Mails para a minha Irmã

"Era uma vez um jovem vigoroso, com a alma espantada todos os dias com cada dia."


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Crónicas de Maledicência – O Sorteio do Ano

Crónicas de Maledicência – O Sorteio do Ano

Muito engenhosa esta ideia emanada do Ministério das Finanças de sortear faturas de consumo atribuindo prémios que podem ir desde descontos no IVA, no IRS, até prémios pecuniários no valor de dez milhões de euros. A intenção é, claro está, incentivar as pessoas a pedir fatura.

Ou seja, se, até agora, a fila nas finanças era para entregar declarações ou fazer pagamentos, a partir do próximo ano haverá também filas para meter a fatura-milhões e levantar prémios. Por isso, caro leitor, se vir alguém sair da repartição de finanças do seu bairro com uma torradeira debaixo do braço, não estranhe, não há engano nenhum. É um premiozinho ou alguém a reclamar dentro do prazo de garantia.

Os comerciantes é que andam de sobrolho franzido. É que os portugueses andavam a não levar isto das faturas a sério e já um ou dois tinha sido visto a pagar um café sem pedir fatura. Casos raros mas, que, infelizmente, acontecem. Pois agora acabou a mama do branqueamento. Português que é português e sério, pede e guarda a fatura!

A medida tem diversas vantagens, uma delas é contribuir significativamente para diminuir o desemprego e melhorar a economia. É que vão ser precisas mais pessoas a trabalhar nas finanças e, para poderem organizar as faturas em casa, os portugueses vão comprar dossiês, micas, separadores, agrafadores, furadores, canetas, lápis, computadores para calcular apostas múltiplas, enfim, haverá todo um agitar que só fará bem à economia nacional. Tantos problemas e afinal a luz surge ao fundo do tunel na ponta de uma fatura!

A culpa disto tudo, culpa da boa, claro está, é da Igreja Católica por mão da sacrossanta Casa da Misericórdia que enfiou com o vício do jogo nos portugueses de tal forma que nem a douta e sempre certa  e totalmente isenta de falhas repartição geral de finanças lhe escapou. Se os padres não andassem aí a fazer dinheiro com o jogo, os comerciantes agora podiam continuar a fugir aos impostos. Assim, tudo vai mudar. Para melhor claro está! 

Eu cá estou curioso. Imaginem que a coisa pega e passa também para a lotaria popular. Parece que já estou a ver o senhor do fato a cantar:

Cinqueenta e dois mil trezeeeentos e vinte e seeete: meeenos duzeeentos euros no iiiiva!

Se não fosse por nenhuma outra razão, pelo menos por esta, já estou rezando para que o Orçamento Geral do Estado seja aprovado. E os senhores do Constitucional, que estão sempre a embirrar, fazem o favor de estar quietinhos porque a independência financeira de uma pessoa joga-se nestas oportunidades! Mai nada.

Tenho dito.
jpv


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Crónicas de Maledicência – As Cartas Estão na Moda


Crónicas de Maledicência – As Cartas Estão na Moda

Pode um homem esforçar-se o que quiser, aplicar-se e trabalhar tudo o que quiser que, a verdade, verdadinha, é que quem pode, pode, quem não pode, arreia.

Tentamos motivar os alunos para o discurso epistolográfico de primeira pessoa, escolhemos cartas interessantes como exemplo, mostramos powerpoints, fazemos discursos entusiastas e… nada… nem um piscar de olhos… Dizemos aos pais para comunicarem connosco, que, ao menos, assinem a caderneta e mandem um recadinho por lá a dizer se receberam certa informação e… nada… nem um piscar de olhos. Ninguém quer saber de cartas para nada.

Até ao momento em que dois senhores, por motivos diferentes, em países diferentes, se põem a escrever uma carta, mais ou menos esperada e, até, em certos aspetos, mais ou menos óbvia, e o que é que acontece? Telejornais e comentadores até às duas da manhã, primeiras páginas, internet atulhada de referências. E eram estas cartas especiais? Quer dizer, ser, eram. Todas o são, caso contrário, quem as escreveu não se tinha dado ao trabalho. Mas também não é como se revelassem algo que já não soubéssemos todos!

A carta/comunicado que Snowden escreveu ao Presidente Obama é tão óbvia que o próprio nem reagiu. Então ele revela ao mundo e acusa o Presidente de andar a espiar a Europa? E o que é que isso tem de novo? Quem é que não sabia ainda? Se é por causa destas revelações que os americanos andam a ver se deitam a mão ao Snowden, então deixem-no em paz que o tipo é uma autêntica fraude, não tem mesmo nada de novo para revelar. Em todo o caso, a sua carta/comunicado teve uma virtude reveladora. Acabou de vez com a guerra fria! Ah pois é! Foi ontem que se enterrou o fantasma da guerra fria. Eu, que vivi o auge das ameaças nucleares e as tensões e as competições e as ameaças de boicotar Jogos Olímpicos, ouvi ontem, com estes dois que a terra há de comer, o Presidente da Rússia a chamar amigos ao americanos! Ele referia-se a Snowden e dizia, “Pode cá ficar se parar com estas brincadeiras e deixar de se armar em engraçadinho, caso contrário, procure outro país porque nós respeitaremos os nossos amigos americanos” Eh pá, iam-me vindo as lágrimas aos olhos…

Por falar em cartas, Vítor Gaspar, pouco dado a narrativas, homem mais dedicado aos gráficos e ao Excel, deixou-se de numerologias, mudou de software, atirou-se ao processador de texto e escreveu uma carta. Tal como a de Snowden, também ela tinha informação óbvia. Gaspar diz que se enganou. Pois, andam a dizer-lhe isso há muito tempo. Gaspar diz, por outras palavras, que não tinha o apoio do Governo. Pois, já o tínhamos visto muito sozinho, as bases dos partidos da coligação a desautorizá-lo, enfim, nada de novo. Gaspar diz a Passos Coelho que está na hora de investir. Anda tudo o que é analista, economista, politólogo e cidadão comum a dizer a mesma coisa há meses, anos, até. Então, porque é que a carta ocupou tanto tempo de antena? Básico, simples e justificadíssimo motivo: a carta de Vítor Gaspar faz emergir Maria Luís Albuquerque! O leitor não sabe quem é mas vai descobrir já na próxima declaração de IRS! É uma espécie de Vítor Gaspar, mas sem olheiras e de saias! Era o braço direito do próprio! E é isso que me intriga. Se o braço esquerdo não servia, porque serve o direito? Mas, enfim, nada de juízos precipitados. Dê-se, por agora, o benefício da dúvida, a ver se os tipos da Troika nos dão o benefício da dívida! E deixemos trabalhar a Senhora Ministra que a espera tarefa ciclópica.

Posto isto, esperemos ávidos pelas próximas cartas. É que pelo andar da carruagem, cheira-me a ter pegado moda.

Com a mais elevada estima e consideração,

Maputo, tantos do tantos

João Paulo Videira