Mails para a minha Irmã

"Era uma vez um jovem vigoroso, com a alma espantada todos os dias com cada dia."


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Vermelho Direto – Dérbi Intenso


Vermelho Direto – Dérbi Intenso

Jogou-se, hoje, mais um dérbi, Sporting-Benfica, que só terminou empatado a uma bola porque o árbitro influenciou diretamente o resultado do jogo ao validar o golo do Sporting que foi precedido de fora-de-jogo nítido. Por acaso, penso que o resultado é o mais adequado tendo em conta as incidências do jogo, mas gostava de ver os sportinguistas que o ano passado se queixaram de terem sido prejudicados pela arbitragem porque não foram assinalados 27 penaltis contra o Benfica, terem agora a hombridade de assumir que empataram o jogo com um golo falso. De facto, o único tento limpinho foi a obra de arte que Lazar Markovic construiu ao fintar quatro adversários para depois passar a bola entre as pernas do impotente guarda-redes do Sporting.

Na primeira meia hora o Sporting jogou muito melhor do que o Benfica, foi mais dominador e mostrou um futebol bonito e envolvente. Foi pena não ter conseguido marcar um golo limpo. Nos últimos quinze minutos da primeira parte, o Benfica equilibrou e Deus fez o que Jesus não foi capaz. O treinador do Benfica não estava a mexer na equipa e assistia sereno à sua própria derrota quando Deus se lembrou de lesionar dois jogadores do Benfica e obrigar Jesus a fazer as duas substituições que viriam a alterar a face do jogo.

Na primeira meia hora da segunda parte o Benfica foi melhor. Foi mais pressionante, encostou a rapaziada do Sporting às cordas e foi nesse momento que Markovic se lembrou de levar meia equipa adversária atrás e a fazer, eventualmente, o melhor golo do campeonato. Nos últimos quinze minutos de jogo o Sporting equilibrou por via de melhor forma física.

Pelo meio, o senhor árbitro, que fez uma arbitragem sofrível, cometeu dois erros graves, na minha opinião. Não expulsou Maxi Pereira do SLB e devia tê-lo feito por entrada violenta sobre um adversário, e não marcou um pénalti claro contra o Sporting por falta infantil sobre Cardozo dentro da área sportinguista.

Um dérbi emocionante, com golos, casos e um elevadíssimo ritmo de jogo a mostrar um Benfica menos bom que o ano passado e um Sporting muito melhor que o ano passado o que também não era difícil. Convém não esquecer que, feitas as contas, quem ganha com isto é o FCP! Ah pois é, à terceira jornada, o Porto vai isolar-se na tabela classificativa porque amanhã derrotará, sem margem para dúvida, um clube amigo que não vai dificultar a vida, até porque, como aqui se mostrou em tempo útil, ainda recentemente o fez. Ou seja, o FCP vai previsivelmente à frente e já o é, mesmo antes de o ter sido!

jpv


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Crónicas de Maledicência – Uma Questão de Oportunidade

Crónicas de Maledicência – Uma Questão de Oportunidade

Veio hoje a público que o Bloco de Esquerda, em particular, duas militantes daquele respeitável partido, pretendia discutir o fim do piropo nas ruas de Portugal. O mais engraçado é que não sabem ainda como pôr em prática tal proibição. Nem elas, nem eu. Vejamos, algo de extremamente pertinente se me aflora de imediato à mente: trata-se de qualquer tipo de piropo? Há piropos aceitáveis? E como é que os piropeiros vão saber quais são os que podem proferir-se e quais os que não podem? Afixa-se uma listagem de piropos proibidos na junta de freguesia? À porta das obras? Já não há obras em Portugal. A crise, que o BE tanto combate, ainda bem, é ela, em si, um inseticida de piropos uma vez que acaba com a construção e não havendo obras, a grande maioria dos piropeiros fica desempregada e sem vontade de piropar. Eu bem sei que a prática do piropanço pode ser conotada com marialvismo, machismo, assédio, etecetera e tal, mas, também sei que há diferentes níveis de piropeira. Por exemplo, se uma moçoila, ao passar na rua, ouvir a frase, Chega-te à sombra que o sol derrete os bombons, não vejo como possa sentir-se agredida e assediada. Há até um certo cuidado com a saúde da moça, pois todos sabemos os nefastos efeitos do sol, nomeadamente, derivado à pele! 

Todas estas reflexões, por ricas e interessantes que sejam, me parecem, contudo, um certo desperdício de energias políticas porquanto, ou me engano muito, ou há coisitas a necessitar mais da nossa atenção. Assim de repente, ocorrem-me poucas. Por exemplo, no plano internacional, é capaz de ser exagero meu, mas vejo no horizonte a possibilidade de um conflito bélico entre aliados e sírios com fantasmas recentes a pairarem sobre uma tal iniciativa e muitos inocentes a serem peões menores em confrontos de gigantes. Dentro de fronteiras, temos mais um braço de ferro entre o Governo e o Tribunal Constitucional onde se jogam os empregos de milhares de trabalhadores, temos a calamidade dos fogos que ardem, ceifam vidas atrás de vidas, algumas bem jovens, havendo questionáveis e discutíveis opções no âmbito da gestão dos recursos para fazer face a estas calamidades, há o desemprego, há a falência das famílias, há a emigração forçada de milhares de jovens e qualificados portugueses e Elsa Almeida e Adriana Lopera não conseguem lembrar-se de nada mais premente para discutir do que a abolição do piropo?

Não me parece só uma questão de falta de oportunidade, embora o seja também. É mesmo uma questão de vazio político que, mais do que as próprias ou o BE, envergonha o país.

Tenho dito!
jpv


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Para Mais Tarde Recordar

Desiludam-se. Isto não é um fenómeno moçambicano. É um fenómeno que, infelizmente, acontece um pouco por todo o lado. Esta foto é de hoje. Cortei-a para não se perceber onde é, mas isso é o menos. O facto é que temos quatro “mânfios” a olhar e um pobre coitado de marreta na mão a dar no duro. Ou seja, o Pobre Coitado é o desgraçado que não tinha cunha! Mas há outros raciocínios pertinentes. Por exemplo, gastou-se dinheiro no transporte de cinco, compraram-se quatro capacetes e, mais metical, menos metical, todos eles recebem vencimento, até o tipo da marreta!

Após uma breve investigação descobri a profissão de cada um deles! Hahaha… Tá bonito, tá… Ó Maria, mete os putos na barraca que vai haver trovoada!

(Clique na Imagem para Aumentar)
jpv


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Rascunho

Rascunho

porque me odeias?
perguntou o cordeiro ao lobo.
porque me lembro de quando éramos ambos cordeiros.
e que aconteceu depois?
não te lembras?
não. sou um cordeiro.
desconfiei da tua pele.
da minha pele de cordeiro?
sim. que na altura parecia de lobo.
nunca fui senão um cordeiro.
e eu nunca fui senão um lobo e…
e?
e, contudo, julguei-me cordeiro, julguei-te lobo…
e defendeste-te.
sim. fechei-me.
e, ainda assim, odeias-me…
sou todo rancor e mágoa.
arrependimento…
sim…
de seres lobo?
não. de ter sido cordeiro!
então porque convivemos? porque nos toleramos?
tenho uma teoria…
uma teoria de ódio?
uma teoria de medo.
de medo?
sim. tu temes a vida sem um lobo por perto a afastar os medos.
e tu?
eu temo vida sem um cordeiro por perto em quem despejar as culpas, os remorsos.
somos prisioneiros um do outro.
mais do que isso. alimento um do outro.
alimento putrefacto…
a comida não tem adjetivos.
tu devoraste-me a vida, lobo mau.
tu devoraste-me a vida, cordeiro do diabo.

mas houve um tempo em que me acariciavas a pele.
fazia-o sem mágoa. com a cristalina luz da confiança.
nesse tempo eu achava-te um lobo bom.
e eu achava-te um cordeiro de deus.
mas…
deus não existe. e tu não és senão uma deceção.
e se eu te pedir desculpa.
podes fazê-lo, mas era preciso que eu acreditasse.
em mim?
em ti. em deus. na vida. no amor.
há sempre amor. eu acho que te amo.
não amas nada. tu estás como aqueles da canção do patxi andion. habituado.
queres dizer que pode confundir-se amor com habituação?
claro. na maioria dos casos em que se fala de grandes amores, não se trata mais do que habituação sem sentido. o amor é uma ilusão. um filme sem final feliz. uma laranja amarga. um iogurte fora de prazo.
não me amas, então.
amei-te até desconfiar da tua pele. a desconfiança corroeu-me todo. o peito. a alma.
às vezes culpo-te.
eu culpo-te sempre.
não me dás tréguas.
não. nunca darei. atreveste-te a ser feliz.
queria ser feliz contigo. e achei que querias ser feliz comigo.
sim. mas só contigo. tu teimaste em viver para além de mim.
isso não é saudável.
saudável, minha besta, seria dares-me o que eu te dei. a minha vida. a tua vida.
lamento, lobo mau, vou partir.
não consegues, cordeiro do diabo, estamos presos.
então morrerei.
morrerás. e eu contigo.
morrerei afogado nas tuas lágrimas, lobo.
e eu sufocado no teu sangue, cordeiro.

jpv


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Citação do Trabalho



“O trabalho qualificado implica de certo modo um elemento de capital pois a educação e a formação exigem recursos.”

Jan Tinbergen


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Vermelho Direto – O Minuto 93, Outra Vez!

Vermelho Direto – O Minuto 93, Outra Vez!

A coisa parece digna de um filme do Fellini. O ano passado, quando jogava bem, o Benfica perdeu jogos, e com eles competições importantes, no minuto 93. Este ano, que a equipa está desconjuntada, a produzir ao nível de uma equipa mediana, com problemas de organização, com fraco poder de concretização e a augurar uma má época, resolve ganhar um jogo com dois golos num único minuto sendo que o segundo desses golos, o da vitória, foi obtido no tal mítico minuto: o 93! Fosse isto presságio de uma época a jogar mal e a marcar golos da vitória no minuto 93 e a paixão benfiquista dormia mais descansada. O problema é que os criminosos do costume estão atentos e preparados. Os do costume e os outros também.

A máquina portista parece muito bem oleada. Como sempre. O treinador, há dois meses no FCP, já fala como se lá tivesse passado toda a sua vida e até já se queixa dos treinadores menores dos clubes menores, onde nunca treinou, por certo (!!!), nomeadamente, de serem uns queixinhas com a arbitragem. O certo é que foi contratar uns putos que, além de jogarem à bola, são anti-benfiquistas e isso ajuda muito à moral das tropas. Em abono da verdade, o treinador tanto podia ser o que lá está como a defunta Madre Teresa de Calcutá que a coisa corria sempre mais ou menos na mesma: bem.

E, a avaliar pela entrada de leão, a menos que haja uma saída de cordeiro, o Sporting apresenta-se, outra vez, como um grande. Nove golos em duas jornadas, contra equipas fraquinhas, é certo, mas, em todo o caso, cheios de garra e energia. Esta equipa está muito mais organizada e vai aguentar-se muito mais tempo do que é costume até porque não terá o desgaste das competições europeias. Em todo o caso, vai claudicar porque tanta juventude e tão pouca experiência juntamente com um plantel curto para uma competição tão longa como o campeonato vão ter um preço. O preço da insustentabilidade.

Ora, é neste interessante estado de coisas que as duas equipas, águias e leõezinhos, se vão encontrar. Aparentemente, com vantagem para os de Alvalade, mas sem esquecer que ontem Jesus abraçou Cardozo que, normalmente, enfia umas secas aos lagartos. 

Eu só espero que o jogo chegue empatado ao minuto noventa e que o árbitro dê, pelo menos, 3 de descontos… Ah pois é, eu não acredito em bruxas, mas, pelo andar da carruagem, mais vale  não correr riscos…

jpv


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Citação da Felicidade

“Somos felizes mal nascemos neste canto do mundo.”
MV


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MPMI Atinge as Duzentas Mil Visitas

Desde 12 de maio de 2009, publicámos 2221 mensagens, granjeámos leitores e amigos por todo o mundo e hoje atingimos o bonito número de DUZENTAS MIL visitas.

Muito Obrigado a todos!
Voltem sempre. Cá estarei. Escrevendo a vida.

jpv

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Crónicas de África – O Regresso

Crónicas de África – O Regresso

Maputo, 26 de agosto de 2013

De regresso a Moçambique. Uma multiplicidade de sentimentos e emoções cruzam-me a alma e trazem-me o peito no fio da navalha, entre a alegria e o aperto da saudade.

Antes de mais, quero pedir desculpa aos familiares e amigos que não consegui ver nestas férias. O tempo voou. Bastaria um só olá, um abraço, um beijo. Não foi possível porque não quisesse. Só porque não consegui. Dividido entre a família mais chegada e a necessidade de manutenção que um ano de ausência provoca numa casa, acabei não vendo todos. Em breve, será possível rever algumas destas pessoas que estão no meu coração.

Fizemos as viagens partindo de JoBurg. E a razão é simples. Menos de metade do preço. E conseguem-se trajetos de duração muito aceitável. Entre as 11 e as 13 horas de viagem. Ora, isto trazia um problema. Era preciso ligar Maputo a Joburg de carro. Cerca de 500Km. É aqui que entra o Y.R. que me foi apresentado, por quem havia de ser, pelo já aqui retratado M. O Y.R. é um moçambicano muçulmano que vive dos seus diversos, muitos, negócios, sendo o transporte de pessoas só mais um deles. Em viatura confortável, com condução muito segura, o Y.R. surpreende pela fluência do discurso e pelos muitos recursos que apresenta. Uma das coisas que apreciei nele, foi a calma e a tranquilidade com que enfrenta cada dificuldade. Nem a polícia, nem a fronteira chegam a ser problemas. Ele contorna com simpatia cada situação. E, claro, quando para numa qualquer portagem e saúda o/a portageiro/a com a frase “Have a sparkling day”, arranca-nos uma gargalhada. Colocou-nos no aeroporto e foi buscar-nos ao aeroporto com assinalável eficácia. Tema de conversa não podia faltar. Y.R. é um benfiquista tão apaixonado quanto eu. Vive o clube, a emoção do jogo, a superstição da roupa a vestir ou da posição dos comandos da TV quando o Benfica joga. Pediu-me para lhe trazer umas camisolas da Loja do Benfica, favor que fiz com toda a satisfação. Por outro lado, é um homem de Fé e leva esse assunto muito a sério, ainda assim, felizmente, fala dele com toda a naturalidade. E assim aprendi imenso sobre o islamismo e esclareci uma série de estereótipos que o tempo foi cristalizando. E quando chegou a minha vez, expliquei alguns aspetos do cristianismo com que o Y.R. estava menos familiarizado. Foi engraçado porque ele tinha todo o cuidado de parar para comermos e descansarmos e a única coisa que, desde o início, disse que tinha de fazer, era parar para fazer as suas orações. E assim foi. Moçambique na sua multiplicidade integradora de diferenças. Sem preconceitos. É um homem de família e um homem de bem. Foi a companhia ideal para ligar Maputo a Joburg.

O regresso surpreendeu-nos. Tínhamos lido e ouvido, ainda em Portugal, que o ambiente por aqui andava tenso. A verdade é que, felizmente para nós, os moçambicanos estão iguais a si próprios. Alegres e acolhedores. Os vizinhos receberam-nos com saudações calorosas, “Bem vindos!”, “Correu tudo bem do seu lado?”, “A viagem foi boa?”, “Ficamos felizes por terem regressado!”. Ora, que os vizinhos nos tivessem acolhido bem, foi muito bom, mas o que eu não estava mesmo à espera era de ser reconhecido pelo senhor que vende laranjas no semáforo da 24 de julho com a Amílcar Cabral, ou pela senhora que pesa a fruta no Mica… Rever os nossos primos foi importante e regressar ao local de trabalho e encontrar toda a gente com um ar fresco e bem disposto a tratar-nos como se estivéssemos naquela escola há vinte anos, também foi reconfortante.

E claro… há sempre aquela franqueza e aquela simplicidade deliciosamente desconcertantes. Foi preciso comprar um pequeno eletrodoméstico, um ferro de passar. Havia dois parecidos, quer dizer, iguais, mas com uma diferença de mil meticais (mais ou menos 25€). Chamámos uma funcionária da superfície comercial e perguntámos:
– Estes ferros parecem iguais, mas têm uma diferença de mil meticais, sabe dizer-me porquê?
Ela estranhou a pergunta, normalmente, por aqui, compra-se aquele de que se gosta mais. Uma questão de simpatia, amor à primeira vista, eu sei lá. Nós é que complicamos tudo o que é simples. E vai daí respondeu:
-Ora, servem os dois para passar.
Devemos ter feito um ar estranho, talvez insatisfeito com a resposta, então ela examinou os ferros e rematou o assunto de uma forma que só acho possível acontecer em Moçambique, uma ternura:
-Olhe, este aqui tem mais 100 watts. Sabe que mais? Isto serve é para passar a ferro, acho que 100 watts não valem mil meticais. Leve este. Ainda por cima, o que tem mais watts, gasta mais energia!
E não esteve com meias medidas, além de aconselhar, decidiu, porque a verdade é que agarrou na caixa do mais barato e pô-la nos nossos braços.

Atravessámos a avenida marginal, percorremos as capelinhas do costume, vimos as pessoas do costume e, de repente, a cidade vive de novo em nós. Pela frente, mais um ano de trabalho, numa terra inigualável. Moçambique acolhe-nos e nós deixamo-nos acolher. Regressámos há um par de dias e é como se nunca daqui tivéssemos saído!

jpv


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Leitura de Férias

Por via das tarefas de manutenção, estas férias não li tanto quanto queria. Ainda assim, nas duas últimas semanas, devorei três livros. Embora seja um leitor lento, daqueles que saboreiam, voltam a atrás, releem, divertem-se e só depois avançam, a escassez de tempo para ler, deu-me para despachar a prosa.

Quem me conhece já me ouviu muita vez a frase “prefiro um mau autor português do que um bom estrangeiro”. Quero com isto dizer que leio preferencialmente autores de Língua Portuguesa. Também leio estrangeiros, mas procuro e prefiro sempre um português. Não se estranhe, pois, que os três livros sejam de autores portugueses. Aqui fica o elenco e uma breve opinião que não pretende ser uma crítica literária. Só a minha opinião.

Madrugada Suja
Miguel Sousa Tavares

Eu sou professor e, como tal, não gostei de muitas das suas declarações acerca dos docentes. Também sei que muitas das afirmações que lhe são atribuídas não foram por si proferidas. Em todo o caso, não misturo as coisas. Não gosto do comentador, mas gosto muito do escritor. Até hoje li toda a prosa ficcional de Miguel Sousa Tavares e, se bem que tenha gostado deste livro, penso que é o romance mais fraquinho que publicou até hoje. Tem uma prosa escorreita, mas falta-lhe intensidade, as personagens não têm densidade psicológica, e a trama é confrangedoramente previsível. Em todo o caso, considero absolutamente deliciosa a construção do ambiente de Medronhais da Serra, uma aldeia perdida no alentejo e, em particular, da personagem Tomás da Burra, avô do protagonista. A crítica política também está bem urdida mas há momentos em que o texto se desprende do romance e fica a parecer uma crónica para o jornal. Por fim, duas falhas técnicas ou, melhor dizendo, duas mesquinhices minhas. Primeiro, não me parece que uma rapariga violada e atropelada, que passa por um processo de recuperação do andar que dura cinco anos quisesse alguma vez mais ter qualquer tipo de relacionamento com um dos agressores, mesmo considerando que este tinha um estatuto mais “desculpável” que os outros dois. Segundo, era impossível o Tomás da Burra converter uma cadeira de barbeiro, tal como a que está descrita, numa “cadeira de rodas” colocando-a em cima de umas rodas de madeira. Essas cadeiras são pesadíssimas, a rondar os 200kg, e são necessários vários homens para as manusear. 
Em todo o caso, é um livro que se lê de um só fôlego e que aconselho.

Já Não Se Escrevem Cartas de Amor
Mário Zambujal
Este é um autor de quem também li toda a prosa, à exceção de “Cafuné” que vou ler brevemente. É um texto delicioso, quase como uma crónica de época, mas repleto de um humor fino e adaptado à Lisboa dos anos 50. O retrato social está muito bem conseguido e as personagens são divertidas até porque não pretendem ser mais do que isso. O livro é despretensioso e, talvez por isso, se torna cativante e envolvente. De resto, é preciso lê-lo até à última palavra para que toda a trama tenha sentido. É interessante seguir a errância amorosa do protagonista bem como os desconcertantes momentos de sensualidade que a envolvem, como é interessante passear pelos ambientes recriados. Por fim, o livro tem uma característica que encontramos quase sempre nos textos de Mário Zambujal: está povoado de personagens secundárias maravilhosas. Aconselho.

Os Retornados – Um Amor Nunca Se Esquece
Júlio Magalhães
É um texto com interesse histórico e com um valor afetivo e um potencial emocional para quem viveu a realidade que retrata: a ponte aérea que permitiu o regresso a Portugal de muitos dos portugueses que viviam nas antigas colónias. A primeira parte do livro é muito documental e serve, fundamentalmente, para mostrar o drama que viveram esses portugueses, a forma abrupta e trágica como foram despojados da sua vida. Só na segunda parte do livro, “20 anos depois”, o autor entra efetivamente no campo do romance. A escrita está conseguida ao nível de um relato. Para romance, falta-lhe muita coisa. Ainda assim, eu acho que todos os portugueses, “Retornados” ou não, deviam ler este livro. Como também sou “Retornado”, para mim, emergiu o valor emocional do livro. Às lágrimas. Contudo, reconheço que a escrita é muito incipiente e, por vezes, desnecessariamente redundante, quase pueril, como se fossem as memórias de um menino. E talvez sejam. Se é “Retornado” já leu. Se não é, devia ler.
Pretendo ler outros livros deste autor para não “cristalizar” a minha opinião com base num só texto.

jpv