Mails para a minha Irmã

"Era uma vez um jovem vigoroso, com a alma espantada todos os dias com cada dia."


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Crónicas de África – Eleições Autárquicas

Crónicas de África – Eleições Autárquicas

Hoje é dia de eleições autárquicas em Moçambique. Contudo, apesar disso e do título desta crónica, se esperava um texto político, desengane-se. O que nos move é a matéria social.

Não faremos comparações entre Moçambique e Portugal para mostrar que um é melhor do que o outro. Esse é um caminho que não nos interessa. Esse não é um caminho. Faremos comparações para percebermos as diferenças profundas que existem no encarar de um fenómeno aparentemente igual.

Ora, vamos às tais diferenças e o leitor faça os restantes juízos de valor por si mesmo.

O Dia
O dia de eleições, em Portugal, há muito que é ao domingo, ou seja, é num dia de descanso que se pratica o ato de cidadania de votar. Em Moçambique, esse ato, porque se quer útil, pratica-se num dia útil. Excetuando os serviços que não podem mesmo paralisar, polícia, exército e médicos, todos os outros, enfim, quase todos, paralisam no dia de eleições. Por exemplo, imagine-se isto em Portugal, os supermercados e os hipermercados encerram. Num dia útil. Que os moçambicanos querem útil e esperemos seja.

Caça ao Voto
Em Moçambique a expressão caça ao voto não é pejorativa, ou seja, não designa um político que vai para o terreno prometer fingidamente mundos e fundos com o intuito único de angariar votos. Em Moçambique, os jornalistas e as pessoas usam a expressão caça ao voto de uma forma natural significando uma ação de campanha em que um candidato vai para o terreno contactar com as populações. Assim, o telejornal pode abrir com a frase “Fulano de tal saiu hoje à rua para a caça ao voto” e isso não constitui uma crítica ou um juízo de valor pejorativo. É só a constatação de que ele está em campanha junto dos eleitores.

A Marca
No dia da votação, os eleitores dirigem-se às mesas de voto, tal como em Portugal, mas não vêm de lá como em Portugal. O ato de votar inclui colocar o dedo numa esponja com tinta indelével assinalando que aquele eleitor não pode apresentar-se de novo às urnas. A consequência mais interessante é que as pessoas, após votarem, exibem orgulhosamente a sua marca como que assinalando o facto de terem cumprido o seu dever cívico.

Número de Municípios
Portugal tem 308 municípios. Moçambique tem 53. De Maputo (Sul) a Nampula (Norte) é como de Lisboa a Düsseldörf. Portugal tem 10 milhões de habitantes. Moçambique tem 23.


Programas e Promessas
E aqui reside a principal diferença. Aquela que é, afinal, a principal razão desta crónica. O teor das promessas e dos discursos eleitorais é profundamente diferente. Em Portugal é já muito abstrato e, nesse, sentido, muito prudente. É generalista. Cabe lá tudo e pode não caber lá nada. Por outro lado, as eleições autárquicas, em Portugal, têm uma dimensão nacional que lhe é atribuída sobretudo pelos Média. Em Moçambique, as autárquicas não têm amplitude nacional. São mesmo autárquicas, municipais, regionais. O que conta é o trabalho de cada candidato naquela região e as leituras partidárias de amplitude nacional esbatem-se. Os programas e as promessas que resultam deles são muito concretos, muito específicos, o que resulta na possibilidade de haver uma avaliação muito visível do trabalho do edil. Vamos a exemplos. Em Portugal pode prometer-se melhorar equipamentos sociais, aqui promete-se umas casas de banho num determinado mercado. Em Portugal promete-se melhorar a rede de transportes, aqui promete-se uma carreira específica de transporte público entre dois bairros e identificam-se quais. Em Portugal promete-se melhorar as vias de circulação, aqui promete-se uma estrada que vai de tal ponto a tal ponto. Em Portugal promete-se melhorar as infraestruturas de saneamento básico, aqui promete-se fornecimento de água para o bairro tal e identifica-se especificamente qual.

Eu diria que a política portuguesa está mais abstrata e mais depurada, mais estéril, mas, por outro lado, mais abrangente. Em Moçambique a política está num estado mais puro e concreto, numa relação de “dou para que dês”, à maneira romana, entre eleitor e candidato.

O dia está a decorrer com grande civismo e tranquilidade. Nem outra coisa seria de esperar de um povo que tanto batalhou pela Paz e que a preservará a todo o custo. E, como se diz na gíria da bola, que ganhe o melhor!
jpv


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Crónicas de Maledicência – O Alucinante Domingo Português



Crónicas de Maledicência – O Alucinante Domingo Português 

Desporto Alternativo

Em dia de autárquicas, logo, com o país encerrado para obras, dois jovens resolveram não exercer o direito de voto e fizeram muito bem.

Pela primeira vez na história do desporto nacional, um jovem vence um torneio de ténis do ATP World Tour. Ou seja, João Sousa, de seu nome, venceu o torneio de Kuala Lumpur e para tal teve de ganhar aos melhores dos melhores. Ora, se a vitória na final sobre o francês Julien Benneteau é significativa, mais importante se torna porque, para chegar à final Sousa deixou pelo caminho, nos quartos de final, um dos monstros do ténis mundial, o nº4 do ATP, David Ferrer.

Outro português em destaque foi Rui Costa que venceu o campeonato do mundo de ciclismo em estrada. Costa já vinha trilhando o caminho do sucesso ganhando etapas no Tour de França e alguns circuitos importantes. Acontece que nada disso se iguala ao que hoje aconteceu: conquistar um título mundial!

Afinal, as alegrias desportivas chegam das modalidades com menos cobertura. Foi um domingo histórico para Portugal.

As minhas autárquicas
É claro que são muito significativas as vitórias de António Costa e Rui Moreira em Lisboa e no Porto, como é muito significativo o sinal que o povo português deu à governação. O facto é que o PS, maior partido da oposição, teve o dobro da votação que o PSD, maior partido da coligação governamental. É um sinal de mudança. Haverá que saber interpretar esse sinal e fazer as correções correspondentes. Em democracia, deveria ser assim.

Outra nota interessante é o sucesso de candidatos independentes. Parece que a mensagem de acabar com mais do mesmo, chamando mais do mesmo ao sistema partidário implantado criando-lhe alternativas, começa a passar. Será interessante ver onde isto vai dar no futuro.
De qualquer modo, as minhas autárquicas são outras. É essa a magia destas eleições. São os resultados das terras que me dizem alguma coisa ou onde tenho amigos. Ali pela região de Santarém, nomeadamente, em Torres Novas, Alcanena, Entroncamento, Golegã, o PS cilindrou. Tenho amigos entre vencedores e derrotados. A todos formulo votos de bom trabalho, felicitando, em particular, os vencedores pelos resultados obtidos que, regra geral, foram muito expressivos. E depois havia o Funchal onde estavam companheiros de outros tempos, o Paulo Cafôfo e a Marília Azevedo com uma estratégia arrojada de uma ampla coligação na união de esforços para a mudança. E a mudança aconteceu. Parabéns e votos de um excelente trabalho.

Pronto, terminou o alucinante domingo português. Visto daqui, à distância apaixonada de quem procura cá longe outros caminhos, outras soluções e se vai rendendo a outras paixões. Boa semana, Portugal.
Tenho dito!
jpv