Monthly Archives: Abril 2012
Crónicas de Maledicência – Livre Arbitragem
Crónicas de Maledicência – Livre Arbitragem
O Clã do Comboio – Reencontro

Reencontro
O Escritor reencontrou-se com o Clã do Comboio numa noite memorável.
O convite apareceu quase de surpresa, Na sexta-feira vamos jantar juntos, queres vir? Claro, deixa ver se posso. E podia.
Encontrámo-nos no restaurante “O Constantino das Enguias” em Foros de Benfica e comemos… claro, enguias. Fritas e ensopado. Ambos muito bem servidos, muito bem regados e o Clã fez-lhes as honras com apetite voraz!
Estiveram o Escritor e sua esposa, a Senhora da Revista de Culinária, a Rapariga com Brinco de Pérola, o Rapaz do Fato Cinzento, a Rapariga do Riso Fácil, a Generosa Lili, a Senhora das Caralhotas e seu esposo, e um moço muito simpático que, ao que parece, acompanhava a Generosa Lili não obstante esta se ter demonstrado muito atenciosa para com o Rapaz do Fato Cinzento.
O primeiro momento do reencontro foi muito interessante. Foi um abrir sincero de sorrisos, de saudades, de perguntas a reatar laços e a garantir que tudo estava bem para todos. Apertos de mão, abraços, graçolas e uma boa disposição contagiante. Houve brindes, histórias, anedotas e episódios recordados e houve um comer voraz… não posso esquecer-me de que deixei de contar travessas de enguias fritas para aí à sexta, correram pelo menos quatro tachos de ensopado. A Senhora das Caralhotas é de um apetite de fazer inveja ao Astérix. Tudo o que vier morre. Já todos tinham comido e ela diz, Não fica aqui nada! E pimba atira-se ao ensopado e quando a malta ia nas sobremesas, ela contra-atacou, Hum… vou comer mais uma enguiazinha e diz para o Rapaz do fato Cinzento, Bebe pá, que esta malta está a pagar para a gente beber! Gargalhada geral. O tempo voou. Foi um reencontro intenso e interessante. A Calma da Rapariga com Brinco de Pérola, o sorriso malandro da Senhora da Revista de Culinária, a loucura desbocada da Senhora das Caralhotas e seu simpático marido, a simpatia da Rapariga do Riso Fácil, a saudade do Escritor…E não excluímos, nunca, ninguém. Desta vez, por exemplo, percorremos os nossos amigos ausentes um a um e falámos deles como se estivessem connosco. A todos aqui deixo uma saudação em nome dos que foram às enguias do Constantino.
No regresso, o Escritor, sua esposa, a Rapariga do Riso Fácil, o Rapaz do Fato Cinzento e a Rapariga com Brinco de Pérola vieram juntos no mesmo carro falando de livros. De um pormenor em particular: dos títulos dos livros. Do seu poder. Como nos conquistam. Os mais memoráveis e, depois, falávamos dos livros propriamente ditos.
Já me lembro porque é que o Clã do Comboio veio a ser o Clã do Comboio. Porque se encontraram pessoas fantásticas no espaço de rituais idênticos. Até breve!
Escritor
Por causa dA Dívida – IX

Por causa dA Dívida – IX
Ai meu Deus, estou tramada. Agora tirou-me o carro. Diz que o vendeu. O meu maridão enlouqueceu. Então como é que eu me desloco para todo o lado? Ai vai ouvi-las, vai… o pior é que já usei os argumentos quase todos e ele não cedeu. Aliás, o tipo parece determinado como nunca. O que será que ele fez ao dinheiro do desfalque? Havia um desfalque, acho eu… lá vem ele… tenho de fazer uma choradeira primeiro e falar-lhe ao coração depois…
– Olá Marinho, olhe, eu continuo a dizer que está a ir longe de mais com essa história do carro. Se não cumpre a sua palavra nesse aspeto, eu também posso não cumprir a minha… sei lá… na cama! Já viu que aborrecido que era?
– Não seja patética, Belinha, deixe-se de parvoíces.
– Parvoíces, Marinho, mas que linguagem é essa? Não estou a reconhecê-lo.
– E se não muda de atitude vai é deixar de ver-me!
– Ah! A ameaçar com o divórcio. Não seja baixo! Os homens não prestam mesmo.
– Não, não estou a ameaçá-la com o divórcio. Se as minhas suspeitas se confirmarem, o divórcio será o menor dos nossos problemas.
– Ai, Mário, está a assustar-me…
– Pois é, Belinha, estamos perto do fim…
– Não me diga que é por causa do desfalque?
– Qual desfalque? Não há desfalque nenhum!
– Ai Mário, comece a fazer sentido! O que se passa?
– É o João e a Dulce!
– Ai querido, agora estou mesmo assustada, quem são esses? Alguém que eu deva conhecer?
– Sua tonta! Sua burra! São os nossos autores!
– Os nossos autores? Ai querido, cada vez percebo menos…
– Eu explico… nós não somos pessoas a sério, somos personagens numa história. E o nosso Deus… são dois! O João e a Dulce. Eles é que determinam os nossos atos e o nosso destino.
– E…
– E eu ouvi uma conversa entre eles, estava eu aqui no caderno e eles iam no comboio a falar de nós… estão zangadíssimos connosco. Dizem que somos uns interesseiros, desonestos, só sabemos é mentir um ao outro, trairmo-nos mutuamente e gastar acima das nossas possibilidades. Parece que estão a considerar…
– Matar-nos?
– Acho que não iriam tão longe, mas suspeito que querem que deixemos de existir…
– E qual é a diferença?
– É que assim nem precisam de inventar a nossa morte! Desaparecemos para sempre e pronto.
– Ai, Mário, não! Isso não! Ser suprimida da existência para todo o sempre, isso não!
– Pois, mas, ou mudamos de atitude, ou… não temos saída…
– Marinho…
– Sim…
– Há uma coisa que eu não percebo…
– Sim…
– Se esse João e essa Dulce são os nossos autores e determinam os nossos atos e o nosso destino, então não são eles os responsáveis primeiros por sermos como somos?!
– Aparentemente sim, Belinha. Acontece que há duas coisas que os autores têm e de que nunca abdicam…
– Então? O quê?
– Pancada e prerrogativa!
– Isso quer dizer que nos criam, nos guiam e depois têm o direito de não gostar de nós?
– Tal e qual!
– Miseráveis! Ouviram, senhores autores? Senhor João e senhora Dulce, sois uns miseráveis!
– Cala-te, sua delambida imoral!
– Sim, cala-te sua perversa mentirosa!
– Foi você que falou, Mário?
– Eu não, Belinha, estava a ouvi-la com atenção…
– Fomos nós, os autores, calem-se, mudem de atitude e vejam lá se dão algum interesse a esta história!
– Eu não lhe disse que eles estavam zangados, Belinha?! É a tal coisa… pancada e prerrogativa.
– Olhe, Mário, eu acho que os nossos autores são uns imbecis, em todo o caso, como estamos num beco sem saída, faço-lhe uma proposta…
– Diga, minha querida.
– Façamos um pacto de honestidade.
– Então e não é preciso ser honesto para isso?
– É!
– Mas nós não somos!
– Mas podemos começar a ser.
– Ó Belinha, eu não sei se sei ser honesto…
– Também eu não sei se sei viver sem mentir, mas temos de tentar…
– E como é que fazíamos isso?
– Veja lá se gosta desta ideia… eu conto-lhe toda a verdade sobre as minhas patranhas e mentiras e o Mário conta-me toda a verdade sobre as suas… assim, como se começássemos do zero e depois íamos ser boas pessoas, com princípios.
– Isso é muito arrojado, mas podemos tentar… comece a Belinha…
– Muito bem, começo eu. Olhe, eu tenho um cartão de crédito às escondidas e farto-me de gastar com ele, às vezes por pura vingança. Compro tudo o que me apetece. Para mim e até para umas amigas. Estou sempre a ignorar as suas preocupações com dinheiro e faço chantagem com a nossa vida íntima… o sexo! E… e… e eu sei que deu um desfalque num negócio que propôs ao nosso cunhado, mas fingi que não sabia para poder gastar o dinheiro. E uma vez, há muitos anos, tive um caso com um colega seu, o Eduardo, mas agora já acabou. Pronto, já está. Agora é a sua vez.
– Olhe, Belinha, eu podia dizer que estou espantado, mas a verdade é que fiz pior. Eu fui para a cama com a Marlene, somos amantes, e às vezes a Belinha está a falar e eu só penso nela. E, sim, é verdade, enganei o nosso cunhado, paguei umas contas, mas comprei a viagem às Maldivas e fiquei com uma pipa de massa para os meus luxos e vícios. Antes tivesse estado quieto, a PJ anda atrás de mim e está a um passo de descobrir tudo.
– Dulce…
– Sim, JP…
– Estes tipos não têm emenda, Dulce.
– Pois não, JP.
– Ainda agora fizeram um pacto de honestidade e já estão a mentir um ao outro.
– É verdade, JP, ela não revelou os encontros com o miúdo, o Hugo. Aquilo ainda vai dar chatice.
– Pois é, Dulce, e ele não revelou que também vai para a cama com a Andreia e Sandra e… nem sequer contou a história do anel que deu à Marlene.
– Pois é, JP, mas em relação a isso ela também foi desonesta porque sabe da história do anel e não abriu o jogo…
– Olha, Dulce, cá para mim, estes dois não têm emenda.
– Pois não, JP.
– Dulce…
– Sim, JP…
– Vê lá se endireitas isto no próximo capítulo!
– JP, tu não vais ficar por aqui e deixar isto tudo em suspenso. Tu não te vais embora e deixar-me com esta baralhada nas mãos, pois não?
– Ai vou, vou…
– JP! Vem cá! Anda escrever o resto!
– Bye, bye, Dulce…
jpv
Crónicas de Maledicência – Cuspir para o Ar
Sexo
Sexo
A minha pele na tua pele.
A minha língua no teu corpo.
Paira um odor de flores e de mel,
O mundo parou
E eu estou tomado e absorto.
Não sei onde acabo,
Nem tão pouco onde começas.
Sei que chegámos aqui
Sem ânsias nem pressas.
O teu calor
Nas minhas mãos.
A minha vontade sobre ti,
Um momento trepidante,
Um arrepio que senti.
E quando estamos
Nesse cume
Do desejo,
Cada toque
É como lume
Ardendo num beijo.
E quanto mais me incitas,
Mais gritas que pare,
Mais te possuo e quero.
Há coisas que ficam mais bonitas
Quando te contrario
No vórtex do desvario.
E não paro!
Retomo com energia,
Sem medida nem nexo.
É que isto não é amor,
É ardente e descontrolado sexo!
jpv
Sussurro do Além
Sussurro do Além
Não me lembro, já,
Do odor do teu sexo.
O mundo tornou-se
Num emaranhado complexo
De acontecimentos que não domino.
De calores que não sinto,
De amores que não vivo,
De palavras que não conheço.
Em ti começo.
Em mim termino.
É bom de pagar, o preço,
Da mortalidade
Quando um homem já não tem idade.
Não envelheci.
Nunca fui velho.
Morri,
Porque não segui o conselho
De envelhecer,
Que é morrer
Aos bocadinhos.
Escolhi sempre os meus caminhos
E percorri-os com esperança,
Até que nessa dança
Da vida e da morte
Me faltou corpo para tanta vida.
E, hoje,
À beira-eternidade sentado,
Olho o Universo e penso
Que foi melhor ter vivido.
Até as más escolhas foram boas.
Não há nada que canse o corpo
E derrote a mente.
E é por isso que te vejo aí em baixo
E te grito,
Convicto,
Tu, Humano,
Vives de viver intensamente!
jpv
Crónicas de Maledicência – Batalha Naval
Crónicas de Maledicência – Batalha Naval
Peço desculpa por discordar, senhor Procurador-Geral da República, mas o contribuinte que há em mim não se importa de pagar essa peritagem por cara que seja. Mais, fazendo uma breve incursão por jornais ou dedicando trinta minutos por dia a noticiários televisivos, percebe-se com facilidade que Portugal paga todos os dias peritagens e comissões de inquérito e comissões de análise e avaliações e… tudo e mais alguma coisa.
Um dos senhores estrangeiros que fez o negócio disse que, para fazê-lo, só falou com gente normal e não contactou ninguém do então Governo. Acho mal. Senão vejamos, os submarinos são portugueses, quer dizer, pertencem ao Estado Português. Quem pode adquirir e vender em nome do Estado Português, quem é? O Governo. Ora, se o Estado Português comprou dois submarinos e o vendedor não contactou com ninguém do Governo, eu só vim aqui dizer que não fui eu! O que já se antecipava e eu consigo provar com alguma facilidade: é que eu não sou um tipo nada normal!
Por alguma razão, vá-se lá saber qual, as peritagens ficaram agora a um preço inacessível. Só resta saber quanto nos vai custar a ignorância. Mas, cuidado, normalmente a ignorância sai caríssima!
Receita para uma Tarde de Chuva
Crónicas de Maledicência – Don’t Cry for me Argentina
Crónicas de Maledicência – Don’t Cry for me Argentina







