Mails para a minha Irmã

"Era uma vez um jovem vigoroso, com a alma espantada todos os dias com cada dia."

O Clã do Comboio – Um Mundo à Parte

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Um Mundo à Parte

Era um comboio de fim de tarde com o sol a amarelecer os vidros. O comboio circulava ensonado e repetitivo nos ruídos das engrenagens. Estava só. Mais ninguém do Clã.
Ela viajava um pouco mais à frente. Tinha um vestido de pano cor-de-roda escuro com muitas flores que não eram estampadas, mas desenhadas com linhas. Por cima dos ombros um pano de tule aos folhos também cor-de-rosa escuro. O cabelo era loiro, às madeixas, por cima dos ombros e tinha um gancho de lado que lhe dava um ar infantil.
Quando chegámos ao Setil, uma senhora cega agarrou na vareta e deslizou para a porta de saída. Quando passou, ela disse bem alto:
– Eh pá ias aí e não dizias nada. Não te vi.
A cega continuou sem responder. Saiu. O comboio arrancou. Ela virou-se de frente para o vidro do comboio, fixou o seu próprio reflexo e falou para ele:
– Eh pá, nem vi que ela ia ali.
– Pois… eu também não.
Conhecezia?
– Eu não, e tu?
– Eu também não.
Quando terminou de falar com o seu próprio reflexo no vidro do comboio, virou-se para a frente e não voltou a dizer uma palavra até ao Entroncamento. Um mundo à parte!
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Autor: mailsparaaminhairma

Desenho ilusões com palavras. Sinto com palavras. Expresso com palavras. Escrevo. Sempre. O resto, ou é amor, ou é a vida a consumir-me! Há tão poucas coisas que valem a pena um momento de vida. Há tão poucas coisas por que morrer. Algumas pessoas. Outras tantas paixões. Umas quantas ilusões. E a escrita. Sempre as palavras... jpvideira https://mailsparaaminhairma.wordpress.com

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