Mails para a minha Irmã

"Era uma vez um jovem vigoroso, com a alma espantada todos os dias com cada dia."


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Curtas do Metro – Multiculturalidade de Mãos Dadas

Multiculturalidade de Mãos Dadas

Cada uma das situações que observei hoje, separadamente, não tem nada de extraordinário. O interessante é que todas estas pessoas se cruzaram comigo no mesmo dia e no Metro.

8:55 – Estação do Metro de Baixa/Chiado
Ele já vinha no Metro. Ela entrou comigo. Ele tinha pele preta. De um preto cerrado de onde emergiam as unhas claras que ainda pareciam mais claras por via do contraste com as mãos. Estava agarrado a uma pegadeira do tecto. Ela era muito branca, quase pálida. A carruagem vinha cheia, mas não insuportável, contudo, ela não hesitou, quando chegou a altura de agarrar-se, colocou a sua mão branca em cima da mão preta dele. Quando saíram, separaram-se. Não se conheciam. Tinham dados as mãos por conveniência na segurança.

17:58 – Estação do Metro do Cais do Sodré
Quando cheguei, elas já lá estavam. Uma de fato de treino. A outra com calças de malha e uma camisola de lã às riscas. Estavam lado a lado, de frente para a linha, de mãos dadas. As palmas claras das mãos pretas entregavam-se com generosidade e carinho. Trocaram um beijo discreto nos lábios e desapareceram na composição quando as portas se abriram.

18:12 – Estação do Metro de Baixa/Chiado
Estou sentado no longo banco de pedra de frente para a linha e paralelo a ela. Dois rapazes descem as escadas ao fundo e encaminham-se para aqui. Os dois têm a pele clara. Um deles está com calças de ganga, um casaco de penas e traz botas de montanha. O outro veste um fato-de-treino branco com vivos lilás. O primeiro tem a barba por fazer. O segundo tem a barba feita e o cabelo muito bem penteado. Vêm de mãos dadas. Aproximam-se e sentam-se, encostados e cúmplices, à espera do Metro.

18:18 – Estação do Metro de Santa Apolónia
Vamos em corrida acelerada, galgando degraus da escada que desagua rios de gente junto à linha do comboio e vamos em busca de um interregional que já perdemos mas ainda não sabemos. São os dois brancos. Ele e ela. Os dois têm porte atlético e roupas práticas. E correm ofegantes, subindo os degraus dois a dois, mas nunca se largam. Correm de mãos dadas. Lá em cima vêem, como eu vejo, o interregional a deslizar ao fundo. Nada a fazer. Perdeu-se. Respiram fundo e beijam-se suavemente nos lábios.

Hoje, foi o dia da multiculturalidade ir de mãos dadas nas curtas viagens do Metro de Lisboa.

jpv


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O Clã do Comboio – Iago

Iago

Um destes dias, os três amigos que querem salvar o mundo iam na conversa com o escritor e a mulher vampiro e, a propósito do facto do RB ir ser pai, começou-se a falar em nomes para crianças. Quando o escritor disse que o filho se chamava Iago, lá veio a sacramental pergunta que oiço há vinte anos:
Tiago?
– Não, sem T.
Como os sobrolhos se franziram e as caras ficaram com um ar interrogado, lá se explicou a origem do nome. Que vinha de Iachus, Iagus, Iago e que o nome do santo se começou por escrever Sanctus Iagus, Sant’Iago e, finalmente, por corruptela, São Tiago sendo que o T não era do nome mas da palavra santo.
A malta desmobilizou. Foi ao trabalho e, no dia seguinte, quando os três amigos que querem salvar o mundo entraram no comboio, o RB disparou:
– Olha, aquela história do nome… a minha mulher adorou e já deu a sentença: Miguel Iago.
É engraçada a vida, são engraçadas as pessoas. Ainda há uns meses não sabíamos da existência uns dos outros e já andamos trocando destinos. Ora, acontece que há já uns dias que o RB não aparece, por isso impõe-se perguntar:
– Então RB, diz lá à malta se já nasceu o quarto amigo que quer salvar o mundo…