meta-os na cela do Brutamontes Quebra-Ossos!
– Ó chefe, e o chefe sabe porque é que lhe chamam Quebra-Ossos…
– Faça o que eu disse!
– Ó Senhor Inspetor, não faça isso, nós somos inocentes!
– Quais inocentes, quais quê! Tenho ordens superiores para os enjaular para sempre.
– Superiores? Nem houve julgamento!
– Nem foi preciso. A Dona Dulce e o Senhor João Paulo é que mandam nisto. Ou era isso, ou passavam uma borracha na minha existência. Perceberam?
– Safados! Autores malvados! Isto é uma injustiça! Ó Senhor Inspetor, foram eles que mataram a Alice Ferrier!
– Não sei nada disso e se soubesse fingia que não sabia!
– SOCORRO! INJUSTIÇA, INJUSTIÇA!!!

– Dulce…
– Sim, JP…
– Tenho de te tirar o chapéu. Grande Plano! Pões a Belinha e o Marinho a assinar um contrato que dá plenos poderes sobre o destino deles a uma tal de Alice Ferrier que não é mais do que um pseudónimo teu, matas o pseudónimo, enfias com o casal maravilha na cadeia para a vida inteira e livras-te, perdão, livras-nos, daquelas chagas para todo o sempre. Genial!
– Estás a ver, JP, nunca me subestimes. Eu disse que resolvia e resolvi.
– Dulce…
– Sim, JP…
– Mas a verdade é que eles não cometeram o crime e vão passar o resto da vida a apodrecer ao pé do Quebra-Ossos.
– Deixa-te de lamechices, JP. Eles são só personagens. Nem sequer são de carne e osso e estavam a tentar tomar conta da nossa história e a tentar tramar-nos.
– Está bem, mas, mesmo assim, não cometeram o crime…
– Queres que eles voltem?
– Não, não!
– Então, JP, caso encerrado.
– Caso encerrado, Dulce. E o que é que lhes vais fazer? Como vais escrever o último capítulo?
– Vou optar pelo óbvio. No último capítulo vou deixá-los presos com o Quebra-Ossos, vou indemnizar todos os que eles prejudicaram e vou dar uma lição ao Huguinho e à Joaninha que são dois adúlteros sem emenda. Que me dizes, JP?
– Acho bem, Dulce, acho bem. Tenho de reconhecer que o teu plano livrou-nos de boa… olha, olha, estou aqui a receber um e-mail da ISA E., a autora do Blogue “Diário de Um Ano Bom”. É bem simpática, não achas?
– Claro que acho. É muito carinhosa e muito generosa… olha, também estou a receber um e-mail dela. Qual é o assunto do teu?
– O meu chama-se “Mudança de Planos”.
– Olha que engraçado, JP, o meu também… acho que a ISA E. nos mandou aos dois o mesmo e-mail. Lemos em conjunto?
– Lemos. No meu telefone ou no teu computador, Dulce?
– No meu computador, JP.
– Ok, abre lá isso.

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De: ISA E.
Para: Dulce Morais
Cc: João Paulo Videira
Assunto: Mudança de Planos

Caros amiguinhos portugueses,
Estou adorando essa história “Por causa dA Dívida”, é muito engraçada, repleta de aventuras, como dizemos aqui no Brasil, é uma história jóia, muito legal. Sês são uns escritores maravilhosos e fazem uma excelente dupla. Suas personagens são muito cômicas e algumas são mesmo intrigantes. Foi uma excelente idéia escreverem juntos. Sês têm todo o meu carinho. Quando for o Carnaval, podem vir ao Brasil que eu ofereço o alojamento! Tenho acompanhado o desenvolvimento dos acontecimentos. O Patilhas e o Ventoinha são fantásticos e a Belinha e o Marinho são dois errados mas tem bom coração. E aqui surge a motivação deste e-mail. Eu penso que eles abusaram um pouco da sua paciência, mas também me parece que condená-los a prisão perpétua junto com o Quebra-Ossos é um castigo demasiado pesado até porque sendo sês os autores, os defeitos deles são só o reflexo dos vossos.

Assim, meus queridos, me permiti a liberdade de tomar algumas providências. Contratei um hacker, um pirata do ciberespaço, para entrar na área de trabalho dos vossos blogues, depois pedi para ele mudar as senhas de acesso e os bloqueei para sês.

E porquê eu fiz isso? Eu, ISA E., vou ser a autora do último capítulo de “Por causa dA Dívida” e nesse capítulo farei justiça e trarei algum equilíbrio a essa trapalhada que sês chamam de história. Claro que, para proteger o capítulo, ele será publicado no meu blogue, “Diário de Um Ano Bom”.

Foi o melhor a fazer para o bem de todos! Vos deixo com muita paz e muito carinho. Sua incondicional amiga,
ISA E.

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– JP…
– Sim, Dulce…
– Não consigo aceder à área de trabalho do meu blogue!
– Nem eu do meu, Dulce…

jpv


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Por causa dA Dívida – XVI

Caros leitores,

Num estilo muito Agatha Christie, Dulce Morais acaba de limpar o cebo a uma personagem da mais louca Blogonovela da Web e depois pira-se de mansinho e deixa-me com o cadáver nas mãos! Em breve, muito breve, publicarei um surpreendente penúltimo capítulo. Para já vamos todos ao Crazy 40 Blog ler o Capítulo XVI de “Por causa dA Dívida”.


Boas leituras!


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Ouvido de Passagem…

Duas senhoras e um homem à porta de um elevador. Uma delas fala:

“Entramos os três e vamos para o quarto.”

Hehe… em que piso? Pergunto eu!


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Histórias do Autocarro 28 – Quiiiiinze

Quiiiiinze

Paragem do Autocarro 28. Estamos à espera e somos muitos. Uma fila de proporções intermináveis. Ao meu lado uma senhora baixinha, loirita, cabelo liso e pelo ombro, calças de ganga e blusa de algodão rosa.

E eis que eles chegam. Dois idosos. Daqueles alemães com o cabelo já branco, com pernas que começam no chão e terminam sabe-se lá onde, sandálias com meias, calções e a inevitável mochila às costas.

Não diziam uma palavra de português e falavam um inglês muito fraquinho. Qualquer aluno meu do ensino básico é mais fluente. A loirita, por sua vez, não dizia uma palavra de inglês e de alemão, então, é que nem deve saber que existe.

Conversa.
Começam eles, dirigindo-se para a senhora. Dobram-se como se fosse preciso encurtar distâncias para ela os conseguir ouvir:

– Please, to… Algés…

Claro que, para perceber que tinham dito “Algés”, foi precisa muita imaginação. Ainda assim, a senhora respondeu em português para alemães. E o que é isso? É português como todos nós falamos mas dito muito alto, muito lentamente e com a boca muito aberta. Ou seja, neste momento, temos dois gigantes alemães curvados sobre uma anã portuguesa que abre muito a boca, fala muito alto e diz:

– Quiiiiinzeeee… tem de aaapanhaaar o quiiiiinzeeee…
– What? Algés?
– Ai, valha-me Deus, o quiiiiinze… para Algés tem de aaapanhaaar o quiiiiinze…

E virou-se para a estrada à espera do autocarro. Os alemães voltaram a endireitar-se e a colocar a cabeça nas alturas e, claro, começaram a falar alemão. Consegui perceber que diziam que não tinham percebido nada e o melhor era verem o mapa.

Eu acho que é de uma incompetência atroz não conseguir decifrar uma palavra dita com tanta precisão, tanto cuidado e tanta hospitalidade. Afinal de contas quem é que não percebe quinze quando é tão bem traduzido para quiiiiinze?!

jpv


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Por causa dA Dívida – XV

Por causa dA Dívida – XV

– Ventoiiiiiiiinha!
– Sim, chefe, diga, chefe…
– Vá abrir a porta!
– Ó chefe, a porta está aberta, chefe, tá aqui na minha mão… ó, tá a ver? aberta, fechada, aberta, fechada…
– Ventoiiiiiiiinha! Seu cabeça de burro! A porta da rua, homem, vá abrir a porta da rua!
– Ó chefe, e o chefe não acha que é perigoso?
– Perigoso?!
– Pois, chefe, ficarmos com a porta aberta.
– Irrraaa que é burro! Está alguém a bater à porta da rua! Vá abri-la!
– E desculpe, e não ouvi, chefe, e estava e nomeadamente e a ouvir música no aifóne…
– No quê?
– Eu explico, chefe, primeiro foram as cassetes…
– Cale-se! Deixe lá isso e vá abrir a porta!
– Sim, chefe, certo, chefe…

***

– E olha, e nomeadamente, e quem é ele! Como vai senhor João Paulo Videira?!
Vou bem, senhor inspetor Patilhas, e o senhor?
– Vou a investigar! E é para isso que me pagam, certo?
E investigou o que eu pedi?
– Ó senhor autor, nós e nomeadamente e até investigámos e nomeadamente e até usámos tecnologia de ponta, o aifóne, por exemplo!
O quê?! O que é que tem a ver o… esqueça! Será que quis dizer i-phone?
– Na… isso é coisa estrangeira, aqui o Patilhas é pelo produto português. Acontece que a mulher não existe. Nem sombra, nem rasto, nem nada… Alice Ferrier é alma que não veio ao mundo!
Tem a certeza, senhor inspetor?
– Tanta certeza quanto a pata direita do cavalo de D. José ser a esquerda!
Obrigado, senhor inspetor.
– Até mais ver, senhor escritor! Ventoiiiiiiiinha!
– Sim, chefe, diga, chefe…
– Vá fechar a porta.
– Qual porta, chefe?
– Irrraaa que é burro!

***

– D..
– Sim, JP…
– Estou preocupado…
– Não te preocupes…
– Hã?!
– Eu sei quem ela é!
– Hei, como é que sabes o que me preocupa?!
– JP, vais no comboio a escrever ao meu lado o próximo capítulo da Blogonovela…
– Tu espreitaste?
– Sim, JP e…
– E…
– O Patilhas não encontrava um elefante mesmo que estivesse a ser pisado por ele… que ideia foi essa de lhe pedir ajuda?
– Sei lá, afinal de contas o homem é inspetor.
– JP…
– Sim, D…
– Eu sou a Alice Ferrier!
– Hã?!
– JP, já reparaste que nos últimos capítulos passas o tempo com a boca aberta a dizer hã?
– Hã?!
– JP, Alice Ferrier é um pseudónimo meu. Quando te mostrei o texto que publicaste no teu blogue, não te revelei logo que era eu a verdadeira autora para não influenciar o teu julgamento.
– Mentiste-me, Dulce!
– Não. Só não revelei um facto. Isso pode ser omitir, mas não é mentir…
– Mas, assim… assim..
– Assim… temos de ser cuidadosos e discretos, mas a verdade é que temos a Belinha e o Marinho na mão. Eles assinaram um contrato com a Alice Ferrier para ela acabar de escrever a história deles com TODA a liberdade e eu sou a Alice Ferrier…
– D…
– Sim, JP….
– Mas a Belinha encontrou-se com a Alice Ferrier e a Belinha conhece-te, como é que fizeste?
– Simples… lembras-te do Clã do Comboio, certo?
– Como podia esquecer-me, Dulce, fui eu que os juntei a todos, fui eu que os criei, são nossos amigos… mas o que é que o Clã tem a ver com esta trapalhada de história?
– Simples… marquei o encontro com a Belinha, escrevi o contrato e pedi à nossa amiga, a Senhora da Revista de Culinária, para se encontrar com ela…
– Estás maluca? Já viste o risco?
– Resultou, não resultou?
– Sim, finalmente boas notícias. Agora podemos acabar a história em paz sem as personagens se estarem sempre a intrometer.
– Exatamente!
– D…
– Sim, JP…
– Obrigado.
– De nada, JP. Até amanhã!
– Até amanhã!

***

Olá Amor!
– Olá Amor!
Então, como foi o teu dia?
– Bom. E o teu?
No trabalho foi cansativo, mas a viagem de regresso foi divertida. Vim com a Dulce a terminar a Blogonovela. Acho que finalmente dominámos as personagens.
– Olha, Môr, conversamos depois. Está uma pessoa na sala à tua espera. Já cá está há uns 15 minutos.
Quem?
– Não sei, é muito simpática, mas limitou-se a dizer que era uma colega de trabalho tua. Achei muito esquisito porque é tua colega, mas, pelos vistos, não fala português… vai lá despachá-la para irmos jantar…

***

Boa tarde! O meu nome é João Paulo Videira. Esteja à vontade. Com quem tenho o prazer de estar a falar e… em que posso ser útil?
– Bonsoir, monsieur, c’est un plaisir de vous connaître finalement. Mon nom c’est Alice Ferrier…

jpv


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Citação Porque Me Apetece

“Tragam o milho que eu faço pipocas!”
jpv


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Histórias do Autocarro 28 – Saciada

Saciada

Isto que agora se escreve não é bem uma história. É mais um apontamento. A coisa passou-se em fracções de segundo. Quer dizer, também não foram bem fracções de segundo. Foram uns instantes. Instantes curiosos e de tal forma interessantes que dariam um romance. Como não tenho tempo para o romance, fica o apontamento.

Ultimamente faço o percurso do autocarro 28, entre Santa Apolónia e o Cais do Sodré, de metro. Depois, num eléctrico ou num autocarro qualquer sigo até à Infante Santo. Apanho o primeiro que chegar. Torna-se mais rápido e diversificado e sempre obriga a algum exercício físico. O instante que vou contar-vos, passou-se no eléctrico 18 ainda não eram 9 da manhã.

Entrámos e o eléctrico ficou composto mas longe de estar a abarrotar. Isto é importante porque significa que o campo de visão e observação estava desimpedido. Num banco de dois lugares, daqueles que estão colocados lateralmente, ou seja, virados para o corredor do eléctrico, sentou-se uma moça. Era jovem. Muitíssimo atraente. Cabelos escuros, lisos e longos, pelo meio das costas. A tez clara e os olhos muito azuis. Tinha um discreto piercing num sobrolho e os lábios eram bem definidos, em V ao meio. Casaco de camurça e calças de ganga muito justas e coladas às pernas de formas sensuais. Os homens que entraram com ela repararam naquela beleza, mas, após a primeira espreitadela de relance, desviavam o olhar para não parecerem muito vorazes, nem estarem a incomodar a moça com olhares directos. De maneira que ia ali um ambiente de “quero mas não faço” que era absolutamente indisfarçável e um tanto constrangedor. Por motivos que davam uma tese, mas não aprofundaremos, nenhum homem se sentou ao lado dela. Fosse para não parecer atrevido, fosse porque uma beleza assim pode intimidar os mais ousados, ela seguiu sozinha até à primeira paragem depois do Cais do Sodré rodeada de homens que queriam olhar para ela mas não eram capazes de mais do que uns relances disfarçados.

Na paragem, entrou um jovem aí dos seus 30 anos, estatura mediana, cabelo escuro, curto, porte atlético comprovado pelos músculos que lhe moldavam as calças de ganga justas. Tinha um casaco preto de cabedal, cintado. Outros músculos se notavam bem colados às calças, com formas definidas e a prometer solidez. Eram os do rabo. O moço poisou um saco de desporto no chão e rodou sobre si para sentar-se no lugar vago ao lado da moça. Ora, quando rodou, houve ali uns instantes em que o seu atlético e firme rabo esteve de frente para a moça que olhava em frente, para um ponto indeterminado, como fazemos todos nestas situações. E foi aí que ela nos surpreendeu. Abandonou o olhar no vazio, fixou-o no rabo que rodava à sua frente, encheu a vista, tirou-lhe bem as medidas, e quando o rapaz já se sentava, ela fechou os olhos devagarinho e ao abri-los já tinha um sorriso nos lábios.

Os homens que tinham estado ali à volta a fingir que não a viam, a evitar olhar para ela, a lançar-lhe relances despercebidos, ficaram desarmados e a pensar em conjunto:
– Ora toma, a malta com pruridos e ela saciou-se!

jpv


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Histórias do Autocarro 28 – Ai, desculpe, desculpe, desculpe…

Ai, desculpe, desculpe, desculpe…

De todas as histórias que escrevi até agora sobre o Clã do Comboio e o Autocarro 28, esta é a primeira que envolve contacto físico… à farta.

Importa saber entre quem foi o dito contacto. Ora, nem mais nem menos do que entre a minha pessoa e uma passageira… Para ser mais exacto, entre a passageira e eu que, na verdade, fui ampla e generosamente abraçado.

A história não se passou no 28, mas tudo começou com ele. Chegou depois! Em vez de se ir no 28 de Santa Apolónia à Infante Santo, pode apanhar-se um autocarro expresso, assim chamado porque só faz uma paragem, que vai de Santa Apolónia ao Cais do Sodré. Daí à Infante Santo qualquer um serve e há muitos. Em dias de muito movimento pode ser bem útil.

Um dia destes, apanhei o expresso e quando cheguei ao Cais do Sodré apareceu o eléctrico 15. E foi aí que a coisa se deu. Já quase não havia espaço, todos os lugares sentados e em pé estavam ocupados e as pessoas seguiam literalmente enlatadas. Lá encontrei um buraquinho e entrei julgando que era o último. Atrás de mim entrou uma moça que não sei como se conseguiu encaixar, sei, contudo, que entrou, apertou-se entre os que estavam e ficou… sem ter onde se agarrar. Era baixa, cabelo escuro, farto e encaracolado, olho castanho. Tinha um ar simpático e claramente envergonhado. Do pescoço para baixo não sei como era porque não dava para ver além do que estava atrás de mim.

Ora, o eléctrico pára de uma forma um bocadinho mais brusca do que o autocarro e quando o fez, logo na primeira paragem, a moça agarrou-se abraçando-me e como me viu olhar para trás por cima do ombro, disse:
– Ai, desculpe, desculpe, desculpe…
Eu desculpei. É, de resto, uma forma diferente de começar o dia. Um homem acorda, sai à rua e é generosamente abraçado por uma moça bonita. O dia não estava a começar mal, portanto. Ora, importa referir que os eléctricos não só travam, como arrancam. E quando arrancam produzem o mesmo esticão só que no sentido oposto. A moça, de equilíbrio perdido, agarrou-se de novo ao meu tronco, muito agarradinha e lá foi dizendo ruborizada, quase a explodir de vergonha:
– Ai, desculpe, desculpe, desculpe…
A bem dizer, não havia nada a desculpar. Homem que é homem, por vezes faz o serviço público de ajudar uma senhora em dificuldades. E não tem de ser velhinha! Acho que nas contas do Criador as boas acções praticadas com jovens bonitas também qualificam.

No meu caso, o Criador, sendo bom avaliador das humanas acções, deveria ter-me contabilizado na caderneta seis delas e a razão é fácil de perceber. Entre o Cais do Sodré e a Infante Santo há três paragens, Conde Barão, Santos e Cais da Rocha, pelo que a uma travagem e um arranque cada, resultou em seis generosos e intensos abraços sempre seguidos de Ai, desculpe, desculpe, desculpe…

Numa das vezes, ainda tentei pô-la à vontade e de bem com a consciência:
– Deixe lá, não se preocupe, eu vou partir do princípio de que não está a fazer de propósito!
– E não estou. Pode crer que não estou!
Aqui, neste exacto momento, o meu ego desfaleceu um bocadinho, mas logo despertou de novo. É que ela ainda não tinha acabado aquelas palavras e já estava dizendo estas outra vez:
– Ai, desculpe, desculpe, desculpe…
Verifiquei se ainda tinha a carteira e voltei a sorrir.

jpv