Mails para a minha Irmã

"Era uma vez um jovem vigoroso, com a alma espantada todos os dias com cada dia."


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De Negro Vestida – III

 

Rotinas – III

Antes do primeiro raio de luz que anuncia o astro rei, antes do momento primeiro em que o breu da noite é cortado por uma tímida centelha de luz, a selva dorme. Profunda e negra, num silêncio absoluto de fazer as almas sentirem-se abandonadas, somente cortado, a espaços, pelos animais que fazem de noite o que a maioria vive fazendo de dia. Assim está o lar de Maria de Lurdes. Profundamente adormecido, sossegado e em paz.
Depois, por entre a folhagem e nas tocas e nos recantos escuros e escusos, há, algures, um animal que pressente a chegada do dia e sabendo pela certeza do saber que o Criador lhe deu porque racional não é ou, pelo menos, lhe não chamamos, emite o seu som de despertar. Pode ser um grasnar de ave de porte, um piar de ave miúda ou o ruído distante de um mamífero que percebe se anuncia mais uma sequência jubilosa de luz a que tentará sobreviver e a que nós chamamos dia mas eles não, ao menos que tenhamos conhecimento.
Assim está este lar que estamos devassando, a mulher que vamos conhecendo. Primeiro, ainda no escuro, pressentiu o dia e abriu um olho para certificar-se da luz. Qualquer humano pensaria É noite, virar-se-ia para o lado e continuaria a explorar o sono e o sonho. Mas, as Marias de Lurdes deste mundo que são mães e conhecem a labuta de cuidar de uma casa, conseguem distinguir os diversos timbres de escuridão. E esta mulher, deitada de lado, de costas para o marido, com as mãos persignadas como quem reza debaixo da cabeça suportando-a e dando-lhe um pouco de altura, com um olho aberto e outro fechado, conseguiu já ver que este escuro não é o da tarde que termina, nem o da noite que se inicia, nem já o da noite profunda que ela conhece do tempo distante de mudar fraldas e dar de mamar. Este é o escuro que se está perdendo para a luz. Dentro em breve, após o despertar das vidas para a vida, o mundo estará girando, ruidoso, à sua volta. Por isso, não fecha o olho que tem aberto. Abre o que tem fechado. E, com o olhar fixado na parede, reconstrói para a manhã que hoje se anuncia, os gestos da manhã que ontem foi.

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O Romance “De Negro Vestida” foi publicado, capítulo a capítulo, neste blogue, entre 26 de janeiro de 2010 e 22 de abril de 2011.

Agora que conhecerá outros voos, nomeadamente, a publicação em livro, deixamos aqui um excerto de cada capítulo e convidamos todos os amigos e leitores a adquirirem o livro.

Obrigado pela vossa dedicação.

Setembro de 2013

João Paulo Videira

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Onde se escreveu o 3º capítulo de "De Negro Vestida"

A sorte de viver no campo e, em particular, no Ribatejo, permite acordar num sábado de manhã e decidir-se que se quer escrever o 3º capítulo de “De Negro Vestida” num local absolutamente idílico.

Já tinha todo o capítulo pensado e planeado e, hoje pela manhã, em seis minutos, coloquei-me num dos locais mais bonitos da Serra d’Aire e Candeeiros onde redigi o capítulo que, ainda hoje, colocarei aqui no blogue.

O capítulo segue dentro de momentos. Só falta passar do manuscrito para o processador de texto.

Aqui fica o testemunho fotográfico com breves legendas.

Subindo a serra.
Ainda subindo a serra.
A paisagem para norte.
A paisagem para sul.
O escritório. Sim, é um bocadinho perigoso mas nada do outro mundo.
A este carro só lhe falta falar e, mesmo assim, por vezes, queixa-se!
Lá dentro está mais quentinho. Evita-se o vento serrano.
Relendo o 1º capítulo…


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Boas notícias

Caros amigos,
a estória que aqui fomos acompanhando ao longo de alguns meses e cujo registo pedíramos ao IGAC, recebeu ontem o deferimento do pedido e respectivo registo num documento de que aqui deixamos um excerto.

A partir de agora, valha isso o que valer, “Estórias ao Acaso: Noite Fria” está protegida contra cópia ou plágio não autorizados…

O próximo passo…

Um excerto do certificado:


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De Negro Vestida – II

Rotinas – II

Teve o Criador a excelente ideia de, quando criou o universo e as coisas que pôs nele, as ir logo nomeando a todas. Facilitada ficou a sua tarefa que assim podia lembrar-se do que já tinha criado pelo nome atribuído em vez de se ver forçado a uma longa paráfrase. Só por isso foi possível a Criação em seis dias. Caso contrário, teria o Criador pela frente, pelo menos, uma longa quinzena de trabalhos e canseiras. Admitamos, foi muito mais fácil em seu pensamento, de si para consigo, ter pensado o Criador Será que já criei os vales? Do que teria sido a formulação Será que já criei uma planura de terras que hei-de colocar entre as montanhas e as colinas por onde há-de passar um curso de água doce bordejado de laranjeiras e terras férteis porque ricas naquilo a que os humanos habitantes hão-de chamar, milénios mais tarde, azoto?
Ora, venhamos e convenhamos, excelente ideia teve o Criador quando, depois de criar, nomeou. Esta é uma árvore e chamar-se-á macieira e o seu fruto será a maçã. E assim como ia dizendo, ia fazendo. Ou o inverso. Sendo que, neste caso, a ordem pouco importa. Isto é um líquido gerador de vida, mitigador de sedes e correrá seu curso incolor e inodoro e chamar-se-á água. E daí em diante chamou maçãs às maçãs com as consequências que todos conhecemos e água à água com os benefícios que daí advieram.
Aconteceu, pois, que sendo nós, humanos, uma dessas criações, não fomos logo todos nomeados porque se descartou o criador da responsabilidade de regulação demográfica. Fez uns quantos de nós e deu-nos depois a capacidade de nos irmos acrescentando. Essa, e a de decidirmos do nosso destino. De livre arbítrio chamada. E sendo nós, humanos, à imagem do Criador criados, logo lhe apanhámos as virtudes que os defeitos, esses, são de nossa exclusiva responsabilidade. E uma delas foi a de sintetizar nomeando.

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O Romance “De Negro Vestida” foi publicado, capítulo a capítulo, neste blogue, entre 26 de janeiro de 2010 e 22 de abril de 2011.

Agora que conhecerá outros voos, nomeadamente, a publicação em livro, deixamos aqui um excerto de cada capítulo e convidamos todos os amigos e leitores a adquirirem o livro.

Obrigado pela vossa dedicação.

Setembro de 2013

João Paulo Videira

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De Negro Vestida – I

Rotinas – I

A cena que agora presenciamos e nos cabe narrar é assaz curiosa. Temos nós, contadores de estórias, este mágico poder de tudo ver e tudo saber só para dar a conhecer. E, em calhando, até a intimidade alheia devassamos. É o que faremos agora. Isto é uma casa. E há nesta casa um quarto e há neste quarto uma cama e estão nesta cama duas pessoas. Um homem e uma mulher. Ela por baixo. Ele por cima. E nasce aqui a curiosidade. É que não estão fazendo sexo e amor também não. Estão os dois vivos. Ela planeando a lida da casa. A roupa que os filhos vestirão pela manhã. E já decidiu o que será o almoço no dia seguinte quando ele vier do atelier. Ele está balançando em cima dela sem fulgor nem paixão. Para sexo, queria-se outra energia nos gestos, outra habilidade no inflamar das carícias, outra luxúria entre dentes. Para amor, outra entrega bastaria mas não há aqui nada disso. E a razão é simples. Estão estes dois cumprindo um dever. Ela cumpre o dever de esposa dedicada, sempre pronta a receber em si o marido porque assim lhe foi dito que seria e assim tem sido nos últimos vinte e dois anos. Quer dizer, sempre, sempre, também não que têm as mulheres muitas formas de governar uma casa e uma relação com a suprema e subtil capacidade de deixar os homens acreditar que são eles quem está controlando. Ainda assim, ela preza a tranquilidade do lar e sabe que os humores do marido se alteram quando se não despede dos sexuais líquidos que parecem nascer-lhe no corpo todo para se virem alojar entre pernas. E lá lhe vai dando a ração suficiente para que se não queixe mas também se não enfarte. Não lhe marca os eventos na agenda para que se não aperceba da rotina mas sabe muito bem os dias em que menos lhe incomoda ser incomodada.

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O Romance “De Negro Vestida” foi publicado, capítulo a capítulo, neste blogue, entre 26 de janeiro de 2010 e 22 de abril de 2011.

Agora que conhecerá outros voos, nomeadamente, a publicação em livro, deixamos aqui um excerto de cada capítulo e convidamos todos os amigos e leitores a adquirirem o livro.

Obrigado pela vossa dedicação.

Setembro de 2013

João Paulo Videira

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De Negro Vestida




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Sondagem

Terminou o tempo da sondagem. Percebi o sentido geral e notei com interesse e respeito a nota destoante. Quem escreve não agrada sempre nem a todos nem escreve para isso. Eu escrevo por prazer. Espero que sintam isso.

Notei que só treze pessoas responderam. Isto contrasta com o número de visitantes que o contador regista e com o número de e-mails que tantos de vós me enviam… Não sei porquê, mas pressuponho que quem não se expõe num blogue, consiga expor-se num mail… sempre é um canal mais restrito…

Enfim, dentro de momentos há mais estórias!

João Paulo Videira


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3… 2… 1…

Caros leitores,
dentro de dias começarei aqui a divulgação de uma nova estória cuja estrutura está completamente desenhada bem como todas as caracterizações de personagens.

Será um processo de escrita diferente uma vez que tudo passará obrigatoriamente pelo papel em primeira mão, depois processador de texto e só depois o blogue. O processo de publicação poderá ter intervalos de dias maiores pelo que pedirei a vossa paciência.

Será mais complexa e extensa do que “Estórias ao Acaso: Noite Fria”.

Um levantar de véu: ora deixa cá ver… o que é que se pode revelar… nada!

Um abraço
João Paulo Videira


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Making of "Estórias ao Acaso: Noite Fria"

A pedido de vários amigos, cá vão alguns esclarecimentos e dados curiosos. De facto, ao longo da publicação da novela “Estórias ao Acaso: Noite Fria”, foram-me fazendo muitas perguntas sobre o texto, como é que eu escrevia e onde arranjava tempo. Fiat lux!
O blogue.
Este blogue foi criado para a publicação de textos que eu escrevia e enviava por mail à minha irmã. Eram, supostamente, autobiográficos. Alguns amigos começaram a dizer-me que deveria escrever textos mais extensos e ambiciosos. Contar uma estória. Daí a ideia de escrever a novela que agora terminou.
Ficção ou realidade.
Acontece que muitos continuaram a achar que eu estava a escrever um texto autobiográfico por causa do teor do blogue, logo, tinha vivido os amores e as aventuras das minhas personagens!!!
Pois, lamento desiludi-los, mas a estória é ficcionada. Quer dizer, quase toda ficcionada. Como qualquer escritor, vivi algumas coisas que escrevo e vi viver outras. Tudo tem referências da realidade, mas nada se passou exactamente como está contado.
Tempo de escrita.
Todos os capítulos foram escritos três vezes. Uma em esboço. Uma em texto rascunho. E uma em texto revisto. Foram sempre escritos à noite, depois da meia-noite, isto durante a semana , ou durante as tardes de domingo, à lareira.
Espaço da escrita.
Três espaços possíveis. No escritório, num computador de secretária. Na sala, ao pé do quentinho do lume aceso com um portátil, ou na cama, também com um portátil. O outro espaço é o mais curioso: alguns, poucos, capítulos, foram escritos directamente para um caderno onde quer que me encontrasse. À porta do supermercado, num parque de estacionamento, ou no carro, no meio da lezíria.
Inspiração ou transpiração.
Muitos leitores perguntaram se havia um plano ou se era tudo inspiração. Devo dizer que a inspiração é fundamental mas não basta. Houve um plano geral da estória e depois houve pequenos planos para cada capítulo. Depois, o esboço e por fim o texto já mais “limpo”, isto é, com alguma revisão e pronto a publicar. Dos 33 capítulos, mais o epílogo, só quatro foram escritos directamente no blogger. Desses, um perdeu-se definitivamente por “erro informático com ajuda humana”, hihihi.
Comentários e visitas.
Durante o processo, o texto não foi muito comentado no blogue. Teve alguns comentários no Facebook onde eu colocava excertos. Também os colocava no Hi5 mas sem reacção. A maioria das reacções chegou-me por mail. Muitas pedindo para dar determinados rumos à narrativa ou para dar determinados destinos às personagens. Era impossível atender a isto porque havia um plano e não segui-lo implicava quebrar a coerência da estória. Os capítulos que mais reacções causaram foram o da noite de amor interrompido e o do suicídio. O texto foi publicado no blogue entre 16 de Novembro de 2009 e 18 de Janeiro de 2010 e nesse período o blogue teve, aproximadamente, 1646 visitas e 4025 leituras. Ou seja, normalmente, por cada visita havia três leituras. Estiveram aqui pessoas de todas as partes de Portugal continental, regiões autónomas e dos cinco continentes! Vá-se lá saber porquê?! Ou como!
Música e imagens.Cada capítulo era acompanhado por uma imagem (alguns, poucos, por duas) que fui buscar à Internet e que não tivessem nenhuma menção de registo ou direitos de autoria. A busca era feita no separador “Imagens” do Google com palavras relativas ao capítulo, por exemplo, “amor”, “solidão”, “desilusão”, “telefonema”, “ruiva” (“ruiva” deu cá uns resultados!). Quando as imagens não me satisfaziam, fazia a busca com as mesmas palavras mas em inglês para ampliar o espectro de resultados. As músicas tentavam ser alusivas a cada capítulo, ou seja, não era porque me apetecia aquela música mas porque ela poderia ter algo a ver com o conteúdo do texto. Ou me lembrava imediatamente de uma ou fazia uma busca semelhante às imagens mas no Youtube.
Futuro.
Já foi pedido ao IGAC o registo do romance e, se houver uma oportunidade, gostaria de publicar. Só não sei se o texto tem qualidade para tanto. Entretanto, descobri que para além das crónicas que eu escrevia, também gosto de escrever narrativas, contar estórias, por isso, a próxima já está arquitectada e a sua publicação periódica, aqui, começa em breve…
Um abraço de gratidão a todos os leitores e amigos pelas leituras e pelas palavras simpáticas e aqui ficam algumas fotos dos momentos de produção. Se ainda quiserem saber mais curiosidades perguntem aqui nos comentários, tentarei responder. JPV.

No quentinho do edredão com Ibsen por perto.


Ao lume, desconfortavelmente sentado naquelas rodelas
de palha que se vendem no IKEA para não me dar o sono.

Um pormenor do plano geral. Foi escrito a encarnado porque
no dia em que tive a ideia não tinha nenhum instrumento
de escrita à mão. Só uma esferográfica encarnada e folhas
impressas de um lado. Foi a encarnado no verso das ditas!

Plano de um capítulo.

O ambiente de escrita mais comum.


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Um agradecimento e uma novidade

Agradecimento.
Venho agradecer a todos os amigos e leitores que me incentivaram à escrita e me apoiaram na escrita. “Estórias ao Acaso: Noite Fria” fará o seu percurso com naturalidade e com naturalidade aceitará o seu destino.

Novidade.
Ao longo da publicação dos capítulos, enviaram-me por mail muitas perguntas sobre o processo de escrita, se era ficção ou se eu tinha vivido todas (!!!) aquelas situações, se havia um plano ou se era tudo inspiração e também me pediram muitas vezes para dar determinados rumos à estória. Ora, decidi fazer um pequeno apanhado das perguntas mais frequentes e a partir delas publicar aqui uma espécie de making of “Estórias ao Acaso: Noite Fria”. Em breve cá estará.

Saudações a todos e grato por todas as leituras.

João Paulo Videira