Mails para a minha Irmã

"Era uma vez um jovem vigoroso, com a alma espantada todos os dias com cada dia."


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De Negro Vestida – XXV

 

Solidão – VI

Carolina Maria terminou o banho, seu retempero do corpo e da alma. Para si a água quente e o perfume do gel são bálsamos que limpam e acariciam e este ritual é um espaço de reflexão. Fecha-se no círculo que a água desenha tombando do chuveiro. Não ouve nada. Não sente nada a não ser o calor da água massajando-lhe o corpo. E pensa. E revive as tristezas, as alegrias, os pormenores. Hoje está voltando à biblioteca, ao jantar, às mãos largas e aos cabelos encaracolados. Acaricia-se levemente como que para senti-los mas depressa percebe a ilusão e a insatisfação com ela. Pára. Fica-se pelo rememorar delicioso que nestas coisas, ainda para mais sendo-se mulher, a mente pode mais do que o corpo. Termina o banho. Limpa-se. Faz o périplo dos cremes e vai à cozinha.

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O Romance “De Negro Vestida” foi publicado, capítulo a capítulo, neste blogue, entre 26 de janeiro de 2010 e 22 de abril de 2011.

Agora que conhecerá outros voos, nomeadamente, a publicação em livro, deixamos aqui um excerto de cada capítulo e convidamos todos os amigos e leitores a adquirirem o livro.

Obrigado pela vossa dedicação.

Setembro de 2013

João Paulo Videira

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A Crise A

Era uma vez uma Gripe que não tinha nome. Mas tinha dono. E o dono, porque era pessoa de pouca imaginação, chamou-lhe A. Ora, ninguém queria esta gripe como, de resto, ninguém quer gripe nenhuma. E o dono dela, como a queria vender, pensou: “Como é que eu vou fazer publicidade eficaz a uma coisa que ninguém quer comprar?”. E foi então que teve essa brilhante ideia: “Assusto toda a gente!” Vai daí começou a fazer um gigantesco BUUUUUUHHHH universal ao mesmo tempo que fazia uma carantonha feia a ver se assustava. E assustou. E as pessoas, assustadas, correram atrás do gel, do álcool, das máscaras, dos comprimidos, das vacinas. Tudo se encomendou aos milhões. Não por causa da gripe, só por causa do medo. E fizeram-se planos de contingência e saíram muitas notícias nos jornais, nas rádios e nas televisões e houve contagem de mortos que morriam de tudo e mais alguma coisa menos de Gripe A, comprovadamente é certo. E depois, de entre os biliões de pessoas que somos, lá houve um ou outro que morreu de gripe. Como morrem todos os anos. E lá voltaram as notícias. E compraram-se milhares de milhões de unidades de desinfectante para as mãos que é álcool com cheirinho, e de máscaras e sabonetes iguais aos outros mas diferentes porque eram para a gripe e toalhetes e passou-se a espirrar para o cotovelo patético e as pessoas assustadas encheram os bolsos do senhor sem imaginação para nomes mas com muita imaginação para vender coisas que ninguém quer, o dono da Gripe A. Hoje, depois do Natal, das eleições, do futebol, e, sobretudo, depois de estarem exauridos os bolsos que já tinham pouco e depois de estar já satisfeito o dono da gripe, já ninguém se lembra de nada. E há dispensadores abandonados. Uns vazios, outros meio cheios, outros cheios e outros ainda arrumados nas caixas onde vinham embalados. E há sabonetes que nunca viram o sol e máscaras que nunca foram ser estúpidas para a cara de ninguém. E tudo isso jaz abandonado mas pago. E a memória é curta. E não tarda nada estamos a pagar outra coisa qualquer.

Não, meus amigos, não me enganei no título do post.

João Paulo Videira


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Perspectivas – II

Perspectivas de um fim-de-semana. Eu ando a avisar que um dia destes mudo para junto do mar. É pena é eu não ouvir os meus avisos!

“Pelando ao sol”

“Água dura”

“Três idosos”

“Riscada”

“Fogo longínquo”

“Contemplação”


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De Negro Vestida – XXIV

 

Solidão – V

Maria de Lurdes está na marquise convertida em atelier de costura tentando fazer, refazer e reunir os gestos necessários para engrossar um pouco mais a coluna das receitas no seu orçamento familiar. Está sentada numa cadeirinha branca, tem a máquina de costura preparada, caixas abertas com linhas e acessórios à volta, as costas curvadas para a frente, uma linha presa entre os dentes e pressente. Pressente os filhos que chegam num rumor escadas acima. Sabia que chegariam tarde. Alguma utilidade têm os telemóveis e as SMS. Mas não sabia que, por via da mesma utilidade, chegariam mais ou menos à mesma hora. Estava já preocupada. Sem razão, é certo. Mas, sendo-se mãe, mais razões não são precisas para que uma ansiedade funda marque o ritmo do coração.
Sente-os aproximarem-se.

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O Romance “De Negro Vestida” foi publicado, capítulo a capítulo, neste blogue, entre 26 de janeiro de 2010 e 22 de abril de 2011.

Agora que conhecerá outros voos, nomeadamente, a publicação em livro, deixamos aqui um excerto de cada capítulo e convidamos todos os amigos e leitores a adquirirem o livro.

Obrigado pela vossa dedicação.

Setembro de 2013

João Paulo Videira

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De Negro Vestida – XXIII

 

Solidão – IV

Venha comigo, caro leitor, venha presenciar ou reviver um ambiente irrepetível. O local onde vamos tem um odor ímpar e inconfundível, tem sons próprios e seculares, tem rituais, tem frequentadores e tem uma personagem da nossa estória.
Há templos que são templos. E porque são templos, as pessoas comportam-se neles como estando em templos. E há espaços que não sendo templos, são templos na mesma e, por isso, estando as pessoas nesses espaços que não são templos comportam-se neles como nos templos. É explicável mas indefinível a linha da lógica razão, a linha do pensamento que define porque fazemos silêncio numa biblioteca. Logo à partida, não se trata de silêncio, trata-se daquele marulhar abafado das folhas de papel virando, do sussurrar respeitoso de comentários, só os essenciais, que os utilizadores trocam entre si ou com os funcionários do templo dos livros. E esse respeito vertido em quase silêncio tanto o pode ser para que se não incomode quem lê e quem pensa, como o pode ser para que se respeite quem pensou e quem escreveu com sabedoria, dedicação, trabalho e genialidade suficientes para que viesse parar à biblioteca. Tem este espaço o estatuto de templo do saber e faz-se nele silêncio para que se não incomode quem soube e quem está querendo saber.

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O Romance “De Negro Vestida” foi publicado, capítulo a capítulo, neste blogue, entre 26 de janeiro de 2010 e 22 de abril de 2011.

Agora que conhecerá outros voos, nomeadamente, a publicação em livro, deixamos aqui um excerto de cada capítulo e convidamos todos os amigos e leitores a adquirirem o livro.

Obrigado pela vossa dedicação.

Setembro de 2013

João Paulo Videira

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Sereno

Como uma criança antes de a ensinarem a ser grande
fui verdadeiro e leal ao que vi e ouvi.
Alberto Caeiro


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Epílogo!

Os meus olhos são uns olhos.
E é com esses olhos uns
que eu vejo no mundo escolhos
onde outros, com outros olhos,
não vêem escolhos nenhuns.

Quem diz escolhos diz flores.
De tudo o mesmo se diz.
Onde uns vêem luto e dores,
uns outros descobrem cores
do mais formoso matiz.

Nas ruas ou nas estradas
onde passa tanta gente,
uns vêem pedras pisadas,
mas outros gnomos e fadas
num halo resplandescente.

Inútil seguir vizinhos,
que ser depois ou ser antes.
Cada um é seus caminhos.
Onde Sancho vê moinhos
D. Quixote vê gigantes.

Vê moinhos? São moinhos.
Vê gigantes? São gigantes.

António Gedeão


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Perspectivas – I

Amigos, está decidido, criei um post chamado “perspectivas” que, à semelhança do que faço no Facebook, serve para ir publicando algumas perspectivas e olhares captados. Sem presunções. Só por gosto. Aqui fica a primeira série. Um abraço. João Paulo.
Olhar Divino II”

Olhar Divino I”

“Nascer do Sol”


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Imprensa Matinal… Benfiiiicaaa!

Pois… não quero que vos falte nada. Nem mesmo as notícias dos jornais diários! Por isso, aqui ficam as capas dos principais. Para mais tarde recordar! Quem conhece o meu benfiquismo, sabe que não sou contra nada nem ninguém, sou simplesmente benfiquista porque o meu pai e o meu avô também eram… herdei a doença!!! Ando cá a pensar, acho que ganhar poucas vezes torna mais saboroso quando se ganha… hihihi…

Um abraço e um obrigado a todos os meus amigos não benfiquistas que me enviaram felicitações. E claro, uma saudação especial a todos os benfiquistas do coração!!!A Bola
O Jogo
Record
O Público


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De Negro Vestida – XXII

 

Solidão – III

O plano era básico. De resto, para ela não constituía surpresa. Estava habituada às surpresas dele que a não surpreendiam. Não se importava com a previsibilidade dos planos dele pela razão simples de que via neles a forma que ele encontrara para a cortejar. E sentia-se cortejada. Desta vez ele limitara-se a pedir “Vais buscar-me à oficina logo à noite?” Ela anuiu acenando que sim com a cabeça e foi esse gesto que lhe deu a ele a liberdade de acrescentar “Tenho uma surpresa para ti. Vais adorar.”
E a noite veio. E ela apareceu na oficina para buscá-lo.
– Vem cá!
– Que tens para mim hoje?

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O Romance “De Negro Vestida” foi publicado, capítulo a capítulo, neste blogue, entre 26 de janeiro de 2010 e 22 de abril de 2011.

Agora que conhecerá outros voos, nomeadamente, a publicação em livro, deixamos aqui um excerto de cada capítulo e convidamos todos os amigos e leitores a adquirirem o livro.

Obrigado pela vossa dedicação.

Setembro de 2013

João Paulo Videira

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