Mails para a minha Irmã

"Era uma vez um jovem vigoroso, com a alma espantada todos os dias com cada dia."


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Crónicas de África – Provisório-Definitivo

Crónicas de África – Provisório-Definitivo

Maputo, 2 de dezembro de 2012

A autora Alice Vieira escreveu, há uns anos, um livro intitulado “Um Fio de Fumo nos Confins do Mar” que tinha uma personagem, de seu nome Crispim, que, a propósito do aspeto degradado de certos barracões nas escolas, se referia ao estilo “Provisório-Definitivo”. Assim uma espécie de remendo que chega como provisório e vai ficando e vai perpetuando-se no tempo até que se integra na vida das pessoas como definitivo.

Em Maputo também há disso. Com os carros. Mais especificamente com os pneus suplentes. Antigamente, havia aqueles pneus suplentes que eram mesmo pneus. Uma pessoa tinha um furo, substituía o pneu e ele ficava lá para sempre, que é como quem diz, até ter um furo. O remendado ia para o lugar do suplente. Ora, alguém se lembrou de poupar uns cobres, e os carros passaram a vir equipados com um pneu suplente minúsculo, assim mais a parecer uma roda de bicicleta. Notam-se bem porque têm uma jante amarela e berrante. Dizem as instruções que aquilo é provisório e só dá para 30 quilómetros. Em Maputo dá para bem mais. Aqui, todo o material é precioso e aproveitado até ao limite. Bem podem dizer que aquilo é para 30 quilómetros, mas, uma vez colocado um pneu desses num carro de Maputo, ele vai eternizar-se e andar ali até não dar mais. Então é ver carros particulares e taxis de pneu provisório-definitivo. Há aqui um carro que eu conheço porque me cruzo com ele diversas vezes e porque tem uma cor marcante, cor de rosa, e lá anda ele, pelo menos há dois meses, a exibir a sua orgulhosamente minúscula jante amarela. Resolvi escrever estas linhas por duas razões. Primeiro porque a cidade está repleta destes pequenos pneus que era suposto serem para uma aflição provisória e andam por aí definitivamente agarrados aos veículos. Depois porque hoje me cruzei com um veículo curioso. Era um carro desportivo, baixinho, todo branco e com uns pneuzorros larguíssimos e com umas jantes que não tinham nada menos do que 19 polegadas. Três delas! A quarta, pneu traseiro, lado direito, lá ia luzindo sua rodinha de bicicleta amarela. E acham que o tipo se importou? Qual quê?! Janela aberta, música no máximo a vibrar a voz da Dama do Blingue, braço de fora (infração punida por lei), relógio reluzente e o orgulho como o som: no máximo. O pneu? Que importa lá isso. Era um provisório-definitivo. Está-se bem. Maningue bem!

jpv


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Crónicas de África – Flores para P!

Crónicas de África – Flores para P!

Maputo, 27 de novembro de 2012

Para quem possa saber do que estou a falar, importa, antes de mais, referir que a P. está bem, felizmente. 

Serei reservado como é hábito, mas há um pormenor desta história que me marcou pela generosidade. E é esse pormenor que vou relatar-vos.

A instituição onde trabalho, em Maputo, recebeu uma delegação do MEC em visita oficial. Nessa delegação vinha a minha amiga P. e quando nos vimos trocámos um longo abraço a matar as saudades todas. As dela e as de todas as pessoas que por ela tinham enviado cumprimentos e força e beijinhos. A P. andou bem, desempenhando as suas funções com competência e elegância como é costume e depressa se percebeu que se integrava com facilidade num país muito diferente ainda que por meros cinco dias.

Ontem, contudo, o azar bateu à porta. Entre duas reuniões teve de baixar ao hospital com um problema de saúde súbito e ficar internada. A coisa resolveu-se graças à qualidade do atendimento e à celeridade com que foi socorrida. Pois, aqui não corre tudo mal! À noite, depois de uma anestesia geral, já podia receber amigos. O J. fez a simpatia de me informar e combinámos encontrar-nos no hospital os três, a D. o J. e eu. 

No caminho para o hospital pensei em levar-lhe umas flores. Não conseguia imaginar uma situação muito pior do que uma pessoa estar afastada de casa e da família e, de repente, o organismo pregar-nos uma partida longe de todos aqueles que nos são próximos e constituem o nosso suporte de vida. Por isso, achei que os amigos ao pé dela e o carinho de umas flores poderiam atenuar.

Nem de propósito, enquanto cruzava a avenida Julius Nyerere, lá estava um dos muitos rapazes que vendem ramos de flores pelas ruas e avenidas de Maputo. Era noite. Mesmo assim, encostei o carro e chamei-o. A ideia era saber se tinha algumas que eu pudesse comprar porque saíra de casa a correr e só levara comigo cem meticais (mais ou menos 2,70€):
– Quanto valem?
– Estas duzentos e estas trezentos.
– Ok. Desculpa lá incomodar-te, mas não tenho dinheiro.
– Quanto dás?
– Não dou nada. Não tenho dinheiro. Só levo aqui cem meticais.
– Oh boss, sobe lá um pouco.
– Até subia, mas não tenho, vou ver uma pessoa ao hospital…
– Hospital? Toma, leva.
– Toma lá os cem…
– Não quero, leva assim…
– Ai queres, queres…

E fiquei ali uns minutos até o conseguir convencer a receber o dinheiro. Ora, se tivermos em conta que estas pessoas precisam mesmo, o que aquele rapaz fez na noite de Maputo foi ao abrigo de valores que estão acima de todos os comércios. A solidariedade e o apoio aos fragilizados é um código que, felizmente, ainda vai sendo válido por esse mundo fora incluindo a noite de Maputo.

E lá paguei ao rapaz numa cena muito pouco habitual que foi o vendedor a tentar não receber o dinheiro e o comprador a obrigar o vendedor a cobrar. Trocámos papéis e valeu a pena. A P. abriu um sorriso largo quando as viu e o seu rosto iluminou-se de acolhimento.
A P. está bem. Dois dias de repouso e pode regressar a Portugal com a memória de uma visita diferente. Com trabalho, com percalços, com um atendimento fantástico e… com rosas perfumadas de generosidade.
jpv


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Crónicas de África – Mundo Pequeno


Mundo Pequeno

Maputo, 19 de novembro de 2012

Este blogue é absoluta e completamente independente e o seu proprietário e gestor não deve nada a ninguém, exceto à Caixa Geral de Depósitos, logo, por aqui se fala do que quero e me apetece desde que me dê na gana, que não é real, e faço a publicidade e promovo quem muito bem entendo. Ou seja, nesta crónica vou referir marcas e/ou produtos e assumo a responsabilidade.

Um dos ex-libris de Maputo é o Café-Bar-Pastelaria Continental. Fica ali próximo do Bazar (Mercado Central) e do Mercado do Pau e é um espaço amplo de mesas generosas e uma colunata altíssima e imponente com uns feitios em “L” escrito à mão a encimá-las. Tudo aquilo transpira bem estar e paira no ar um odor adocicado a pastelaria acabadinha de confecionar. Acresce, ainda, uma esplanada em cima de um estrado em madeira de dimensões consideráveis. A pastelaria é muito boa e o café de excelente qualidade. Quem for um bocadinho cusco não dispensa um pequeno almoço de sábado ou domingo naquela esplanada porque faz esquina e dá para ver quem vai, quem vem e quem fica.

No domingo, fomos lá tomar o pequeno almoço. Arrofada mista com um toquezinho de manteiga, café e chá. E estávamos muito descansadinhos a cuscar o passar das gentes, escondidos no nosso anonimato de recém-chegados, quando passa por nós um homem alto e bem constituído que para a olhar para mim, dá dois passos na minha direção e diz:

– Olá! Então o que é que faz por aqui?

E quando me levantei por educação e lhe estendi a mão, reconheci-o, mas não o identifiquei:
– Eu estou a conhecê-lo, mas tem de me dar uma ajuda.
– Então, da Pizaria Catita!
– Mas isso é no Entroncamento!
– Era! Tive de a fechar!

E relembrei uma mãe trabalhadora que em tempos se sacrificou educando dois filhos, uma rapariga e um rapaz, e o rapaz cresceu no negócio e fez-se nele e a simpatia com que nos tratámos nesses dias distantes da
Pizaria Catita guardou emoções nos corações e essas emoções vieram reencontrar-se em Maputo onde me julgava anónimo, mas, ao que parece, não sou assim tanto.

É pequeno, o Mundo. Sobretudo quando os corações dos homens são grandes. O rapaz, hoje um homem, já brevemente descrito, reconheceu-me. Conversámos um bocadinho, trocámos números de telefone e, claro está, estabelecemos um elo.

Depois, quando saímos dali, demos uma volta pela marginal de que vos mostro algumas fotos, e eu fui pensando, Quantas pessoas mais estarão em Maputo que eu conheço de outras paragens? É pequeno, o Mundo.
jpv

Avenida Marginal, sentido Costa do Sol, 6:30 a.m.

Avenida Marginal, sentido Costa do Sol, 6:30 a.m.

Avenida Marginal, sentido Maputo Centro, 11:30 a.m.

Avenida Marginal, sentido Maputo Centro, 11:30 a.m.


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Crónicas de África – O Salazar da Costa do Sol

O Salazar da Costa do Sol

Maputo, 8 de novembro de 2012

Eu gosto de fazer surpresas. E gosto de ser surpreendido. Para ser sincero não sei bem com que é que me espanto mais, se com a surpresa dos outros, se com a minha própria. A surpresa tem mistério e tem também revelação.

A Avenida Marginal, em Maputo, é lindíssima e é assim uma espécie de interminável roteiro de contemplações. Começa ainda bem no miolo da cidade, ali junto ao Ministério das Finanças e desfia-se sob as palmeiras bordejando o mar até à Aldeia dos Pescadores.

Um dia repleto de trabalho. Uma curta pausa para almoço. Uma simples hora. Duas sandes, dois sumos, e aí vamos nós estacionar o carro de frente para a magia das ondas a castigar o areal. Estava um tempo cinzento que é outra forma de o mar estar bonito e desabou uma água certa salpicando a areia e o carro. E ali ficámos comendo sem viv’alma por perto. Descansa o corpo, repousa a cabeça, estende-se o olhar da imaginação mar adentro e menos de uma hora depois, está-se pronto para outra fiada de trabalhos e canseiras. 

Estávamos neste contemplar coisa nenhuma para dentro enquanto o olhar embalava na ondulação, quando ele chegou assim que a chuva deu uma pequena trégua. Não tinha mais do que dezasseis ou dezassete anos. Trazia uma carrada de DVDs com ele, bateu no vidro que eu abri:
– Tens romances?
– Tenho aqui este. 
E estendeu-me um filme chamado “Kama Sutra” rodado na Índia.
– Não é bem esse tipo de romance, é mais uma comédia romântica.
E ele desfilou filmes de ação com o Chuck Norris e o Steven Seagal, o James Bond e uma série de títulos que escapavam ao que lhe tinha sido pedido. Quis meter-me com ele, mas como acho que não devemos falar com as pessoas sem saber-lhes o nome, perguntei:
– Como te chamas?
– Salazar.
– Salazar, nome interessante.
– Sim, mas eu sou o Salazar da Costa do Sol, não sou o António Oliveira.
– E tu sabes quem é o António Oliveira?
– Sei. Se ele fosse vivo, Portugal não estava em crise! Mas vocês não gostam dele lá em Portugal, não é?
– Depende, é como tudo. Há quem goste e há quem não goste. Eu não gosto muito.
– Ninguém gosta lá em Portugal. Até rebentaram com a cabeça da estátua dele em Santa Comba Dão!
– E tu sabes isso tudo? Aqui na Costa do Sol, na outra ponta do globo, tu sabes que há uma terra chamada Santa Comba Dão…
– Tenho de saber, eu sou Salazar. Mas não o António Oliveira.
E largámo-nos a rir. Comprei-lhe um DVD com filmes da National Geographic. Acho que não precisava, mas este miúdo merecia.

As surpresas que a vida nos reserva. Nem sequer faço análises de teor político. Não é isso que me interessa e o assunto está gasto e esfarrapado. Mas está uma pessoa na Costa do Sol, no hemisfério Sul, mais perto do Cabo da Boa Esperança do que de casa e aparece um miúdo imberbe a vender filmes do Chuck Norris que nos fala, com propriedade, da nossa História e sabe nomes de terras que a maioria dos jovens em Lisboa ou no Porto desconhece. Fantástico. Gosto do Salazar… da Costa do Sol!
jpv


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Crónicas de África – Onomástica


Onomástica

Maputo, 6 de novembro de 2012
À medida que o tempo vai passando, ficam mais coisas na retina do que a simpatia e a alegria moçambicanas. Uma delas é a criatividade. Ela está presente na arte com que esculpem a madeira, trabalham o arame, a chapa, pintam o pano, desenham, cantam, dançam e… põem nomes uns aos outros!


A onomástica moçambicana está cheia de surpresas e pormenores deliciosos. Não conheço todas as pessoas cujos nomes aqui revelo hoje, mas só revelo nomes que sei que existem seja porque conheço as pessoas, seja porque conheço quem as conheça. Ou seja, se não comi, vi comer!

Um dia destes num restaurante uns amigos estavam a gostar da simpatia do serviço e perguntaram o nome ao empregado. O breve diálogo que se segue foi mesmo ao nosso lado e perfeitamente audível:
– Como se chama?
Caranguejo.
– Não, não queremos o caranguejo. Queremos saber o seu nome.
– O meu nome é Caranguejo!

De seu nome completo, Maria da Segunda Distração, parece não ter vindo ao mundo de forma muito planeada. Coisas que acontecem!

O dia estava cinzento e àquela hora em que rebentaram as águas à grávida não se via um palmo à frente do nariz. Ficou Escuridão.
– Estou grávida!
– Não estás nada!
– Estou grávida!
– Já te disse que não estás nada grávida!
A senhora estava mesmo grávida. Nasceu uma menina e chamou-se-lhe Razão. Ela tinha razão. Ah tinha, tinha…

Um dia destes fui ter com o vizinho que é agora o responsável pelos assuntos da Comissão de Moradores:
– Bom dia. Chamo-me João Paulo e moro ali no 1.º Esq.
– Bom dia, senhor Paulo. Eu sou Pacífico.
– Eu também.
Pacífico é o meu nome…
– Ah… interessante nome. Prazer em conhecê-lo senhor Pacífico.

Ela esperou que ele nascesse. Eram seis horas quando ele nasceu e Seis Hora ficou. Para quê inventar mais. O nome diz tudo!

Fui comprar uma T-shirt e umas calças africanas, todas brancas com uns desenhos pretos, assim umas girafas e uns potes e coiso e tal:

– Boa tarde, como te chamas?
Piriquito.
– Boa! Eu sou Videira para tu poisares.
Gargalhada geral e o negócio fez-se. Como a imagem comprova!

Há muitos homens que se chamam Castigo, eu já conheci dois, e ouvi uma história de uma senhora muito alegre e bem disposta, como é normal por estas paragens, a quem puseram o nome de Tristeza… é que não está com nada. Carrega a tristeza no nome mas vai de cara alegre.

Depois, há uma série de pessoas que carregam consigo o pragmatismo do quotidiano. Uma coisa que tenho notado é que alguns nomes refletem objetos e realidades muito práticas do dia a dia. Assim, se algum dos amigos e leitores vier a Moçambique e alguém disser que se chama Alface, Colher ou Cadeado, não se ponha logo a rir. Olhe que é mesmo o nome da pessoa. E porque não?

Às vezes fico com a sensação de que a sonoridade das palavras se perde com a travessia do oceano. Diz-se láááááá de uma maneira e ouve-se cááááá de outra, o que não é de estranhar, dada a distância. A dos quilómetros e a outra, mais importante, a que viaja na cabeça das pessoas. Quando fomos à Macaneta, parei numa loja para comprar umas bebidas e vi uns bolos num alguidar:
– O que é isto?
– Fiôsse.
A palavra não me disse nada, mas à primeira trincadela percebi que eram filhoses, ainda que com outro aspeto. O ventou soprou a palavra e ela desgastou-se no caminho. Gosto bem de fiôsse.

E há um amigo português que trabalha aqui em Maputo que diz que estão a trabalhar na empresa dele, entre outras pessoas, o Boaventura Prego Parafuso e a Última Delícia do Casal Carvalho.
Os meus sogros chamam-se Carvalho, pensei que a minha mulher e a minha cunhada eram as últimas delícias do casal Carvalho, mas afinal parece que não! Mai nada!

jpv


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Crónicas de África – O Boss Africano Reencontra o D

O Boss Africano Reencontra o D

Maputo, 3 de novembro de 2012

Alguns dias depois do primeiro encontro, o então batizado de Boss Africano reencontrou o Grande D. E o negócio fez-se. O namoro via sms continuou com propostas e contra-propostas, avanços, recuos e cedências. A determinada altura marcou-se novo encontro, apuraram-se os valores e a qualidade da mercadoria. O D recebeu o Boss Africano e sua dama e levou-os a conhecer os carpinteiros artesãos que produzem as peças, camas, cadeiras, cómodas, cristaleiras, oferta para todos os gostos. Atravessámos o mercado de Malanga, enveredámos por ruas estreitas de terra batida, casas de bloco sobre bloco, construções em chapa de zinco, crianças brincando no emaranhado de ruas estreitinhas, uma casa bem acabada no meio do caos. Até tinha um breve relvado, mais ruas, até chegarmos a um largo de dimensões generosas no meio do casario. E aí estavam madeiras por todo o lado, ferramentas e homens trabalhando a matéria prima. 

Conhecemos um dos carpinteiros, amigo do D, que se comprometeu com uma data para entrega. Acertou-se um valor de sinal e em meio disto tudo, o D e o Boss Africano foram conversando. Da arte de trabalhar a madeira, do preço das coisas, de como o boss veio a ser africano e, a certa altura, o D disse:
-Boss, devíamos ser amigos…
Fui prudente. Muito prudente, mas percebi a sinceridade da proposta. E estava a pensar nela quando ele acrescentou:
-Quem sabe se vieste ao mundo para me salvar…
Depois pediu desculpa por não tirar os óculos escuros, mas a noite tinha sido severa nos vapores etílicos e na farra e ele estava com vergonha de mostrar a vista encarnada.

Mais tarde veio entregar a mercadoria. Atrasou-se. Nem seria moçambicano… mas vinha tudo certinho. Enquanto os outros montavam a cama, ele viu uma bíblia no quarto e perguntou, Boss, posso rezar em tua casa? Podes. E começou a rezar o que sabia e como sabia enquanto os colegas trabalhavam.

No fim, repetiram-se palavras de entusiasmo, acertaram-se contas e o D foi à sua vida. Cruzar-se-á com a minha em breve. Tenho a certeza. Por uma razão ou por outra. 
jpv


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Crónicas de África – O Boss Africano

O Boss Africano

Maputo, 2 de novembro de 2012

Eu gosto desta terra e gosto destas gentes. Mesmo levando em consideração que ainda vivo dias abençoados pela aura da novidade e da descoberta, mesmo sabendo que dias virão em que as coisas correrão menos bem, a essência destas pessoas, as linhas com que se urde o quotidiano desta terra, agradam-me imenso. É por isso que a história que hoje vos trago se reporta a acontecimentos que comportaram riscos, mas que, só os vivendo, saberiam que não havia risco nenhum. Só pessoas. Só negócio. É a história do Boss Africano.


Como sempre, tudo começa com uma necessidade. Neste caso, uma necessidade de relativa importância. Ainda assim, como a estética e o conforto são alimentos da alma e do corpo como se de pão e água se tratasse, lá tentámos satisfazer a necessidade. Era preciso comprar uma cabeceira de uma cama. Sim, só a cabeceira. Metemo-nos no carro e fomos pela avenida 24 de julho abaixo e lá ao fundo, mesmo quase a terminar a avenida, tem-se à direita o mercado Malanga e à esquerda uma série de vendedores de mobílias em madeira maciça de diversas qualidades. A Paula ficou no carro e, assim que saí, abordaram-me dois tipos altos e espadaúdos:
-Como é que é boss?
-‘Tá-se bem. Dá cá mais cinco.
E estendi-lhe a mão na posição “braço de ferro” para um cumprimento bem à macho. Ele, primeiro estranhou, mas de imediato mandou às malvas a cara séria, abriu um sorriso, apertou-me a mão e disse, Este boss é nice! O que é que precisas boss?
Resolvi aproveitar a simpatia, a boa onda, e abrir o jogo. Assim, em vez de fingir que queria armários para só depois avançar para as camas, ataquei logo:
-Como te chamas?
-D.
-Ok, D, preciso de uma cabeceira de cama para oferecer à minha dama.
-O boss é romântico.
-Sempre.
-Ó boss, e qual é a cama que te agrada mais?
-Não quero uma cama, quero só a cabeceira.
-Eh boss, então como é isso? Vais estragar uma cama para aproveitar só a cabeceira?
-Não. Vais-me fazer só a cabeceira.
E vai daí começou a mostrar-me cabeceiras e mais cabeceiras e às tantas perguntei-lhe o preço e ele disse uma exorbitância de preço que dava para comprar dez cabeceiras de cama e foi então que decidi testá-lo:
-Olha lá, então mas tu achas que eu não sei quanto custa a madeira e quantas horas de trabalho aí tens? Para negociarmos, não podes falar nem em metade, senão vou-me já embora, olha, dou-te…
E disse-lhe um quinto do valor que ele tinha pedido.
-Eh boss, é duro negociar contigo!
E eu voltei à carga:
-Olha, estás a ver o meu braço? É branco por fora mas por dentro é tão preto como o teu… Tu não vês que eu sou africano. Quando olhas para mim, em vez de veres uma carteira com notas, tens de ver um irmão africano..
-Eh Zacarias, anda cá que este boss é africano… e largou-se a rir. Depois deu-me outro aperto de mão e disse que me ia mostrar mais coisas e começou a entrar por casas e casinhas e casotas e casebres e já ia ele e eu e mais uns oito ou nove atrás de mim. Vi dúzias de camas, armários, cadeiras trabalhadas lindíssimas sempre tu cá tu lá com o meu amigo D e sem nunca ver a luz do dia de casa em casa. Quando reparei, estava de tal forma embrenhado no bairro que não sabia bem onde estava ainda que soubesse o caminho de volta. Parei, olhei para o cortejo que nos seguia e disse-lhe:
-Ouve lá, o que é que querem estes tipos todos? Não me digas que cada um deles me vai pagar uma 2M?
Desta vez a gargalhada foi geral. Lá vim com ele até à rua.
-Então boss, vais levar?
-Vou buscar a dama. Sabes, a minha dama é como a tua.
-Como assim?
-É ela que manda lá em casa!
Ele não se riu ao princípio mas os outros desataram a rir na cara dele e começaram todos a falar em changana.
-Eh boss, tu és duro. Traz lá a tua dama.
-E posso deixar ali o carro? Não mo desmontam todo?
-Eh boss aqui é tudo gente boa. O carro está controlado.
-Fixe!
E lá fomos os três com a romaria toda atrás. Demos uma voltinha mais pequena, mas suficiente para a Paula perceber por onde eu tinha andado. Foram sempre muito simpáticos e afáveis e tivemos sempre uma conversa muito aberta, muito nivelada e, sobretudo, muito bem disposta. Às tantas o D disse:
-Hei boss vou-te reiterar…
-Alto e para o baile, assim é que é falar. Olha que eu sou professor e tenho alunos que não demonstram essa propriedade vocabular…
-Sabes como é que é, boss, quem está no negócio tem de ter nível.
No fim, acabámos por não fazer negócio, mas isso não azedou a conversa nem um bocadinho. Terminámos por ali as conversações mas resolvemos trocar números de telefone e quando lhe dei o meu número, o D, enquanto o gravava disse com um sorriso a iluminar-lhe a cara, Vou escrever aqui boss africano!

À hora a que vos escrevo, ainda não fechámos negócio, mas também ainda não terminou o namoro. Temos andado a medir forças via sms e o preço está neste momento num plano em que, penso, as duas partes podem aceitar… a ver vamos se se encontra o ponto de equilíbrio entre o D e o boss africano. A visita pelos armazéns e oficinas e casas foi interessante. Para já, porque, claramente notei que os “boss” não costumam ir tão longe, depois, porque admirei o facto de isso lhes ter agradado. Eu não fui um intruso, fui uma pessoa que se interessou pelas coisas deles. E, claro, fui sempre um potencial comprador. Riscos? Talvez. Admito que sim. Mas nunca os senti. Pelo contrário, estive sempre muito tranquilo e à vontade. Acho mesmo que esse é o segredo que abre as portas… da alegria e da simpatia intrinsecamente moçambicana.

jpv


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Crónicas de África – Visita à Macaneta

Visita à Macaneta

Maputo, 31 de outubro de 2012

Num destes domingos, decidimos visitar a Macaneta. Digamos que é a praia mais próxima de Maputo onde, efetivamente, há condições para se desfrutar de um dia de praia. E o investimento foi bom. Sobretudo porque se revelou uma visita muito interessante em diversos aspetos, desde logo, a viagem em si. O tempo estava indeciso, mas isso não nos assustou. A Macaneta é uma língua de terra que, dum lado tem o rio Incomati e do outro o oceano Índico. Não se acede de carro. É preciso ir até Marracuene e atravessar o rio num ferry. Pelo menos, disseram-nos que era um ferry. Quando lá chegámos, não era. Mas isso pode esperar! A primeira decisão foi escolher a estrada. Ir pelo asfalto e demorar cerca de 15 minutos a chegar a Marracuene, ou ir pela estrada de terra e demorar… o que demorasse! Demorou cerca de duas horas a fazer 30Km. A viagem foi interessantíssima. Assistimos gradualmente à substituição do urbanismo pela ruralidade. A estrada é larga. Tão larga quanto os enormes “lagos” de lama que a atravessam totalmente e que é preciso passar, tão larga quanto as lombas que é necessário subir e descer. Ou nuns, ou noutras, ficou a nossa chapa de matrícula da frente! Pelo caminho, as mesmas assimetrias da cidade. Casas enormes e muito bem acabadas e outras muito pequeninas e humildes. Vendas de beira de estrada, cafés, pontos de venda de crédito para telemóvel, cabeleireiros e até um cibercafé. Mangueiras enormes carregadas de fruto, miúdos correndo pela estrada, pessoas dirigindo-se a um casamento que acontecia nesse dia, e, sobretudo, muita gente nos saudando só pela alegria de o fazer, Bom diiiia!, Bom diiiia! Demos boleia a uma senhora idosa que ia para a missa. Sou católica, disse ela como se fosse uma carta de apresentação. Agradeceu os quilómetros que poupou às pernas.

Marracuene é uma terra muito pequena, mas muito agradável. Tem um jardim bem simpático com uma vista fabulosa sobre o rio donde se podem ver os dois cais do ferry de ambos os lados do rio. Olhámos e não vimos o barco. Olha lá, tens a certeza que era nesta terra? É que se veem lá em baixo os cais, pessoas à espera do barco, movimento, mas não se vê o barco o que é esquisito porque a travessia deve ser aquela. Olha e se fôssemos lá ver? Vamos. E fomos. E não estava lá o barco, mas estava lá uma simples jangada a motor que, vista lá de cima, parecia a continuação do cais. Leva 6 carros de cada vez se dois deles forem com a frente de fora dos limites da embarcação. Nada de mais. Sigamos. E seguimos.

O primeiro impacto que sofremos na Macaneta foi o contacto com enormes manadas de vacas e uma fantástica diversidade de aves. Há pássaros exóticos para todos os gostos. Sobretudo na zona pantanosa junto ao rio. Uns pequeninos, muito amarelos e muito mexidos, uns pretos com o começo das asas em castanho fulvo, outros cinzentos, com as patas amarelas e muito altas, uns patos parecidos com mandarins mas muito mais escuros, garças brancas, cinzentas, corvos de gola e mais uma série de surpresas com penas. Pelo caminho, magotes de miúdos dançavam à beira da estrada à espera de uma moeda e uma vez no extremo da língua de terra, é possível fazer uma caminhada pela areia com o rio de um lado e o mar do outro. Aproximou-se um homem de mim. Trazia uma lagosta na mão e ofereceu-ma por 100 meticais (mais ou menos 2,70€). Eu recusei porque não tinha onde a por, mas a Paula gozou tanto comigo por ter recusado um negócio tão vantajoso que comprei a próxima que me ofereceram. Os homens e os rapazes usam umas embarcações estreitas, de varas atadas, levam pequenas redes e pescam poucas peças de cada vez. Saem do mar e vêm vendê-las na praia.
Depois, visitámos a ponta oposta da Macaneta e reparámos que estava repleta de lodges que exploram a tranquilidade, a beleza da paisagem e, claro, a presença do mar. Passámos por uma aldeia completamente erigida em casas de palha. As mulheres estavam trabalhando e os homens deitados pelo chão. Um deles viu-me com a camisola do Benfica e disse-me, Para aí para eu tirar uma foto. Ok, estás à vontade. Ele não está com meias medidas, saca de um iPad última geração, tira a foto e grita, Benfiiica! E pronto, é assim, esta terra, a cada esquina, um contraste.
No regresso, a jangada estava avariada. Parece que é comum. Era preciso um tubo qualquer e o “comandante” estava à espera que alguém lho trouxesse. Quando perguntei quem é que traria o tubo, ele foi muito claro, Ora, o primeiro que aparecer e trouxer um pedaço de tubo! Até me arrepiei, mas o certo é que dez minutos depois apareceu um sul africano com uma pick up e por acaso tinha um pedaço de tubo daquela largura. Serrou-se à medida e já está. Viemos pelo asfalto e almoçámos num local que é uma espécie de jardim interior de uma casa onde há umas cabanas e cada uma delas tem uma mesa onde se pode almoçar. Tirando a demora, acho que foram caçar o frango para o matar e para o assar depois, correu tudo bem…
A Macaneta vale a pena, sobretudo pelas aves e pela zona onde se pode caminhar com água doce de um lado e o mar a bater do outro. Mais um contraste, na terra deles…
jpv


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Crónicas de África – Mercados em Maputo

Mercados em Maputo

Maputo, 30 de outubro de 2012

Um dos atrativos desta cidade são os diversos mercados. Num sábado recente visitámos alguns destes locais. O Mercado do Pau, um dos mais famosos de Maputo, realiza-se ao sábado na zona baixa da cidade, mesmo quase junto ao mar. Trata-se de um mercado de artesanato onde se vende de quase tudo, mas onde, sem dúvida, a madeira esculpida é a oferta central e a mais interessante, nomeadamente, as peças em pau preto. Os preços são muito elevados, mesmo tendo em conta que são negociáveis. A fama que o Mercado do Pau atingiu começa a fazer elevar o que se pede pelas peças. É preciso saber negociar. Comprei uma peça por 400 meticais, e atenção que, se o vendedor vendeu, quer dizer que não perdeu, cujo valor inicialmente pedido foi de 1800 meticais. A dois passos dali, pode visitar-se o imponente largo da Estação dos Caminhos de Ferro. É um largo onde apetece ir só porque sim. Tem uma amplitude e uma beleza que merecem revisitações constantes.
Exatamente na mesma linha, ou seja, em torno do artesanato, há o Mercado da Praça dos Continuadores. Fica junto à Avenida Mao Tse Tung, a quantidade da oferta é muito superior à do mercado do pau e embora se perca um pouco aquele frenesim próprio dos mercados, ganha-se em tranquilidade na medida em que o mercado é feito numa enorme área ajardinada e até se pode beber um café ou comer uma refeição ligeira uma vez que estão aí a ser explorados alguns bares. Aqui, além do artesanato em madeira, há também uma imensa oferta de peças em batik (imagem ao lado. Clique para aumentar). São uns panos desenhados com tintas naturais e acabados com cera. Alguns são de extrema beleza.
Por volta das quatro da tarde começam as chegar as embarcações de pesca e ganha vida o Mercado do Peixe junto à Fotaleza. Aqui, é possível comprar camarão, lagosta, lulas e peixe variado a preços muito interessantes. Contudo, é preciso algum cuidado com a pesagem. No outro dia, comprámos 1 kg de camarão. Eu disse à vendedora que aquilo não tinha 1kg e ela respondeu, Tem sim, papá, olha aqui. E mostrou-me a balança onde estavam marcados 1,200kg. Cheguei a casa, pesei e o camarão tinha 800gr. É por isso que muita gente anda com pequenas balanças portáteis. Assim, confere as pesagens no local da venda. O camarão era muito bom e mesmo com menos 200gr não se pode dizer que fosse caro. Não pode mesmo.
Ainda assim, aquele que mais me atrai é o Mercado Central. O mercado tem de tudo e a oferta começa mesmo antes de se entrar. De resto, Maputo é um imenso mercado espalhado pelas suas ruas. Lá dentro, os corredores são muito estreitos, não chegam a ter um metro de largo. Quando duas pessoas passam uma pela outra têm de se tocar, mais precisamente, roçar uma na outra. Cruzámo-nos com uma senhora volumosa, muito volumosa que, à medida que avançava, ia arrastando toda a gente consigo e dizia, Eu não tenho culpa de ter nascido assim… Vende-se todo o tipo de legumes, frutas, especiarias, castanha de caju com os mais diversos condimentos, bebidas licorosas, piri-piri, artesanato, produtos de higiene e beleza, carne, drogarias, numa oferta imensa, metro a metro e a preços bem interessantes. Visitar este mercado é uma aventura e faz-se com entusiasmo, mas são necessários alguns cuidados. Como, de resto, em qualquer grande urbe. O básico é evitar a ostentação, trazer cópias da documentação em vez dos originais e andar só com o dinheiro necessário para a mercância. As pessoas são muito afáveis e calorosas e, tirando os truques de quem é negociante e vive disso, são absolutamente fiáveis.
Há na cidade outros mercados a aguardar visita, mas ainda não foi desta. A seu tempo…

jpv


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Crónicas de África – Coisas que Não Há em Maputo

Coisas que Não Há em Maputo

Maputo, 30 de outubro de 2012

São 7 horas da manhã. Levantei-me às 5:30 e estive a preparar aulas. Tenho agora um bocadinho para escrever-vos umas linhas que me andam atando um nó no cérebro até que saiam. Há coisas que, simplesmente, não há em Maputo.

Não Há Prisão de Ventre
Seja por via do peixinho comprado junto à fortaleza, das carnes adquiridas no Terra e Mar, da alface do Mercado Central, da água de lavar os dentes, da fruta nas vendas da rua, em Maputo, sobretudo se és europeu e acabado de chegar, não há prisão de ventre! Nem para os mais teimosos!

Não Há Pressa em Maputo
Bem podes procurar! Talvez um ou outro português te arranje um bocadinho de pressa, mas, na generalidade, Maputo, sendo uma grande urbe, é também uma pacata aldeia com filas de trânsito. E sem pressa!

Não Há Stress em Maputo
É uma clara consequência do item anterior. Esperar, num restaurante, uma hora ou mesmo hora e meia para ser servido, não é mau serviço, é um ritual encarado até como muito interessante para se por a conversa em dia. Claro que há um ou outro que exaspera. Deve ser o tal português que ainda tem pressa!

Não Há Falta de Casamentos em Maputo
Nos últimos tempos, em Portugal, encontrar um casamento é algo assinalável!  Quem é que tem a ousadia de se meter nisso?! Logo, a indústria casamenteira, como todo o país, está em crise. Em Maputo é ligeiramente diferente. Vejamos o seguinte: há aqui uma instituição do tipo Registo Civil que se dedica exclusivamente a casamentos. E os casamentos são tantos que já começa a haver celebrações à sexta-feira uma vez que os sábados e os domingos já estão totalmente requisitados. Se, num fim de semana, só viste dois casamentos, isso quer dizer que o passaste enfiado em casa e só saíste uma vez para ir ao pão. Se viste quatro, isso quer dizer que podes ter ido almoçar fora. Se deste uma volta pela cidade no sábado e no domingo, podes ter contado seis, oito ou mais eventos do tipo. O noivo dá um dote que inclui a festa da celebração e as roupas dos familiares chegados da noiva. É engraçado de ver porque as mulheres vão todas de igual e normalmente com roupas de cores muito exuberantes. O tipo endivida-se com a celebração, mas isso não é novidade.

Não Há Divórcios em Maputo
Quer dizer, entre os imigrantes há. Sobretudo porque alguns resolvem casar-se com moçambicanas! Mas entre os moçambicanos é um fenómeno raro e as razões são, sobretudo, duas. A primeira é porque uma pessoa não se casa para se divorciar! Pois, há por aqui um certo sentido de não desfazer o que já foi feito. A segunda é que o divórcio é um dos atos jurídicos mais caros de Moçambique. Custa mais do que um casamento. A consequência é óbvia…

Não Há Bancos Sem Fila em Maputo
Dão-se alvíssaras a quem encontrar o primeiro. Se fores o primeiro a chegar a um banco, logo pela manhã, e quiseres fazer um simples levantamento, isso é  rápido, demora 35 a 40 minutos. Qualquer ação num banco a meio da manhã é obra para 60 a 90 minutos. E as filas lá estão! Há muitos bancos em Maputo, uma vasta oferta de locais. Mas há muito mais gente. Reparei num pormenor curioso a este propósito. Em Maputo toda a gente, até os jovens, muito jovens, sempre que têm algum dinheiro, vão ao banco fazer depósitos. É uma espécie de culto da poupança. Isto parece contraditório com o espírito de um povo que vive para o presente, mas é um facto.

Não Há Um Único Lugar de Estacionamento Não Vigiado em Maputo
Chegas, estacionas o carro, seja no local mais concorrido da cidade, seja num ermo onde não está ninguém e vem chegando um jovem para ajudar a arrumar e ficar a “controlar”. Quando estás num local muito pacato e não vês ninguém à volta, até podes pensar, Aqui que dava jeito um “controlador”, não aparece nenhum. Engano teu. Quando desligas a ignição, ele vem chegando numa corridinha silenciosa, Quer que lave? Não, basta controlar. E fica controlado!

Espero não ter desconseguido interessar-vos e dar-vos mais umas luzes do que é a vida em África, nomeadamente, na capital moçambicana. Sim, esse verbo usa-se assim. E, a meu ver, usa-se muito bem. Se me tentares convencer do contrário, vais desconseguir!

jpv