Mails para a minha Irmã

"Era uma vez um jovem vigoroso, com a alma espantada todos os dias com cada dia."


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De Negro Vestida – XL

 

De Negro Vestida – IV

Para Maria de Lurdes, os viúvos apresentavam a inegável vantagem de já terem vivido uma relação sem que o seu fim tivesse sido o fracasso e a ruptura dos divorciados e sem que deles pudesse falar-se de inexperiência como em relação aos solteiros. O problema emergente dos viúvos poderia ser a idade. Um viúvo para ser viúvo, teria de ter sobrevivido à morte da esposa. Ora, a menos que o falecimento resultasse de acidente ou doença inesperada, a morte que os separaria teria surgido em idade avançada.

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O Romance “De Negro Vestida” foi publicado, capítulo a capítulo, neste blogue, entre 26 de janeiro de 2010 e 22 de abril de 2011.

Agora que conhecerá outros voos, nomeadamente, a publicação em livro, deixamos aqui um excerto de cada capítulo e convidamos todos os amigos e leitores a adquirirem o livro.

Obrigado pela vossa dedicação.

Setembro de 2013

João Paulo Videira

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De Negro Vestida – XXXIX

 

De Negro Vestida – III

Maria da Graça Martins, Gracinha entre as poucas amigas que lhe foi permitido ter em tardes de chá e biscoitos sortidos saídos de caixas de lata redondas para pires de porcelana, está no hospital e desta vida que lhe coube viver restam-lhe poucos dias. Ela sabe-o. Mas não se assusta. Bem pelo contrário. Sente uma pontinha de esperança e um resquício longínquo de satisfação. A esperança vem-lhe de saber que, seja a morte o que for, para si será sempre uma terceira oportunidade de viver já que as duas que teve antes esvaíram-se no despotismo do pai e na absurda austeridade do marido.

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O Romance “De Negro Vestida” foi publicado, capítulo a capítulo, neste blogue, entre 26 de janeiro de 2010 e 22 de abril de 2011.

Agora que conhecerá outros voos, nomeadamente, a publicação em livro, deixamos aqui um excerto de cada capítulo e convidamos todos os amigos e leitores a adquirirem o livro.

Obrigado pela vossa dedicação.

Setembro de 2013

João Paulo Videira

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De Negro Vestida – XXXVIII

De Negro Vestida – II

Duas preocupações trazem o espírito de Maria de Lurdes num autêntico frenesim. Que tipo de homem procurar e onde encontrá-lo. Quando elencou mentalmente as características do seu tipo ideal, percebeu de imediato que teria de fazer cedências. O criador nunca se dera ao trabalho, pelo menos que ela soubesse, de produzir semelhante criatura. Meigo, gentil, inteligente, sensível, com sentido de humor, excelente conversador mas não monopolizador do diálogo, ouvinte atento, trabalhador, honesto, fiel, verdadeiro, arrumado e asseado, doce na linguagem e espirituoso sem chegar ao boçal, com bom gosto, financeiramente desafogado, culto e solteiro. E foi quando pensou em solteiro que o seu cérebro parou.

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O Romance “De Negro Vestida” foi publicado, capítulo a capítulo, neste blogue, entre 26 de janeiro de 2010 e 22 de abril de 2011.

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Obrigado pela vossa dedicação.

Setembro de 2013

João Paulo Videira

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De Negro Vestida – XXXVII

 

De Negro Vestida – I

Quando pensamos acerca de que morte escolheríamos, se o pudéssemos fazer, normalmente optamos pelo menos mau e nunca pelo bom. E a razão é simples, não associamos a morte ao bom. Vai daí escolhemos soluções sem dor nem sofrimento e raramente nos lembramos de encomendar ao criador uma morte como a que teve Manuel Matos Vasques que morreu a fazer amor. Bem, se quisermos ser precisos, talvez não tenha sido a fazer amor, pois não consta que a prostituta que se levantou do seu leito de morte sem dar pelo sucedido tivesse experienciado outro sentimento que não a impaciência para que acabasse ele o que estava fazendo e havia pago previamente. E acabou. Acabou o que fazia e acabou ele.

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Obrigado pela vossa dedicação.

Setembro de 2013

João Paulo Videira

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De Negro Vestida – XXXVI

 

Despertar – X

Maria de Lurdes encontrara uma pessoa-despertador! Não são tão comuns quanto essenciais. Pode ser alguém que nunca conhecemos, pode ser alguém que já conhecíamos mas aquém não dedicáramos ainda atenção ou tempo. Estas pessoas salvam-nos da morte em vida. Acordam-nos e mostram-nos que há mundo para além do mundo, consciência para além da consciência, moral para além da moral, amor para além do amor, alma para além da alma. São pessoas que nos despertam as convicções adormecidas, que nos lembram caminhos esquecidos, que nos mostram pormenores da paisagem múltipla, que nos amam, que nos odeiam, que nos querem ou a quem queremos, são sempre pessoas a que não somos indiferentes.

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Setembro de 2013

João Paulo Videira

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De Negro Vestida – XXXV

 

Despertar – IX

A noite vai longa. A madrugada anuncia-se. Estamos à porta do prédio onde mora Maria de Lurdes. Do outro lado da rua pára um carro e as luzes dos travões projectam em volta um clarão encarnado. Abre-se uma porta. Sai do carro uma mulher com entusiasmo no olhar. Está feliz. Atravessa a estrada, passa por nós sem nos dizer nada porque não quisemos ser vistos. Sobe a escada e enquanto o faz remexe a mala de onde emergem as chaves. Abre a porta e reza para que nenhum dos filhos esteja a pé. Não estava. Dirige-se ao quarto, vai direita à cómoda. Baixa-se e abre a gaveta do fundo. Por baixo de uns lençóis estampados está uma caixinha de jóias com alguns pequenos objectos que aí foi guardando por serem especiais. Tem entre as mãos um cartão de visita com o canto superior direito dobrado. Guarda-o com carinho na caixinha e, pelo sorriso que tem a iluminar-lhe a face, sabemos que guardará em si a memória de quem lho deu.

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O Romance “De Negro Vestida” foi publicado, capítulo a capítulo, neste blogue, entre 26 de janeiro de 2010 e 22 de abril de 2011.

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Obrigado pela vossa dedicação.

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João Paulo Videira

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De Negro Vestida – XXXIV

 

Despertar – VIII

Veremos em breve em que palavras, em que emoções e em que gestos vai desembocar esta noite. Se tiver de ser em corpos entregues às conversas da sedução, dos suores gemidos e afagados pela doçura dos gestos, então será. Serão a noite a as pessoas nela a ditá-lo que nós não inventamos estórias, limitamo-nos a contá-las tal como aconteceram.
António Pedro foi como só sabia ser. Absolutamente natural, confrangedoramente franco na atitude e aberto nas palavras. Falou como se nada tivesse a esconder, como se a conhecesse há muitos anos e com ela pudesse partilhar tudo. Falou-lhe do seu trabalho, do que gostava nele e do que nele lhe desagradava, mostrou-lhe as suas ambições, os pontos fortes do seu carácter e falou-lhe também dos fracos, fazendo uma inflexão de voz, tornando-a mais grave e pausada como que a querer que ela acreditasse nele, sobretudo nas fraquezas. Maria de Lurdes estava espantada com aquela abertura e com aquela naturalidade e pensava de si para consigo Este homem não precisa proteger-se? e estava entre este pensamento e a tentativa de o acompanhar no discurso quando foi de novo surpreendida. Ele falou-lhe da família. Da mulher que amava, dos filhos, três, que eram a razão da sua existência.

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O Romance “De Negro Vestida” foi publicado, capítulo a capítulo, neste blogue, entre 26 de janeiro de 2010 e 22 de abril de 2011.

Agora que conhecerá outros voos, nomeadamente, a publicação em livro, deixamos aqui um excerto de cada capítulo e convidamos todos os amigos e leitores a adquirirem o livro.

Obrigado pela vossa dedicação.

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João Paulo Videira

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De Negro Vestida – XXXIII

 

Despertar – VII

É um problema de perspectiva. De atitude. De sensibilidade. Querendo um homem conquistar uma mulher, confunde frequentemente este conquistar com sexo. Constrói para ela um conjunto de dicas, de expressões indirectas do seu desejo, de sugestões, de brincadeiras e até de elogios que, em menos de nada convertem o sexo no centro da questão, o objectivo em si, o tema de conversa recorrente. Este homem ainda não percebeu. Não percebeu que não é assim. Não percebeu a mulher que tem na frente e, de facto, não percebeu nada. Para uma mulher, o sexo não é, nunca, o centro da questão e do processo. Não é menos importante por isso. Pelo contrário. O sexo é, para as mulheres, de suma importância e é por isso que não pode ser imediato.

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O Romance “De Negro Vestida” foi publicado, capítulo a capítulo, neste blogue, entre 26 de janeiro de 2010 e 22 de abril de 2011.

Agora que conhecerá outros voos, nomeadamente, a publicação em livro, deixamos aqui um excerto de cada capítulo e convidamos todos os amigos e leitores a adquirirem o livro.

Obrigado pela vossa dedicação.

Setembro de 2013

João Paulo Videira

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"De Negro Vestida" está de volta!

Caros leitores e amigos,
depois das férias e da publicação do Diário de Bordo que delas resultou, retomarei a publicação de “De Negro Vestida”.

O romance evoluiu bastante e traz muitas novidades quer no conteúdo quer na forma e ritmo de narração. Acontece que as férias sempre fazem esquecer um pouco as coisas e por isso mesmo venho dar-vos três informações relacionadas com a continuidade do texto.

1) Aqui por baixo republico, para que possam reler sem ter de procurar, o último capítulo publicado em Julho.
2) À vossa direita colocarei um índice do romance que passará a estar por cima do arquivo do blogue. Assim, a busca de capítulos anteriores tornar-se-á mais fácil.
3) Entre hoje e amanhã, retomarei a publicação de novos capítulos, fresquinhos e, espero, surpreendentes.

Faço votos de que gostem e deixem sempre os vossos comentários seja aqui, seja via mail.
Um abraço,
João Paulo

De Negro Vestida – XXXII
Despertar – VI

Maria de Lurdes regressou à sua mesa no passo mais firme que conseguiu. Ainda não sabe mas o encontro com António Pedro não terminou. Assim que chegar junto das colegas fará um ricochete, um caprichoso arco de bumerangue e regressará à promissora conversa com um sorriso nos lábios.
Que estás aqui a fazer Lurdinhas? Pareceu-nos que a conversa estava agradável ali com o jeitoso do fato azul. E estava, mas seria incapaz de deixar-vos. Afinal de contas este jantar é uma simpatia vossa em minha homenagem. Olha, Lurdinhas, em primeiro lugar, este jantar era para veres gente. Agora que viste, não faz sentido estares aqui. Em segundo lugar, nem compreendemos como é que trocas o jeitoso por nós. Nenhuma de nós hesitaria em fazer a troca ao contrário. E, por fim, deixa-me dizer-te uma coisa. Estamos curiosíssimas em relação àquela conversinha que tiveste ali, mas preferimos ouvir amanhã uma estória inteira do que ouvir já só meia estória… Então vocês não se importariam… É que ele de facto convidou-me para tomar café… Lurdinhas, não vivas a vida pela metade. Senta-te. Acaba o jantar. E corre para o desconhecido. Neste caso o desconhecido tem muito boa figura!
E foi isso que fez. Quando se sentou, piscou o olho por instinto na direcção da mesa do homem de fato azul que respondeu com um sorriso. Estava combinado. Palavras não foram precisas. E continuaram a não ser precisas quando se levantou para cobrar a promessa de café e as outras todas que vinham embaladas no olhar e no sorrir. Ele percebeu e levantou-se também. Não a quis a atravessar a sala sozinha pela segunda vez. E veio ao seu encontro. E a meio do caminho se encontraram.
– Então, Maria de Lurdes do olhar brilhante, já tomou café?
– Ainda não, António Pedro do sorriso promissor. Prometeu-me um café, venho cobrá-lo.
– E as suas colegas?
– As minhas colegas quase querem mais do que eu que tome café consigo.
– Muito simpáticas. Merecem uma recompensa.
António Pedro chamou o empregado de mesa e disse-lhe, tratando-o pelo nome, que oferecesse um café e um porto às senhoras.
Por cima do olhar, António Pedro tinha uma cabeleira farta e encaracolada que lhe dava um ar de certa irreverência e lhe tirava anos ao aspecto. As mãos eram largas e a voz grave. E foi com ela que sugeriu tomassem o café na esplanada. Era uma estrutura assoalhada em ripas de madeira tratada, delimitada por cabos de aço atravessando prumos inox de dois em dois metros. Ficava nas traseiras do restaurante e dela se via uma parte da cidade iluminada salpicando de luz o breu da noite.
Começaram conversando de pé, junto ao gradeamento que o não era. Só uns cabos de aço pós-moderno. E ficaram trocando as primeiras palavras, aquelas que sempre surgem desbloqueando os silêncios atrevidos que incomodam nestes momentos. Incomodam porque são uma ameaça à continuidade do que quer continuar-se. Seria terrível duas pessoas sentirem-se atraídas e não conseguirem conversar. E falaram da coincidência de estarem na mesma sala, de estarem em mesas frontais, de olharem na direcção um do outro. E desenvolveram a teoria que os amantes sempre desenvolvem das forças superiores que unem quem querem unir sem perguntas nem preparações. E falaram assumindo à partida a sua consonância, a sua coragem. E recordaram os momentos que os trouxeram ali, as dúvidas, as incertezas e os impulsos. Maria de Lurdes perguntou-lhe como é que, estando ele de costas, soubera quando virar-se para a cumprimentar. Pedi ao colega que estava de frente para mim que me avisasse. E avançaram algumas frases começadas por eu… Anunciando características pessoais, comportamentos previsíveis, gostos, como que recolhendo aprovações, dando a conhecer virtudes e defeitos porque um e outro queriam que, o que quer que se aproximasse, viesse com clareza e transparência. Fundamentos sólidos na fraca estrutura dos relacionamentos humanos.
Expostos os primeiros argumentos, traçadas as primeiras linhas de entendimento, conquistada a seara quente da harmonia atravessada pela brisa das palavras e, não menos importante, chegados os cafés, mais uma água com gás para ela e um uísque sem gelo para ele, puderam finalmente sentar-se. Olhar-se de frente. Conversar com os olhos, com os sorrisos, com as expressões, com o volume e a forma que o corpo dá às palavras. O momento adivinhava-se perfeito. Temperatura amena, breu cortado pela lua gorda, brisa apropriada, um pouco antes de vento, local a pedir conversa e conversa a pedir para acontecer. E aconteceu.


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De Negro Vestida – XXXII

 

Despertar – VI

Maria de Lurdes regressou à sua mesa no passo mais firme que conseguiu. Ainda não sabe mas o encontro com António Pedro não terminou. Assim que chegar junto das colegas fará um ricochete, um caprichoso arco de bumerangue e regressará à promissora conversa com um sorriso nos lábios.
Que estás aqui a fazer Lurdinhas? Pareceu-nos que a conversa estava agradável ali com o jeitoso do fato azul. E estava, mas seria incapaz de deixar-vos. Afinal de contas este jantar é uma simpatia vossa em minha homenagem. Olha, Lurdinhas, em primeiro lugar, este jantar era para veres gente. Agora que viste, não faz sentido estares aqui. Em segundo lugar, nem compreendemos como é que trocas o jeitoso por nós. Nenhuma de nós hesitaria em fazer a troca ao contrário…

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O Romance “De Negro Vestida” foi publicado, capítulo a capítulo, neste blogue, entre 26 de janeiro de 2010 e 22 de abril de 2011.

Agora que conhecerá outros voos, nomeadamente, a publicação em livro, deixamos aqui um excerto de cada capítulo e convidamos todos os amigos e leitores a adquirirem o livro.

Obrigado pela vossa dedicação.

Setembro de 2013

João Paulo Videira

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