Mails para a minha Irmã

"Era uma vez um jovem vigoroso, com a alma espantada todos os dias com cada dia."


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"Com Amor," – Documento 34

Cara Verónica,

Um homem na minha idade já viu muitas coisas acontecerem, já percebeu o curso da vida, onde pode deter-se e onde precisa ser determinado e avançar.

Não tenho tempo a perder. Não temos tempo a perder. Vi em si elegância. Viu em mim gentileza. Pois é com elegância que lhe peço juntemos as nossas vontades, conversemos, estejamos um com o outro.

Posso visitá-la?

Por favor, não me diga que não. Se tiver de o fazer, faça-o olhos nos olhos. Peço-lhe que saltemos as tecnologias e nos encontremos frente a frente, sintamos a presença um do outro, ouçamos a conversa das palavras, mas também a dos olhares… das presenças.

Posso visitá-la?

Com respeito,
Eduardo Luís.


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"Com Amor," – Documento 33

Caro Eduardo,

Há pouco tempo atrás, há meses, talvez até há semanas, tê-lo-ia repelido. Teria sido seca, amarga, ou pior do que tudo isso: indiferente. Acontece que ando a reconciliar-me com a vida, ou ela comigo, e ando mais desperta para as surpresas e imprevistos que possam suceder-me. Por vezes basta cruzarmo-nos com alguém que nos altere a perspectiva, que nos faça, com poucas e sensíveis palavras, olhar as pessoas e as situações de outra forma e todo o curso da nossa existência se altera. O Eduardo encontrou-me exactamente na fase em que estou reolhando a vida e os homens nela.

Viu elegância em mim, confessa. E sabe que vi em si? Delicadeza. Uma intensa e genuína delicadeza que já não é deste tempo. Nas palavras. Nos gestos. E no olhar. Havia delicadeza até na forma como se movimentava. Agradeço-lhe por isso. Quanto ao seu inusitado gesto, à sua ousadia, até o facto de o considerar inusitado é pouco comum. Muitos homens não medem as distâncias e fazem abordagens incorrectas e indelicadas. O Eduardo foi ousado, sim, mas nunca desrespeitoso. E isso marcou a diferença. Gostei de o conhecer, sabia?

Claro que nos escreveremos. Não o estamos fazendo já?

Até já!
Verónica.

Ps: pagou o café!


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"Com Amor," – Documento 32

Cara Senhora,

Permita-me que a trate pelo seu nome próprio. Gesto invulgar, por certo, não mais invulgar do que a forma como nos conhecemos.

Perdoe-me o atrevimento. Sou um homem respeitador. O gesto que tive para consigo é, a todos os títulos, inusitado. Há uma verdade, um reduto último de defesa pessoal, de justificação para a minha ousadia: não resisti à sua elegância. E perdoe-me, de novo, se lhe não falo de beleza. Não questiono. Contudo, a beleza insere-se na esfera da arbitrariedade do gosto. A elegância não. Ou se tem, ou não se tem. E a Verónica tem elegância, uma fina elegância no porte, uma presença distinta.

Quando a vi no café, julguei estar enganado, julguei não ser possível, uma mulher com o seu porte e a sua presença estar desacompanhada e veio-me aquele impulso de sorrir-lhe, de cumprimentá-la de conversar consigo… já não sei se lhe paguei o café… espero que sim… Verónica… penso que podemos conversar… gostaria imenso de corresponder-me consigo e agora com estas tecnologias fica tudo mais acessível e rápido.

Com deferência,
Eduardo Luís dos Santos


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"Com Amor," – Documento 31

Meu Homem Rui,

Trago ainda o teu cheiro de homem no meu corpo, o teu perfume na minha pele, e trago o teu toque em mim, como se a cada momento do dia me segurasses com doçura e firmeza, me estreitasses nos teus braços.
E foi enlevada por este amor na memória ainda fresca das carícias no corpo e na alma que fui reler-nos. Reli todas as tuas palavras, Rui, e soaram-me a actos. Reli todas as minhas palavras. Voaram para ti ao ritmo do compasso apaixonado do meu peito. Reli as minhas palavras e não eram já minhas… saíam aladas do meu controlo e procuravam-te na tua existência digital e humana.

Soas-me tão homem, Rui. A tua virilidade emerge das palavras como dos gestos quando amas com firmeza e ternura.

REVELAÇÃO: Reconheço-te, Rui. Reconheço a tua presença em mim. Na minha vida. E surpreendi-me reconhecendo de novo os homens na minha dimensão! Andas a reconciliar-me com o Universo. Em particular, o universo da masculinidade.

Com Amor,
Verónica.


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"Com Amor," – Documento 30

Minha Menina Verónica,

Quando li o teu e-mail fiquei preocupado.
Será que tanta pergunta é sinal de tanta dúvida? Depois de tudo o que nos amámos? Parece-te incerto este amor?

É preciso acreditar. Acreditar nas pessoas, acreditar no amor. Acreditar no azul do céu e no brilho intenso do sol. É preciso acreditar que estamos vivos e que cada dia, cada pulsação, cada temor, cada realização e cada alegria são verdadeiros porque são os nossos barómetros de vida.

Amar é a solução, minha menina Verónica, amar é a solução. Quando duvidares, ama. Quando temeres, ama. Se negares o amor, negas a vida. E isso não é opção… a menos que queiras ser, como disse o poeta, “cadáver adiado que procria”. Ama, Verónica, ama! Nem me refiro em particular a mim. Refiro-me ao mundo, às coisas boas da vida e às más também. Ama-as todas, Verónica. E, claro, ama os homens. Os homens não são bons nem maus, são homens. E é como homens que devem entrar na tua vida. Só isso.

Eu percebo porque falas em culpa. Claro. E posso até dizer que, sendo essa culpa nossa, a sinto mais minha do que tua. E, sendo claro com as palavras, porque eu tenho limitações que tu não tens. Carrego uma responsabilidade de que estás livre. Há, contudo, algo que me perturba. Talvez porque não perceba as razões, ou percebendo-as, as não valide intrinsecamente. Se o que sentimos é tão puro, tão verdadeiro e tão belo como se tem manifestado, onde está a culpa? Pode um amor assim ser culpado? Eu percebo as limitações e os constrangimentos. Logo à partida, de ordem moral. Mas é isso que me assusta: numa análise aos meus pensamentos, aos meus actos e aos meus sentimentos dos últimos meses, não encontro nada senão a pureza inocente de quem se descobre e entrega.

Eu também tenho culpa em mim, Verónica, e, contudo, sinto-me inocente ou, se quiseres, não sou capaz de sentir-me culpado.

Anseio ver-te. Ter-te nos meus braços e fazer-te minha sendo teu. A tua ausência magoa-me. A tua presença pacifica-me. Uma paz de entrega e resiliência.

Não consigo pensar senão em ti. Não te prenderei, meu amor, mas jamais te soltarei do meu coração.

Com Amor,
Rui


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"Com Amor," – Documento 29

Meu Homem Rui,

Será que nos vemos na próxima semana? Inscreveste-te? Será que posso sonhar com o vigor da tua doce masculinidade fazendo de mim mulher inteira? Será que vou ver-te, cheirar-te, tocar-te? Será que és mesmo diferente? Será que posso olhar de novo os homens e pensá-los na minha vida? Será que há para nós mais do que e-mails e encontros furtivos e espaçados no tempo de desejar-te? Será que há vida melhor do que esta?

Não sei, meu homem Rui, é já tão bom, tão delicioso, tudo o que temos e contudo vai-me parecendo pouco…
Vivemos tempos difíceis, Rui, de gentes cinzentas e acabrunhadas com a vida toda nos ombros e é como se ficasse mais difícil respirar o ar da felicidade. É como se houvesse em mim um desejo irreprimível de aceitar as coisas boas da vida e incluir nelas os homens e acreditar que tudo pode mudar entre as pessoas e, ao mesmo tempo, não sentir esta culpa…

Há culpa em mim, Rui. Por ser feliz. Será que é mesmo possível olhar o horizonte e ter esperança?
Temo, Rui, temo acreditar na Humanidade e mais uma vez desiludir-me.
Tenta vir até mim, meu homem Rui. Preciso dos teus braços à minha volta.

Com Amor,
Verónica.


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"Com Amor," – Documento 28

Minha Menina Verónica,

A aspereza que experimentaste nos homens é natural. Eu tenho uma tese. Eu acho que os homens separam mais facilmente do que as mulheres o sexo do amor. E a consequência é simples. Conseguem praticar sexo sem que haja, forçosamente, amor envolvido. Esta é a parte vulgar e pública da tese. A outra parte tem a ver com a aspereza e a suavidade de que falavas. É que eu acredito que, quando amamos alguém, há minúsculas e invisíveis partículas do nosso corpo que se movimentam e amaciam tornando-nos mais suaves, mais preparados para o contacto com a pessoa amada. Os homens que fizeram sexo contigo não te amavam. Ou amavam, mas era esse amor insuficiente para que os seus corpos se suavizassem para ti. Isto, minha menina Verónica, dá-te a dimensão do meu amor por ti.

Por vezes, o sexo, por via do prazer que provoca, pode tornar-se muito egocêntrico. Eu tento fugir a isso. E tento fazer com que tudo seja uma festa, acho que prefiro a palavra festim, para os dois envolvidos. E quando digo envolvidos, digo-o na plena acepção da palavra. Dedicação e entrega total ao outro nos gestos de dar que, como percebes, enformam os de receber. Para mim, o segredo de receber reside em dar. Dar sem medida. E receber o que houver para receber. Se ambos fizerem isso, dá para perceber que a configuração pode ser fantástica como foi, de facto, entre nós.
Deste tanto, Verónica. Deste desmesuradamente. E foi por isso que desmesuradamente recebeste.

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Também duvido, mas hoje não quero escrever sobre isso. Só amar-te. Só despir-te com as palavras e ter-te sob o meu desejo por elas desenhado.

Teu homem Rui.


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"Com Amor," – Documento 27

Meu Homem Rui,

Fiquei com um pormenor a saltitar-me na cabeça. Uma comichão mental. Um dia destes estava a passar os canais de televisão e detive-me num porque alguém desenvolvia uma teoria interessante. Era uma daquelas entrevistas em que o entrevistado está de costas, na penumbra, para não ser identificado e a sua voz surge distorcida. Quando por lá passei, defendia que as mulheres gostam de fazer amor com outras mulheres por razões diversas sendo uma delas a suavidade calorosa da pele. E fez uma comparação. Disse que nos homens havia aspereza. Nas mulheres, suavidade.

E eu pensei em ti. Não é que isto constitua surpresa. Hoje em dia penso em ti a propósito de quase tudo e por quase nada. Pensei em ti porque, efectivamente, meu homem Rui, houve nos homens com que me cruzei até hoje essa aspereza no toque que, em certa altura, confundi com masculinidade, mas que é só mesmo aspereza. E houve também uma avidez devoradora muito centrada neles. Nunca cheguei a perceber se faziam amor comigo, ou se eu era só o instrumento de fazerem amor com eles próprios! Dá para perceber?

Tu foste diferente. Os teus movimentos, as tuas carícias, os teus sons, eram, antes de mais, para nós e nunca me esqueceram. Quase se pode dizer que estavas fazendo amor e sendo atencioso ao mesmo tempo. E o toque, meu homem Rui, não sei como fazes, fizeste, mas não senti essa aspereza de outros companheiros. O vigor e a energia, sim, mas o toque, Rui… foste suave como sedas orientais. Deslizaste sem impor. Dançaste comigo a dança de fazer amor. Um tango perfeito.

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Duvido, Rui. Duvido sempre. Mas quero-te de novo em mim. Quero de novo a seda do teu toque no meu corpo.

Com Amor,
Verónica.


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"Com Amor," – Documento 26

Olá, Minha Menina Verónica,

O amor é uma forma de revolução, de reencontro e de libertação. É uma revolução nos nossos sentimentos comuns e consentidos, é a libertação da verdade e a única verdade é amar.

Sim, mantém-se o desejo e se há momentos em que rememoro as linhas elegantes e sensuais do teu corpo, também os há em que não vejo senão o teu olhar procurando abrigo no meu e nesses instantes prevalece o amor ao desejo. Eu já percebera que eras assertiva, que sabias bem o que querias, mas não imaginava que tudo isso pudesse sentir-se na tua volúpia fogosa, no teu sentir fundo cada respiração. Não me interessa nada se foi sexo ou amor. Interessa-me que ambos quisemos e interessa-me que foi lindo.

Não podia haver pecado, minha menina Verónica, precisamente porque foi em consciência e precisamente porque foi harmonioso. Sabes, às vezes ouso colocar-me no lugar de Deus e pensar como julgaria os actos dos humanos. Neste caso, no nosso caso, nem julgaria. Que fazer perante a realização plena do amor senão assentir e consentir? Era preciso ser um Deus muito deslocado do amor para condenar o que aconteceu entre nós. E sabes que mais? Foi bom… gostoso…gostei em particular daquele momento em que tu… esquece! Tu sabes ao que me refiro. Acho que se notou!

Antes que isto aqueça mais, deixa-me dizer-te, minha querida, que quero mais do que reencontrar-te. Quero reencontrar-nos. O quanto antes!

Teu homem Rui.


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"Com Amor," – Documento 25

Meu Homem Rui,

Escrevo-te em papel, para o trabalho como combinámos, para que me sintas mais próxima de ti, para que toques o papel que eu toquei, para que admires o selo que eu colei, para que sintas o perfume do papel que eu perfumei.

Agora percebo o que dizes sobre tomar decisões em consciência. O que aconteceu entre nós roçou a perfeição, pelo menos, a perfeição de amar. E não houve pecado naquilo que fizemos. Não pode haver pecado numa entrega assim, num amor e numa harmonia tão divinais. Sabes, Rui, os mails são mais rápidos e mais eficazes, mas hoje quis escrever-te em papel para cristalizar e materializar o que aconteceu entre nós e o que aconteceu entre nós foi como a nossa escrita, mas com o requinte do papel que tem um toque particular e um odor próprio.

Andei-me revelando nos teus braços, andei-me entregando e andei recolhendo-te no meu corpo. Conversámos olhos nos olhos, Rui, e esse foi outro milagre. E depois despimos roupas e preconceitos e todo o universo cristalizou à nossa volta. Ninguém viveu, nem morreu, nem correu, nem andou, nem sonhou, nem trabalhou, enquanto nos amámos. O mundo suspendeu-se da sua vida e da sua existência.

Não resisti porque não quis. E não quis porque quis. E tinhas razão, meu homem Rui, nada mais havia naquele momento que valesse a pena ser vivido, nada mais havia que valesse a nossa respiração, o nosso tacto, o nosso olfacto, a nossa visão, nada nos nossos sentidos e nas nossas capacidades, nada nos nossos gestos tinha outra intenção que não as carícias a incendiarem o desejo e o bailado dos corpos na entrega. E vem-me de novo à mente aquela tua teoria do sexo e do amor. Não sei exactamente o que foi, mas nenhum deles ali esteve sozinho.

Neste momento, Rui, não vejo nem sinto mais nada que não seja o desejo de reencontrar-te.

Tua menina Verónica.