Mails para a minha Irmã

"Era uma vez um jovem vigoroso, com a alma espantada todos os dias com cada dia."


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De Negro Vestida – XLIII

 

De Negro Vestida – VII

As refeições são todas diferentes. Há as mais dignas para determinadas ocasiões e há as mais apropriadas para outras. Não há memória, por exemplo, de um pequeno-almoço à luz das velas. E nem é porque não possa esta refeição ser romântica, a prová-lo estão os anúncios publicitários a marcas de cereais que convertem este tempo do dia e esta refeição num diáfano, branco e transparente momento esquecendo a manteiga que sempre cai na toalha, o leite que sempre se derrama, a roupa que sempre se suja. Vem isto a propósito, não de um pequeno-almoço, mas de um jantar.

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O Romance “De Negro Vestida” foi publicado, capítulo a capítulo, neste blogue, entre 26 de janeiro de 2010 e 22 de abril de 2011.

Agora que conhecerá outros voos, nomeadamente, a publicação em livro, deixamos aqui um excerto de cada capítulo e convidamos todos os amigos e leitores a adquirirem o livro.

Obrigado pela vossa dedicação.

Setembro de 2013

João Paulo Videira

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De Negro Vestida – XLII

 

De Negro Vestida – VI

José dos Santos Silva criou muitas regras durante a sua vida e alterou-as quando mais lhe conveio e voltou a alterá-las e alardeou que as tinha respeitado rigorosamente. Tão rigorosamente como a mentira ou o adornar da verdade que sempre fizeram parte de si. Justiça lhe seja feita, até porque não é mau homem, uma regra houve que nunca alterou. José não suportou desde pequenino que lhe chamassem Zé. Primeiro, porque não gostava, depois, quando as palavras vieram a bailar-lhe na boca como cerejas envenenadas, porque sentia que se perdia uma qualquer dignidade com a amputação do nome. Construiu então a regra com a seguinte fórmula:
– Zé é a puta que te pariu, óvistes? Para ti, senhor José!
Foi sempre um inquieto. Incapaz de sossegar, de assentar, de receber ordens ou viver dependências. E tinha uma dificuldade tremenda em não ter razão.

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O Romance “De Negro Vestida” foi publicado, capítulo a capítulo, neste blogue, entre 26 de janeiro de 2010 e 22 de abril de 2011.

Agora que conhecerá outros voos, nomeadamente, a publicação em livro, deixamos aqui um excerto de cada capítulo e convidamos todos os amigos e leitores a adquirirem o livro.

Obrigado pela vossa dedicação.

Setembro de 2013

João Paulo Videira

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De Negro Vestida – XLI

 

De Negro Vestida – V

– Estou sim?
– Ah, querida, Maria José, finalmente atende o telemóvel. Estava a ficar preocupado. Sou eu, o Alberto.
– Eu sei que é você, Alberto, conheço-o melhor do que ninguém, apesar da sua mãe reclamar para ela essa vantagem, mas, sabe, vinte e um anos de casamento dão-nos um conhecimento ímpar do outro… excepto no seu caso, que nunca quis conhecer-me.
– Mas, Maria José, onde é que a menina está? Não vem para jantar?
– Não Alberto, saí de casa.
– Sim, eu sei, caso contrário não estava a ligar-lhe, que a menina saiu, sei eu, não está aqui! Eu preciso, quer dizer, nós precisamos de saber é quando volta.
– Não volto!

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Setembro de 2013

João Paulo Videira

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De Negro Vestida – XL

 

De Negro Vestida – IV

Para Maria de Lurdes, os viúvos apresentavam a inegável vantagem de já terem vivido uma relação sem que o seu fim tivesse sido o fracasso e a ruptura dos divorciados e sem que deles pudesse falar-se de inexperiência como em relação aos solteiros. O problema emergente dos viúvos poderia ser a idade. Um viúvo para ser viúvo, teria de ter sobrevivido à morte da esposa. Ora, a menos que o falecimento resultasse de acidente ou doença inesperada, a morte que os separaria teria surgido em idade avançada.

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Setembro de 2013

João Paulo Videira

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De Negro Vestida – XXXIX

 

De Negro Vestida – III

Maria da Graça Martins, Gracinha entre as poucas amigas que lhe foi permitido ter em tardes de chá e biscoitos sortidos saídos de caixas de lata redondas para pires de porcelana, está no hospital e desta vida que lhe coube viver restam-lhe poucos dias. Ela sabe-o. Mas não se assusta. Bem pelo contrário. Sente uma pontinha de esperança e um resquício longínquo de satisfação. A esperança vem-lhe de saber que, seja a morte o que for, para si será sempre uma terceira oportunidade de viver já que as duas que teve antes esvaíram-se no despotismo do pai e na absurda austeridade do marido.

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Setembro de 2013

João Paulo Videira

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De Negro Vestida – XXXVIII

De Negro Vestida – II

Duas preocupações trazem o espírito de Maria de Lurdes num autêntico frenesim. Que tipo de homem procurar e onde encontrá-lo. Quando elencou mentalmente as características do seu tipo ideal, percebeu de imediato que teria de fazer cedências. O criador nunca se dera ao trabalho, pelo menos que ela soubesse, de produzir semelhante criatura. Meigo, gentil, inteligente, sensível, com sentido de humor, excelente conversador mas não monopolizador do diálogo, ouvinte atento, trabalhador, honesto, fiel, verdadeiro, arrumado e asseado, doce na linguagem e espirituoso sem chegar ao boçal, com bom gosto, financeiramente desafogado, culto e solteiro. E foi quando pensou em solteiro que o seu cérebro parou.

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João Paulo Videira

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De Negro Vestida – XXXVII

 

De Negro Vestida – I

Quando pensamos acerca de que morte escolheríamos, se o pudéssemos fazer, normalmente optamos pelo menos mau e nunca pelo bom. E a razão é simples, não associamos a morte ao bom. Vai daí escolhemos soluções sem dor nem sofrimento e raramente nos lembramos de encomendar ao criador uma morte como a que teve Manuel Matos Vasques que morreu a fazer amor. Bem, se quisermos ser precisos, talvez não tenha sido a fazer amor, pois não consta que a prostituta que se levantou do seu leito de morte sem dar pelo sucedido tivesse experienciado outro sentimento que não a impaciência para que acabasse ele o que estava fazendo e havia pago previamente. E acabou. Acabou o que fazia e acabou ele.

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De Negro Vestida – XXXVI

 

Despertar – X

Maria de Lurdes encontrara uma pessoa-despertador! Não são tão comuns quanto essenciais. Pode ser alguém que nunca conhecemos, pode ser alguém que já conhecíamos mas aquém não dedicáramos ainda atenção ou tempo. Estas pessoas salvam-nos da morte em vida. Acordam-nos e mostram-nos que há mundo para além do mundo, consciência para além da consciência, moral para além da moral, amor para além do amor, alma para além da alma. São pessoas que nos despertam as convicções adormecidas, que nos lembram caminhos esquecidos, que nos mostram pormenores da paisagem múltipla, que nos amam, que nos odeiam, que nos querem ou a quem queremos, são sempre pessoas a que não somos indiferentes.

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João Paulo Videira

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De Negro Vestida – XXXV

 

Despertar – IX

A noite vai longa. A madrugada anuncia-se. Estamos à porta do prédio onde mora Maria de Lurdes. Do outro lado da rua pára um carro e as luzes dos travões projectam em volta um clarão encarnado. Abre-se uma porta. Sai do carro uma mulher com entusiasmo no olhar. Está feliz. Atravessa a estrada, passa por nós sem nos dizer nada porque não quisemos ser vistos. Sobe a escada e enquanto o faz remexe a mala de onde emergem as chaves. Abre a porta e reza para que nenhum dos filhos esteja a pé. Não estava. Dirige-se ao quarto, vai direita à cómoda. Baixa-se e abre a gaveta do fundo. Por baixo de uns lençóis estampados está uma caixinha de jóias com alguns pequenos objectos que aí foi guardando por serem especiais. Tem entre as mãos um cartão de visita com o canto superior direito dobrado. Guarda-o com carinho na caixinha e, pelo sorriso que tem a iluminar-lhe a face, sabemos que guardará em si a memória de quem lho deu.

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João Paulo Videira

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De Negro Vestida – XXXIV

 

Despertar – VIII

Veremos em breve em que palavras, em que emoções e em que gestos vai desembocar esta noite. Se tiver de ser em corpos entregues às conversas da sedução, dos suores gemidos e afagados pela doçura dos gestos, então será. Serão a noite a as pessoas nela a ditá-lo que nós não inventamos estórias, limitamo-nos a contá-las tal como aconteceram.
António Pedro foi como só sabia ser. Absolutamente natural, confrangedoramente franco na atitude e aberto nas palavras. Falou como se nada tivesse a esconder, como se a conhecesse há muitos anos e com ela pudesse partilhar tudo. Falou-lhe do seu trabalho, do que gostava nele e do que nele lhe desagradava, mostrou-lhe as suas ambições, os pontos fortes do seu carácter e falou-lhe também dos fracos, fazendo uma inflexão de voz, tornando-a mais grave e pausada como que a querer que ela acreditasse nele, sobretudo nas fraquezas. Maria de Lurdes estava espantada com aquela abertura e com aquela naturalidade e pensava de si para consigo Este homem não precisa proteger-se? e estava entre este pensamento e a tentativa de o acompanhar no discurso quando foi de novo surpreendida. Ele falou-lhe da família. Da mulher que amava, dos filhos, três, que eram a razão da sua existência.

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Obrigado pela vossa dedicação.

Setembro de 2013

João Paulo Videira

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